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Alien: Covenant

No espaço ninguém ouve você bocejar

Por Isabela Boscov 10 Maio 2017, 19h35
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  • Os viajantes pousam em um planeta desconhecido, descem a rampa da nave, respiram fundo (sem capacete nem máscara) e declaram: “Hmmm, o ar aqui é muito bom”. Se fosse Sharknado no Espaço, eu estaria morrendo de rir, porque é exatamente isso que eu esperaria e desejaria de um filme chinfrim do SyFy – que os personagens fossem uns palermas que, chegando de improviso em um ambiente potencialmente hostil, enchem bem os pulmões com as ameaças biológicas locais antes de dizer uma fala ridícula qualquer. Mas em um Alien dirigido por Ridley Scott? E depois de ele ter acertado absolutamente tudo com Perdido em Marte?

    Alien: Covenant
    (Fox/Divulgação)

    Alien: Covenant, oficialmente o sexto capítulo da série inaugurada por Scott em 1979, é o pior tipo de ficção científica – uma trama que depende da estupidez dos personagens para se desenrolar e aposta que, com a palavra “alien” no título, a plateia há de engolir todos os seus inúmeros desleixos e deficiências. Covenant é, também, o pior tipo de trabalho na carreira de um diretor: aquele que desvirtua uma conquista impressionante. Só para ter certeza de que eu não estava sendo traída pela memória, fui rever a meia hora inicial de Alien – O Oitavo Passageiro (para quem não lembra, a tagline, genial, era “no espaço ninguém ouve você gritar”), que tem uma sequência comparável – a do desembarque de três dos sete tripulantes da nave cargueira Nostromo em um planeta desconhecido, no qual eles descobrem os restos mortais de um gigante alienígena e onde, sem querer, pegam o passageiro clandestino que vai se tornar seu pesadelo. Mas Alien – O Oitavo Passageiro continua sendo uma obra-prima: se pedissem a cinquenta grandes cineastas para refazer do seu jeito a cena da descoberta, tentando torná-la ainda mais sinistra e pressagiosa, nenhum deles conseguiria melhorá-la, porque ela é perfeita (como, aliás, todo o resto do filme). Tomando Prometheus e Covenant como referência, suspeito que, hoje em dia, talvez nem o próprio Ridley Scott fosse capaz de repetir a sua façanha de 1979 – à qual, só para anotar, se seguiu outra façanha em 1986, o Aliens de James Cameron.

    Alien: Covenant
    (Fox/Divulgação)

    A Covenant do título é uma nave colonizadora. Além da tripulação, transporta cerca de 2 000 migrantes e vários milhares de embriões humanos para um planeta cuidadosamente escolhido por suas semelhanças com a Terra. Todos estão em hibernação, à exceção do sintético Walter (Michael Fassbender) – que é obrigado a despertar os tripulantes por causa de um desastre. Enquanto tenta fazer os reparos necessários à nave, o pessoal capta uma transmissão vinda de um planeta próximo. E, que coisa curiosa, o planeta parece ser muito mais amigável à vida humana do que aquele para o qual eles rumavam. Incrível que tenham deixado passar uma coisa dessas! Nada mais sensato então do que uma atabalhoada mudança de planos, com base em informações escassas e incompletas, feita no escuro e às pressas. Vai dar em desastre, é evidente. Só que não apenas para os personagens.

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    Alien: Covenant
    (Fox/Divulgação)

    Rola um lance Mulheres de Areia/A Ilha do Dr. Moreau no enredo: Walter, o sintético bondoso, tem um gêmeo malvado – o sintético David de Prometheus, que perdeu o controle do seu complexo divino e anda fazendo experimentos bizarros com aliens. Mais antigo do que isso não fica. Ao menor contratempo, os tripulantes entram em pânico, têm ataques histéricos e fazem tudo errado – e então tentam consertar a burrada com outra maior ainda. O computador de bordo é um milagre da desinteligência artificial: ele não deixa uma pessoa fazer uma asneira sozinha; mas autoriza ações catastróficas desde que pelo menos duas pessoas concordem com a mesma idiotice. E a heroína interpretada por Katherine Waterston (a Tina de Animais Fantásticos e Onde Habitam) é a coisa mais sem sal do mundo – mais ou menos como se aquela sua prima que sempre fica sentada num canto nas festas virasse a protagonista de um terror espacial.

    Alien: Covenant
    (Fox/Divulgação)
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    Até aquela maestria visual que é uma das marcas de Scott (e o que em alguma medida redimia Prometheus) está ausente de Covenant; nem em uma tela gigante com projeção de primeira as imagens conseguem impressionar, evocar ou perturbar. Ridley Scott tem 79 anos e dinheiro para três gerações; poderia estar com o pé na areia e um mojito na mão nas Bahamas, curtindo a vida – mas gosta mesmo é de trabalhar. Tenho todo o respeito e a maior admiração por tanta vitalidade e tanto desejo criativo, e acho que ele tem energia de sobra para fazer pelo menos mais uns dois ou três filmes memoráveis antes de começar a pensar em aposentadoria. É neles que ele deveria estar se concentrando, e não em estragar o seu legado extraordinário com um roteiro de quinta categoria.


    Trailer

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    ALIEN: COVENANT
    Estados Unidos/Inglaterra/Austrália/Nova Zelândia, 2017
    Direção: Ridley Scott
    Com Michael Fassbender, Katherine Waterston, Billy Crudup, Carmen Ejogo, Danny McBride, Amy Seimetz, Demián Bichir, Jussie Smolett, Callie Hernandez e “pontas” de Guy Pearce, James Franco e Noomi Rapace
    Distribuição: Fox

     

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