28 de fevereiro, 9h25: As estimativas-padrão para que estudos clínicos, incluindo as altamente desejáveis vacinas anti-Covid, tenham sucesso estão na casa dos 10%. Este foi um dos primeiros alertas que recebi quando me inscrevi, em setembro do ano passado, como voluntária da pesquisa em que o laboratório Janssen-Cilag tentava desenvolver um imunizante contra o novo coronavírus. Neste sábado a vacina chegou lá e teve o uso emergencial aprovado pela FDA, a agência reguladora de medicamentos e alimentos dos Estados Unidos. A Johnson & Johnson já anunciou que em breve entrega o primeiro carregamento com 4 milhões de doses para os Estados Unidos e outras 16 milhões de ampolas até o fim de março.
A vacina da Janssen é a primeira de dose única aprovada nesta pandemia. No caso do Brasil, apesar de o ministro da Saúde Eduardo Pazuello já tê-la considerado a “menina dos olhos” entre os imunizantes em desenvolvimento, as negociações emperraram, e a pasta responsável pelas principais políticas públicas para conter o avanço do vírus lavou as mãos e transferiu a responsabilidade de viabilizar a compra do produto a Casa Civil e para o Congresso.
A ideia original era que o Brasil tivesse 3 milhões de doses do produto da Janssen por volta de maio, 8 milhões no terceiro trimestre e mais 27 milhões no quarto trimestre. Não há garantias de que nada disso vá acontecer. O governo brasileiro apostou todas as fichas na vacina Covishield, desenvolvida pela parceria entre a Universidade de Oxford e o laboratório AstraZeneca, e viu diversos outros governos fazerem reservas de milhões de doses de outros imunizantes. O Brasil optou por uma operação de risco que tem se mostrado desastrosa.
No caso dos laboratórios, o risco também era considerável. O caminho entre a decisão de desenvolver um fármaco a toque de caixa e receber o primeiro aval de uma agência reguladora, como aconteceu com a Janssen neste sábado, envolve acertos e erros, escolhas de locais para potenciais fábricas de vacinas e financiamento alto de governos e do próprio fabricante. Aqui o caminho, muitas vezes acidentado, que levou o braço farmacêutico da Johnson & Johnson ter sua vacina aprovada:
Julho de 2020: Início dos estudos clínicos em humanos com voluntários saudáveis nos Estados Unidos e na Bélgica. Também foi lançado um estudo de fase 1 no Japão e um de fase 2A na Holanda, Espanha e Alemanha. A ideia era que a vacina fosse de dose dupla, como as demais já aprovadas para uso emergencial, mas os resultados provisórios dos testes deram segurança aos cientistas em testar um imunizante de uma única aplicação.
Setembro de 2020: A fase 3 da Janssen com estudo de larga escala com 45.000 voluntários de oito países, incluindo o Brasil, é lançada. Neste estágio na pesquisa, são testadas a eficácia e a segurança do fármaco e monitoradas possíveis reações colaterais nos pacientes e a capacidade de o sistema imunológico responder à aplicação de uma solução desenvolvida com o vírus do resfriado comum acrescido da proteína spike, do novo coronavírus.
Janeiro de 2021: Enquanto países como o Brasil batem recordes de mortes pela doença, a Janssen-Cilag anuncia que sua vacina de dose única é eficaz contra o principal problema da pandemia: a prevenção contra hospitalizações e mortes causadas pela Covid-19. O importante, diz a Janssen, é que o resultado de 85% de eficácia contra casos moderados a graves engloba novas variantes como a virulenta B.1.351, identificada na África do Sul, e a P2, no Brasil.
O objetivo do laboratório é produzir um bilhão de doses da vacina até o fim do ano. Para desenvolver o produto e distribui-lo aos países que já fecharam contratos de aquisição do fármaco, as instalações da empresa na Holanda foram preparadas desde julho do ano passado para a produção em larga escala. Nos últimos meses, a empresa avaliou cerca de 100 outros locais que poderiam potencialmente desenvolver a vacina da Janssen. Oito foram selecionados e três já produziram uma espécie de lote de qualificação do imunizante.