Não faltam, no catálogo da HBO, séries superlativas entre as dezenas que ela lançou nas duas últimas décadas. Mas eu diria que, juntamente com The Wire e Família Soprano, Band of Brothers é a joia da coroa – tanto que, aqui em casa, a gente a revê praticamente todo ano (e em geral de um fôlego só): sempre há mais uma coisa em que reparar, mais uma cena que parece ainda melhor que das outras vezes, e nunca deixa de arrebatar. Se você nunca viu ou há tempo não vê, recomendo aproveitar que, até 13 de maio, Band of Brothers vai estar disponível de graça para não-assinantes na HBO Go. Outras séries excelentes vão estar abertas no mesmo período também – The Night Of, Years and Years e a primeira temporada de True Detective. Mas sugiro começar por Band of Brothers. Tanto quanto se pode prometer algo assim, prometo que você não vai se arrepender – e, se em algum momento a HBO disponibilizar também The Pacific, a “irmã” de Band of Brothers que acompanha os soldados americanos no front do Pacífico, contra os japoneses, essa primeira parte da lição de casa já vai estar feita.
Produzida por Steven Spielberg e Tom Hanks (que dirige o 5º dos dez episódios, Crossroads, ou “Encruzilhada”) com base no livro de mesmo nome do historiador Stephen Ambrose, a minissérie acompanha a trajetória da Easy Company, da unidade de paraquedistas 101 Airborne, no front europeu da II Guerra Mundial, desde a entrada dos Estados Unidos no conflito, em 1941, até a libertação dos campos de concentração, em 1944-1945, e o rescaldo dos meses seguintes. É ao mesmo tempo épico, comovente, revelador e assombroso – um desses casos em que a história com “H” é trazida para a escala humana da maneira mais eficaz possível. O elenco é soberbo. Damian Lewis, de Billions e Homeland, é o mais próximo que a série tem de um personagem principal: o apaixonante Richard Winters, que vai rapidamente subindo na hierarquia pela competência e porque o caminho tragicamente vai se abrindo: a Easy Company esteve sempre na linha de frente, e sofreu um número tétrico de baixas na II Guerra. Mas muitos outros rostos aqui são conhecidos, ainda que não propriamente famosos (exceção feita a David Schwimmer, de Friends, como um oficial metido a linha-dura que na verdade é um incapaz e um covarde, como costuma ser gente desse tipo). Destaque para Ron Livingston, Michael Cudlitz, Neal McDonough – ou, na verdade, destaque para todo mundo. Até as menores participações são fantasticamente bem escaladas.
Spielberg e Hanks vinham de O Resgate do Soldado Ryan quando decidiram abraçar este trabalho monstruoso, de mais de dez horas de duração e orçamento de 120 milhões de dólares, inédito então na TV e hoje equivalente a algo como 180 milhões. Usaram a lição aprendida no filme e a multiplicaram à enésima potência: mesmo quando recria manobras célebres, como a destruição de ninhos alemães de metralhadoras no segundo episódio – uma sequência eletrizante –, ou ofensivas cruciais como o desembarque dos Aliados na Normandia, em 6 de junho de 1944 (e tudo é recriado com fidelidade absoluta e produção primorosa), Band of Brothers mantém o foco nos homens que estão ali, na lama, na praia, na neve, sob fogo: como se diz no jargão militar americano, as “botas no chão” – os soldados, não os comandantes – é que são o seu negócio. Muitos dos homens retratados são verídicos, e os que ainda estavam vivos à época da produção (a série é de 2001) dão seus depoimentos ao final de cada episódio. Tente passar incólume pela experiência de vê-los; para mim, é devastador. De quebra, não custa lembrar do que Spielberg e Hanks realmente estão falando: que há valores coletivos que se sobrepõem ao conforto ou aos interesses de indivíduos, e que às vezes é imperativo sair em defesa deles, por mais definitivo que possa ser o preço – porque o custo de não fazê-lo é ainda mais alto.