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De olho nos tributos

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Dados e análises sobre os impostos e seu efeito na economia
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Incerteza e aumento de preços, dois riscos da Reforma Tributária

Apesar do texto estipular que não haverá majoração da carga tributária em relação ao PIB, importantes setores econômicos arcarão com impostos maiores

Por Adolpho Bergamini
Atualizado em 9 Maio 2024, 10h37 - Publicado em 6 fev 2024, 11h35

A notícia da aprovação reforma tributária gerou entusiasmos entre seus defensores e o mercado em geral recebeu uma injeção de ânimo. A B3 marcou indicadores recordes nos últimos dias de 2023 e as entidades representativas da indústria e do comércio divulgaram notas de apoio ao texto aprovado e ecoaram o mantra que vem sendo propagado desde o início dos debates em torno da PEC 45: o novo regime simplificará o sistema, reduzirá significativamente os litígios tributários, os investimentos estrangeiros irrigarão a economia brasileira e o país finalmente alcançará crescimento econômico sustentável.

Ao tomar conhecimento de tantos alardeados aspectos positivos, me vi às voltas com pensamentos sobre o destino de Sócrates. Em “Fédon”, último dos diálogos socráticos transcritos por Platão, o filósofo passa por seus últimos momentos antes de beber a cicuta, pena que recebeu por não acreditar nos deuses gregos e por corromper a juventude de Atenas. Minha reflexão tem um único motivo: não concordo com a reforma tributária, essa deusa grega da qual não se pode falar mal. São muitas as razões, mas, para este texto eu trago duas delas.

A primeira diz respeito ao aspecto mais eloquente do novo regime, que é a desconstitucionalização de regras e garantias que atualmente protegem o contribuinte. São muitos os exemplos, mas, aqui fico com o tema da alíquota. Hoje há previsão constitucional para alíquotas máximas e mínimas do ICMS e do ISS. Agora não há. Caberá exclusivamente à lei a fixação da alíquota do IBS, que substitui os dois outros impostos. Quando a PEC foi apresentada, o seu mentor, Bernardo Appy, divulgou que a alíquota seria de 25%. Recentemente, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, admitiu que ela pode chegar a 27,5%, mas, na avaliação de alguns economistas, como Felipe Salto, ex-secretário da Fazenda do Estado de São Paulo, a alíquota mais realista é a de 33% (VEJA 2.874). O que está por trás dessas reiteradas correções é a necessidade de a carga tributária satisfazer aos anseios dos municípios e estados. O mais preocupante é que os debates sobre esse relevante aspecto estarão nas bases de leis, que contam com aprovações mais simplificadas quando comparadas ao quórum qualificado exigido para alterações constitucionais e, por isso, a alíquota do imposto estará sempre ao sabor do momento e poderá ser alterada com mais facilidade.

A segunda razão está no aumento de preços. Apesar de o texto da reforma tributária estipular que não haverá majoração da carga tributária em relação ao produto interno bruto, é inegável que importantes setores econômicos arcarão, sim, com impostos maiores. A esse respeito, o site da VEJA publicou, em 15 de janeiro, resultado de pesquisa indicando que cerca de 93% das empresas julgam que terão aumento de carga tributária. Entre elas estão os prestadores de serviços, extremamente relevantes do ponto de vista econômico porque são os campeões nacionais quando se trata de geração de empregos. Em linhas gerais, atualmente prestadores de serviços pagam entre 2% e 5% sobre os valores faturados aos seus clientes. Em certos casos, a cobrança se dá em patamares menores e é calculada sobre um valor fixo apurado mensalmente. No novo cenário, os prestadores irão se sujeitar à alíquota de 25%, 27,5% ou 33% (não sabemos). Claro que a nova carga tributária irá refletir nos preços praticados. Outro ponto sensível à economia nacional está no aumento dos preços dos alimentos. De acordo com a reforma aprovada, itens da cesta básica não serão tributadas. Entretanto, não há menção a isenções ou regimes diferenciados sobre a cadeia de produção dos alimentos, como existe hoje, e a deflagração de impostos sobre essa cadeia causará aumento de seus custos e, portanto, de seus preços. O mesmo se diga aos medicamentos, que atualmente contam com reduções tributárias, mas, não está claro se esses regimes serão replicados no futuro.

Aumentos como esses impactarão nos índices inflacionários e, com eles, nos contratos que seguem sua atualização, como contratos de aluguéis, por exemplo. Em um país em que a população de baixa renda já se viu diante da necessidade de comprar pé de galinha para fazer ensopado porque não tinha recursos para carne, frango ou ovos, incertezas jurídicas e aumento de preços no horizonte são prenúncios perigosos. Espero que não nos reste só a cicuta.

* Adolpho Bergamini é advogado,  professor e autor de livros e diversos textos de direito tributário. Ex-Conselheiro do CARF e juiz do TIT/SP há 14 anos

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