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Nova Constituição, ideia que seduz Bolsonaro e parte da oposição

No Centrão acredita-se que Bolsonaro vai mudar do voto impresso para a defesa de nova Constituição, ideia que encanta o governo assim como o PT

Por José Casado Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 31 jul 2021, 09h00

Termina na segunda-feira o prazo para Jair Bolsonaro apresentar ao Tribunal Superior Eleitoral evidências ou informações sobre fraudes nas eleições de 2018 e 2020. O prazo foi estabelecido pelo juiz-corregedor do TSE, Luis Felipe Salomão, no último 21 de junho.

Trata-se de um processo administrativo, uma forma peculiar de inquérito aplicável ao setor público para dar efeito a algo previsto em lei.

O juiz-corregedor se baseou em declarações de Bolsonaro e, também, de um candidato que ele derrotou em 2018, o ex-deputado federal catarinense Benevuto Daciolo (Cabo Daciolo), e de um deputado estadual do PSL paulista, Oscar Castello Branco de Luca. “O conhecimento das eventuais vulnerabilidades a que se referem” — escreveu Salomão na intimação ao trio — “poderia favorecer o aprimoramento das barreiras de segurança hoje já existentes.”

Na quinta-feira, Bolsonaro usou a estrutura da presidência e a rede pública de televisão para apresentar suas “provas de fraudes” nas eleições. Num dos casos relatados, a única semelhança perceptível entre o sistema de votação e a “prova” estava na aparência do painel da urna eletrônica. Em outro, o presidente se baseou em erros matemáticos aparentemente cometidos por um autodeclarado acupunturista de árvores — depois, ele negou a autoria.

É provável que Bolsonaro informe à Justiça Eleitoral não possuir “provas”, apenas conhecimento de relatos genéricos sobre crimes eleitorais. Ensaiou isso ao lado do ministro da Justiça, Anderson Torres, na quinta-feira, porque corre o risco de processo criminal no exercício da presidência, inclusive por abuso de poder.

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Seus aliados parlamentares, líderes do aglomerado partidário Centrão, acreditam em mudança de rumo. Não esperam moderação, mas apostam alteração na agenda de temas de campanha do presidente-candidato. Alguns acham, por exemplo, que Bolsonaro prepara a troca da defesa do retrocesso ao voto impresso — sem chance de aprovação no Congresso — por uma outra proposta política, mais abrangente e com potencial até de atrair parte da oposição: uma nova Constituição.

Esse tema foi debatido na campanha de Bolsonaro em 2018. Na época, houve divisão sobre a forma. Alguns achavam necessário o governo mobilizar o Congresso e aprovar a eleição de uma Constituinte, exclusiva ou mista (parte congressual e parte eleita). Outros defenderam a instituição de uma comissão responsável por um anteprojeto para ser submetido a referendo nas urnas. Entre esses estava o vice, Hamilton Mourão.

Essas ideias se dissiparam depois da vitória, com o acordo tácito entre Bolsonaro e a cúpula das Forças Armadas para enquadrar o governo numa moldura militarista. Deu errado, como demonstra o desastre governamental na gestão da pandemia, sob coordenação de militares da ativa e aposentados. E resultou num declínio da confiança pública nas Forças Armadas, como atestam pesquisas de opinião: entre janeiro de 2019 e o último junho, a credibilidade pública nas instituições militares caiu doze pontos— de 70% para 58%, segundo a XP/Ipespe.

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Na crise pandêmica, a ideia de nova Constituição foi retomada em conversas no Palácio do Planalto, com foco na reforma do Judiciário e do Ministério Público, sob o argumento predileto de Bolsonaro de que a Justiça mais atrapalha do que ajuda seu governo.

O líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), chegou a anunciar um projeto de decreto legislativo para um plebiscito no qual se aprovaria, ou não, a elaboração de uma nova Constituição. A forte reação, sobretudo do Judiciário, deixou o líder do governo emudecido.

Mas a ideia de uma nova Constituição continua a encantar o governo e, também, alguns segmentos da oposição. Na mesma época em que Bolsonaro discutia o assunto com líderes do Centrão, como Barros, Arthur Lira, então candidato à presidência da Câmara, e o senador Ciro Nogueira — todos do Progressistas —, o Partido dos Trabalhadores divulgou sua proposta para “reconstrução e transformação” do país.

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1988: Fernando Henrique Cardoso, Mário Covas e Lula negociam durante a votação da Assembleia Constituinte —
1988: Nelson Jobim, Fernando Henrique Cardoso (em pé), Mário Covas e Lula (sentados) negociam durante sessão da Assembleia Constituinte — (ARI LAGO/VEJA)

Em 215 páginas, alinha as reformas que julga “necessárias ao desenvolvimento soberano”, como “agrária, da mídia, jurídica, tributária, e, inclusive, militar”, a partir de “uma profunda reforma política do Estado que mude radicalmente as atuais instituições”. Acrescenta: “O PT é imprescindível para derrotar o golpismo e convocar uma Assembleia Constituinte Soberana, o meio democrático de promover aquelas reformas, com a legitimidade de um novo governo e Lula inocente. Uma nova Constituinte não pode ser concebida como ponto de partida, mas como um ponto central no próprio processo político de ascensão da luta democrática e de (re)constitucionalização do país.”

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Com motivações diferentes, governo e o maior partido de oposição coincidem no desejo de levar o país a uma nova Constituição. Bolsonaro e outros candidatos podem defender essa posição em campanha.

É legítimo, mas não significa que estejam certos e, muito menos, que isso seja viável sem uma ruptura institucional. O exemplo do Chile, constantemente evocado nessas discussões internas, não é válido: depois de 40 anos, os chilenos resolveram mudar a Constituição herdada da sanguinária ditadura de Augusto Pinochet.

Constituições são feitas para durar. A brasileira vai completar 33 anos no próximo outubro. Culpá-la tem sido mais fácil do que cumpri-la.

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