Último Mês: Veja por apenas 4,00/mês

José Casado

Por José Casado Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Informação e análise
Continua após publicidade

Sob pressão

Há algo de novo quando banqueiros se preocupam com riscos à reputação

Por José Casado Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 10h47 - Publicado em 2 jun 2023, 06h00
  • Seguir materia Seguindo materia
  • Boa notícia: o sistema bancário promete deixar de emprestar dinheiro a frigoríficos e abatedouros que se abastecem com o gado criado em áreas de crimes ambientais na Amazônia.

    Indústrias e fornecedores têm os próximos trinta meses — até dezembro de 2025 — para adotar técnicas de rastreabilidade e de monitoramento em toda a cadeia de produção em propriedades acima de 100 hectares.

    O crédito será condicionado à comprovação de origem dos rebanhos em terras regularizadas, sem desmatamento ilegal, embargo judicial ou sobrepostas em zonas de conservação ambiental.

    Nessa autorregulamentação, tornam-se passíveis de veto e de punições operações financeiras com empresas urbanas e rurais delinquentes, sobretudo quando reconhecidas pelo histórico de exploração de mão de obra em regime idêntico à escravidão.

    Exportadores de carnes protestam, receosos com o espírito da “lei” de balcão financeiro resumido por Walter Bagehot, jornalista britânico da revista The Economist no início do século XIX: “Quando você tem de provar que merece seu crédito, é porque ele desapareceu”. Reclamam equidade na mesa dos gerentes e sugerem extensão de protocolos ambientais a toda a clientela bancária, começando pelos setores de mineração e petróleo. Não é má ideia.

    Um par de anos atrás, as três maiores casas bancárias privadas (Itaú, Bradesco e Santander) anunciaram um plano para contenção de danos na Amazônia via redução do fluxo de crédito a atividades de laminação de madeira, em serrarias, e de derrubada de mata para abertura de pasto ou de plantio.

    Continua após a publicidade

    Agora, já são duas dezenas de instituições financeiras voluntariamente submissas a uma arquitetura jurídica comum, para fiscalização mútua, em ambiente de negócios onde a autoridade do Estado tornou-se débil, rarefeita ou entrou em colapso no ritmo da liquefação do sistema político.

    “Há algo de novo quando banqueiros se preocupam com riscos à reputação”

    É mudança relevante capitaneada pelos cinco maiores bancos. O domínio do mercado permitiu-lhes encerrar 2022 somando 8,9 trilhões de reais em ativos, metade correspondente a créditos concedidos. Para comparação, equivale a um terço do orçamento federal neste ano e ultrapassa o valor da produção industrial brasileira. Lucraram 106,7 bilhões de reais, depois dos impostos — média de 263 milhões de reais por empregado, na calculadora dos sindicatos trabalhistas. Avançam na transformação da entidade setorial, Febraban, numa agência de autorregulação sem paralelo no setor privado.

    É provável que essa política induza mudanças no comportamento da clientela, do campo ao pátio de contêineres nos portos. As maiores empresas do agronegócio já adotam práticas de controle ambiental e de modernidade nas relações trabalhistas — são exceções os episódios de primitivismo explícito, como no caso recente das vinícolas de Bento Gonçalves (RS) que azedou a safra gaúcha com trabalho escravo.

    No entanto, o agro virou ogro dentro e fora do país. Em parte, porque os maiores produtores e comercializadores escolheram caminho oposto ao dos banqueiros. Ilharam-se, despreocupados com a imagem pública de um setor com alta concentração de capital em poucas empresas e bem-sucedido na revolução tecnológica das últimas quatro décadas, que lhes garantiu condições de competitividade invejáveis à concorrência global, com três safras anuais e recordes sucessivos de produtividade.

    Continua após a publicidade

    O desmazelo levou à incúria, e o agro virou ogro. Dentro e fora do país, é visto como celeiro de trogloditas desmatadores da Amazônia, a grande reserva de floresta tropical que sobrou no planeta. Eles existem e são reconhecida minoria — quase sempre tipos destemidos, proscritos ou que estão em fuga de si. Conseguiram assumir a posição de porta-vozes do setor em militância permanente pela lavoura arcaica, incoerente com o espírito da expansão capitalista na era da inteligência artificial.

    É notável que os bancos, entidades conservadoras por natureza, estejam avançando num projeto compartilhado, com laivos de modernidade e essencialmente crítico em relação aos clientes do agronegócio, perdulários com a própria imagem.

    Há algo de novo no ar quando banqueiros passam a se preocupar com os riscos à própria reputação em negócios poluidores do ambiente. Reagem à pressão de uma sociedade que se move em silêncio e à margem da estrutura política convencional, cada dia menos representativa.

    Os textos dos colunistas não refletem, necessariamente, a opinião de VEJA

    Publicado em VEJA de 7 de junho de 2023, edição nº 2844

    Publicidade

    Publicidade

    Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

    Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

    Veja e Vote.

    A síntese sempre atualizada de tudo que acontece nas Eleições 2024.

    OFERTA
    VEJA E VOTE

    Digital Veja e Vote
    Digital Veja e Vote

    Acesso ilimitado aos sites, apps, edições digitais e acervos de todas as marcas Abril

    1 Mês por 4,00

    Impressa + Digital
    Impressa + Digital

    Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (equivalente a 12,50 por revista)

    a partir de 49,90/mês

    *Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
    *Pagamento único anual de R$118,80, equivalente a 9,90/mês.

    PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
    Fechar

    Não vá embora sem ler essa matéria!
    Assista um anúncio e leia grátis
    CLIQUE AQUI.