Pedro Malan
“Quando quarenta invernos assediarem teu semblante” é a abertura de um dos mais belos sonetos de Shakespeare. À época, 40 anos era uma idade respeitável, a beleza era peregrina e, não mais que de repente, a força e o espírito da juventude se haviam esvaído. Hoje, chegar aos 80 invernos não é a raridade excepcional de antanho. Muitos – e muitas – o fazem. Mas chegar aos 80 mantendo extrema lucidez no infindável diálogo entre passado e futuro (seu próprio, do seu país e do mundo) é raro, muito raro. Quando, além disso, se chega aos 80 com invejável sentido de humor, marcante presença na vida política e no debate de temas de interesse público, é quase um desaforo.
Pois bem, é o que sempre fez, e faz hoje, nessa idade, o presidente Fernando Henrique Cardoso, com quem tive o privilégio e o prazer de trabalhar na última década de meus quase 40 invernos de serviço publico. A amizade, que já existia, só fez se consolidar desde então. Espero que, quando o Brasil puder alcançar um mínimo de perspectiva histórica sobre nosso passado recente, se possa fazer justiça a Fernando Henrique Cardoso – à sua pessoa e a seu governo. Que venham os 90 invernos. Afinal, como escreveu Chaucer, “tão curta a vida, tão longo o ofício de aprender”.