Com o veto ao início das prospecções de petróleo na costa do Amapá, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, deixou Lula fora da sua zona de conforto.
Agora, ele terá de se expor em definições sobre a política ambiental, a prioridade aos combustíveis fósseis e a transição da Petrobras de empresa petroleira para produtora de energia.
Não há escolha fácil nesse cardápio político. Todas as opções têm elevado custo, com consequências para o futuro do país e impacto econômico muito além do seu mandato até 2026.
Lula pode adiar decisões, mas não por muito mais tempo. Delas depende, por exemplo, o rumo da Petrobras, que separou 3 bilhões de dólares (equivalentes a 15 bilhões de reais) para investir em pesquisas na costa do Amapá nos próximos dois anos.
Esse cronograma de despesas em pesquisas reflete a ansiedade da Petrobras na busca de um novo pré-sal.
Lula já governou sonhando com a riqueza do pré-sal na costa atlântica entre Espírito Santo e São Paulo. “É o nosso passaporte para o futuro”, repetiu durante todo o segundo mandato (2006-2010). Mas o tempo de validade do pré-sal para novas descobertas está se encerrando muito antes do imaginado na Petrobras e nas petroleiras estrangeiras.
Na área do Sudeste, a perspectiva é de declínio da produção a partir de meados da próxima década. Uma evidência está nos resultados de produção do campo de Tupi, o maior do país em exploração de óleo e gás: a concessionária Galp, de Portugal, constatou queda de 10,3% no ano passado em relação a 2020.
Durante uma década, a Petrobras não se interessou pela Bacia da Foz do Amazonas, entre o Amapá e o Pará. A área só virou prioritária no final de 2019, quando foram confirmadas descobertas de grandes depósitos de óleo na Guiana e no Suriname.
Não há certeza sobre a extensão da ocorrência de petróleo — se está restrita ao trecho Guiana-Suriname ou se é um bloco com extensão à margem equatorial brasileira, do Amapá até o Rio Grande do Norte.
Desde dezembro a Petrobras gasta cerca de 1 milhão de dólares por dia (5 milhões de reais a cada 24 horas) com embarcações, pessoal e equipamentos de prospecção estacionados na costa do Amapá.
É uma forma de pressão pela liberação da licença ambiental, agora negada pela equipe técnica do Ministério do Meio Ambiente. Deverá continuar tentando.
Caso consiga vencer a batalha do licenciamento e confirmar a existência de depósitos de óleo economicamente viáveis na costa do Amapá, a Petrobras ainda vai precisar de uma dezena de anos para começar a exploração.
No curto prazo, Lula terá de administrar um relevante conflito dentro do governo: com o veto, Marina Silva entrou em confronto com o presidente da Petrobras, Jean-Paul Prates, e o ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira.
Há indícios de que, com o discreto aval de Lula, deflagrou-se um cerco político à ministra do Meio Ambiente, amparada quase exclusivamente por organizações ambientalistas.
Parlamentares e governadores de Estados potencialmente beneficiários, como Pará, Amazonas e Maranhão, organizam a defesa pública das operações da Petrobras na bacia da Foz do Amazonas.
Entre eles está Randolfe Rodrigues, senador do Amapá, líder do governo no Congresso e integrante da corrente que derrotou Marina no comando do partido Rede Sustentabilidade, criado por ela. Nesta quarta-feira (18), o senador decidiu deixar a Rede “em caráter irrevogável”. Foi a primeira baixa nesse conflito.