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Conta-Gotas

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Pequenos diálogos para desbravar grandes obras & ideias − e cuidar melhor de si e do mundo
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Os livros como protagonistas da vida… e de um livro

Em 'O Vício dos Livros', o português Afonso Cruz expõe, com humor e sensibilidade, a mágica por trás de um objeto capaz de mudar o mundo

Por Diogo Sponchiato Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 1 ago 2024, 13h16 - Publicado em 1 ago 2024, 10h59
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  • Eles podem salvar vidas, reunir pessoas, causar problemas, oxigenar as ideias, criar e exorcizar demônios… Há quem fuja deles. Há quem os consuma compulsivamente. Se estamos aqui para contar história(s), é porque esses objetos sobreviveram e resistem, ainda que as distrações atuais (e digitais) sejam um adversário da pesada.

    E é claro que só eles poderiam protagonizar O Vício dos Livros, a nova obra do escritor português Afonso Cruz publicada pela Editora Dublinense. Com sua prosa saborosa e bem-humorada, o autor nos convida a acompanhá-lo em 31 pequenos ensaios. E edifica um feito e tanto: constrói um livro sobre livros que não interessará apenas a devoradores de livros.

    Entre causos, citações e reflexões, Cruz – que dá as caras nas livrarias com romances engenhosos como Vamos Comprar um Poeta e Para Onde Vão os Guarda-Chuvas, também da lavra da Dublinense – mostra como os livros têm o condão de mudar destinos, individuais e coletivos, ainda que nem sempre fisguem multidões.

    O vício dos livros

    vicio-livros

    Como de praxe, a coluna Conta-Gotas deixou três perguntas com o autor:

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    1. Sobre o vício (ou a virtude) dos livros, acredita que é realmente possível contaminar as pessoas com o vírus da leitura?

    2. No livro, você pondera sobre os fatores que roubam a atenção dos livros. Estamos condenados a ser uma tribo cada vez menor de leitores contumazes?

    3. Evocando outra história presente na obra, a que faz menção a uma inscrição na biblioteca do faraó, os livros seriam a melhor terapia para a alma?

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    Como bom prosador que é, Cruz respondeu em um único texto. E, penso eu, bem que ele poderia ser incluído na próxima edição de O Vício dos Livros. Com a palavra, o escritor.

    afonso-cruz
    (Foto: Acervo pessoal/Reprodução)

     

    Vivo no interior de Portugal, no campo. Por vezes ainda acontece de algumas pessoas me pedirem ajuda para ler os preços no supermercado ou os ingredientes de algum produto. Historicamente, a população dividia-se em pessoas que não sabiam ler e uma elite que sabia. No caso de Portugal, quando meu pai nasceu, cerca de metade da população era analfabeta.

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    Isso tem mudado globalmente, ainda que em diferentes dimensões. Os leitores aumentam, e são a maioria, ainda que não sejam propriamente leitores de livros e/ou leitores assíduos de livros. O primeiro passo é esse: ter uma população letrada.

    O acesso à cultura, relembro, é um dos direitos humanos. Assim, os leitores não são uma tribo cada vez menor, mas uma tribo com potencial de crescimento que nunca teve antes, ainda que existam muitas dificuldades associadas. A leitura não é tão sedutora como são outras formas de entretenimento, é exigente, coloca-nos muitas vezes em silêncio, interrompe o mundo à nossa volta, faz-nos refletir.

    Mas, pela sua lentidão inerente, é um exercício espiritual formador e porventura uma terapia: é possível que seja a arte com maior capacidade para mudar o pensamento abstrato, construí-lo e reconstruí-lo, e eventualmente alterar o que sentimos em relação ao outro e em relação a nós mesmos. É capaz de traçar um rumo para o nosso futuro ao mesmo tempo que molda o passado.

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    A ficção não é apenas um exercício intelectual, é também emocional e, como sabemos, as paixões conseguem alterar-nos com mais facilidade. É mais fácil morrer de amor do que por um arrazoado filosófico.

    Posto isso, não faz milagres. Relembro uma conhecida frase de George Steiner, do livro Linguagem e Silêncio: “Sabemos agora que um homem pode ler Goethe ou Rilke à noite, tocar Bach e Schubert, e voltar na manhã seguinte ao seu trabalho em Auschwitz.”

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