Mais conhecido como o presidente sedutor da série Scandal (Escândalos – Os Bastidores do Poder), o ator Tony Goldwyn, 64, surpreende por não se contentar apenas com o lado à frente das câmeras. Por trás delas, dirige longas-metragens desde 1999, além de episódios variados de algumas das séries de maior sucesso da televisão americana — de Grey’s Anatomy a Dexter —, e agora lança nos cinemas do Brasil um drama com elenco de peso. Bobby Canavale, Rose Byrne, Whoopi Goldberg e Robert DeNiro podem ser vistos em Meu Filho, Nosso Mundo, em cartaz desde quinta-feira, 15 de agosto, mas não cabe a nenhum deles a atuação mais impressionante. O dono da cena é o adolescente William A. Fitzgerald, autista, que dá vida ao jovem Ezra. Rebelde, o personagem é foco da batalha de custódia entre seu pai, comediante com pavio curto, e sua mãe comportada. Em entrevista a VEJA, o cineasta fala de estigmas sobre o transtorno, da dinâmica com o ator estreante e mais:
Esta foi sua primeira vez dirigindo tanto atores, quanto membros da equipe neurodivergentes. Como compara a experiência aos outros sets que comandou? O principal relacionamento que tive no trabalho foi com William Fitzgerald, que é um jovem ator autista, e ele é extraordinário. Foi sua primeira vez atuando, e o que aprendi com ele foi que tinha que ser muito claro em minha comunicação. Se começasse a explicar demais as coisas, ele só começaria a me ignorar. A verdade é que meu trabalho como diretor é permitir que os atores se concentrem em suas interpretações e economizar nas palavras, o que se aplica a qualquer bom cineasta. Neste sentido, não foi diferente de trabalhar com qualquer ator talentoso. Pessoas autistas costumam ter uma noção bem formada de quem são e o que querem. Não ligam para a aprovação dos outros. William sabe quem é e nunca deixa de ser ele mesmo, que é o que espero em colegas.
O tema do autismo vem acompanhado de estigmas e estereótipos notórios. O que queria desmistificar com o filme? Todo ser humano tem falhas, desafios e dons. Alguém que tem uma química cerebral diferente simplesmente tem um jeito próprio de andar pelo mundo e se comunicar. Basta ouvi-los e ser sensível para estabelecer laços com pessoas neurodivergentes. Costumamos focar no jeito que as coisas devem ser, mas o melhor é deixar tudo de lado e se sintonizar com quem está interagindo.
A maioria das produções hollywoodianas sobre autismo não faz o esforço de contratar um ator com o diagnóstico. Para o senhor, a vivência é essencial a papéis do tipo? De jeito algum contrataríamos um ator neurotípico para o papel, em parte por conta da representatividade central ao filme, mas também pelas sutilezas do personagem que surgiram da vivência de William como autista. Ele criou o personagem tanto quanto nós. Ezra é ele e ele é Ezra. Quando pessoas autistas conversam comigo após assistir ao filme, falam “esse sou eu”, ou pais dizem “meu filho é assim”. A autenticidade era chave, junto à importância de honrar a comunidade.
Dramas familiares como esse, feitos com baixo orçamento, são uma raridade no circuito de distribuição de hoje. Por que acha que o gênero ainda merece espaço? É muito difícil divulgar filmes hoje em dia. As mídias e os hábitos de consumo continuam a mudar sob nossos pés, logo, o que ganha espaço nos cinemas são os conceitos grandiosos cheios de ação ou coisas que possam ser explicadas em uma frase só. Mesmo assim, vejo uma tremenda fome por histórias que lidem com aquilo que nos aflige no dia a dia, como família e relacionamentos. Meu Filho, Nosso Mundo usa o autismo como metáfora para encapsular tudo que enfrentamos como pais, amigos e parceiros. A expectativa de que um comportamento normativo seja abraçado em prol do sucesso é universal. Queremos que nossos filhos se encaixem para que possam florescer, assim como aplicamos a mesma pressão sobre nós mesmos. A verdade é que somos mais poderosos quando temos coragem de nos separar da cacofonia, atender nossas próprias necessidades e abraçar a diferença do outro. É assim que os personagens do filme se erguem.
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