Sobre o que trata esta coluna
A economia e o direito se entrelaçam de inúmeras formas. São esses os temas a que se dedica esse espaço
A economia e o direito se entrelaçam de inúmeras formas. Em alguns temas, como desenvolvimento, regulação e políticas públicas, o entrelaçamento é tão intenso que é praticamente impossível entendê-lo (bem) sem o recurso a esses dois campos do conhecimento. São esses os temas a que se dedica esta coluna, partilhada entre mim e minha amiga e colega de trabalho Luciana Yeung, com quem partilho inúmeras afinidades temáticas. Neste artigo inaugural, vamos apresentar, digamos assim, a linha editorial, o que nos move e o porquê do nome que demos.
Nosso propósito é tratar esses temas com o rigor e o método acadêmicos, mas com uma linguagem acessível para todos, sem os jargões e as firulas do texto acadêmico. Os artigos vão tratar de coisas da vida, desde as mais banais, como som de barracas e bares em uma praia em alta temporada, até as de maior relevância e controvérsia, como a gratuidade da justiça ou o marco legal do saneamento básico. Em algumas vezes, a motivação para o tema será absolutamente contemporânea, algum projeto de lei em discussão no Congresso, algum fato cujo entendimento pode se beneficiar de uma reflexão desse tipo. É o dia-a-dia nos pautando. Em outras, traremos um tema de horizonte mais longo, motivados por alguma pesquisa, artigo ou livro que nos ajudam a entender aspectos relevantes para a vida
de todos nós e que, por isso, merecem ser difundidos para além dos círculos acadêmicos. A ideia aqui é comunicar, fazer uma ponte entre a academia e os leitores que se interessam pela interface entre direito e economia.
A coluna é também uma homenagem ao britânico Ronald Coase, prêmio Nobel em 1991 e um dos pais da área de Law and Economics. Foi ele quem abriu o caminho para o estudo de normas, leis, contratos e de seus efeitos sobre o sistema econômico. Seu ponto de partida foi reconhecer que havia custos em se relacionar economicamente, seja no mercado, seja nas empresas, o que denominou “custos de transação”, algo que a economia convencional havia descartado em nome da conveniência teórica. É por causa desses custos que leis, contratos e toda sorte de regras do jogo, têm implicações tão profundas sobre o desempenho econômico. Estava aberta uma agenda que atraiu inúmeras pessoas em todo o mundo, consolidando a área de Direito e Economia.
Ronald Coase tinha como marca ver o que ninguém via, ainda que algo simples, como a existência de custos de transação ou formas contratuais diferentes das categorias usuais de mercado ou empresa. Tive a sorte de ouvi-lo nos seus quase 90 anos, na conferência anual da ISNIE (International Society for New Institutional Economics, hoje Society for Institutional and Organizational Economics). Foi uma revelação. E não foi uma impressão pessoal. Várias pessoas de vários países que ali estiveram e com quem pude interagir nos anos subsequentes tiveram a mesma avaliação. Nessa palestra, Coase foi um contundente crítico da economia dominante à época, que se fechava em modelos abstratos, relegando para segundo plano os problemas no mundo real. Eram esses, dizia, que deveriam nos
guiar. Os anos que se seguiram testemunharam o reconhecimento dos trabalhos de seus seguidores, como Elinor Ostrom e Oliver Williamson, ganhadores do prêmio Nobel em 2010, dos diversos autores que deram destaque às instituições como elemento central da análise econômica, como, em ordem cronológica, North, Weingast, Shleifer Acemoglu, Robinson, e tantos outros. É inspirado no seu modo de ver as coisas, em particular, na engenhosa articulação que fazia entre direito e economia, que esta coluna se orienta. É ver o mundo pelas lentes de Coase.
* Paulo Furquim de Azevedo é professor titular do Insper, coordenador do Centro de Regulação e Democracia e da Cátedra Família Martinez-Goldberg, dedicada à Análise Econômica do Direito. Foi Conselheiro do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e é autor de diversos artigos e capítulos de livros sobre temas na interface entre Direito e Economia, como regulação, organizações econômicas, defesa da concorrência e estudos empíricos em Direito.