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Augusto Nunes

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O clima da resistência

O agronegócio teme a perda de mercado. Com o desmatamento, vai se dar conta da perda das chuvas

Por Fernando Gabeira
Atualizado em 30 jul 2020, 19h30 - Publicado em 13 ago 2019, 07h02
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  • Fernando Gabeira (publicado no Blog do Gabeira)

    Às vezes, tenho uma fantasia de deixar tudo por um tempo: escrever um livro numa pequena cidade costeira de Portugal ou me internar na Mata Atlântica, para fotografar bichos e plantas nas horas vagas. Apenas uma fantasia, fruto dos ásperos tempos em que vivemos. Não consigo deixar o Brasil, seguir as tramas, ainda que nem sempre on-line.

    Entre outros, o tema que me preocupa é a política ambiental. Não especialmente as frases provocativas de Bolsonaro. Sei distinguir a retórica da realidade.

    Nas últimas semanas, sinto crescer no governo, inclusive entre generais, uma forma de tratar a Amazônia com um tom nacionalista e até mesmo agressivo que, certamente, terá consequências.

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    A Noruega, no discurso desses setores militares, é a vilã do momento. O discurso do governo é de que a Noruega não pode criticar o Brasil, porque extrai petróleo no Ártico, mata baleias e uma empresa norueguesa provocou um desastre ambiental em Barcarena, no Pará.

    Tudo isso é reação à tentativa da Noruega e da Alemanha de manterem o espírito do Fundo Amazônia, que financia projetos sustentáveis na região. Creio que está se perdendo o sentido do problema ambiental em escala planetária, que demanda muito mais a cooperação entre os países do que a troca de farpas.

    A Noruega e a Alemanha se interessam pela Amazônia porque estão investindo ali e precisam dar satisfação aos seus contribuintes.

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    Num quadro tão delicado como o do aquecimento global, não se devem suprimir críticas entre países: existem canais próprios para isso. A tática de se defender apontando os erros dos outros não funciona. A França fez explosões nucleares na Polinésia, a Inglaterra caça raposas. Seria um processo interminável.

    É uma tática que lembra o processo de corrupção no Brasil, onde os partidos atingidos lembravam sempre os erros dos outros. A tese é essa: se todos fazem, por que não fazer também?

    Existe um grande interesse internacional pela Amazônia. Muitas pessoas são ligadas afetivamente à região porque a consideram vital para o planeta. Não há razão para ter ciúmes, mas sim tirar proveito dessa onda positiva.

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    Bolsonaro diz que a Amazônia é uma virgem que muitos querem violentar. Acrescentou que vai permitir o garimpo na região. Isso não me assusta tanto. Nenhum governo conseguiu proibir ou mesmo fiscalizar o garimpo na Amazônia.

    Se formos agora ao pequeno aeroporto de Laranjal do Jari, veremos os aviões chegando e partindo para o garimpo. Entrevistei um garimpeiro que já sofreu cinco desastres aéreos na floresta. Hoje é pastor, mas continua garimpando.

    Bolsonaro afirmou que quer atrair empresas americanas para explorar minério na Amazônia. É um problema. Não porque sejam americanas. Poderiam ser japonesas, sul-africanas, não importa.

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    O modelo de desenvolvimento está em jogo. De fato, iniciativas sustentáveis ou mesmo formas pré-industriais de atividade econômica não representam uma saída única para a Amazônia.

    No Brasil, e também nos Estados Unidos, a defesa do meio ambiente é associada à esquerda, a uma visão anticapitalista. Isso explica parcialmente a reação agressiva de Bolsonaro. No discurso da extrema direita, o aquecimento global é uma invenção marxista; os dados do desmatamento, uma armação contra o Brasil.

    No entanto, é possível discutir uma saída dentro do capitalismo para a Amazônia, confrontando duas linhas. Uma delas é usar o conhecimento e a biotecnologia para manter e valorizar a floresta em pé. A outra é enfatizar o lado tradicional da economia, com mineração intensa, criação de gado, industrias.

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    Na verdade, não são totalmente excludentes. Mas a escolha da primeira linha como hegemônica tem a vantagem da sustentabilidade, recompensa o saber tradicional das comunidades.

    O projeto amazônico de Bolsonaro, que parece ter ressonância nas Forças Armadas, pode nos conduzir a um isolamento internacional, boicote de nossos produtos, uma derrota política e econômica.

    Sem contar com o principal efeito negativo: a perda da biodiversidade, os reflexos no próprio clima. O agronegócio já percebeu a resistência externa a esta opção do governo. Por enquanto, teme a perda de mercado. Com o desmatamento, vai se dar conta da perda das chuvas.

    Essa é uma das muitas razões para resistir.

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