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Gil Castelo Branco: As vacas sagradas dos políticos e empresários

Publicado no Globo Na Índia, a vaca é considerada um animal sagrado. Assim, não pode ser morta, ferida e tem passe livre para circular, sem ser incomodada, pelas ruas das principais cidades do país. Na crença hinduísta, muitos deuses têm animais como montarias, e estes se tornam sacros. A vaca é considerada a montaria de […]

Por Augusto Nunes Atualizado em 30 jul 2020, 23h51 - Publicado em 15 dez 2015, 16h31
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  • Publicado no Globo

    Na Índia, a vaca é considerada um animal sagrado. Assim, não pode ser morta, ferida e tem passe livre para circular, sem ser incomodada, pelas ruas das principais cidades do país. Na crença hinduísta, muitos deuses têm animais como montarias, e estes se tornam sacros. A vaca é considerada a montaria de um dos deuses mais populares do país, o Shiva, responsável pela renovação. Desta forma, não convide um indiano para um churrasco, pois a gentileza poderá ser considerada uma ofensa.

    No Brasil, porém, o bovino não tem essa conotação mística. Ao contrário, o gado e seus subprodutos frequentemente explicam transações econômicas no mínimo estranhas.

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    O ex-governador do Distrito Federal Joaquim Roriz, por exemplo, foi condenado pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios por improbidade administrativa no caso conhecido como Bezerra de Ouro. Em 2007, quando era senador, ele descontou dois cheques do fundador da Gol, Nenê Constantino, no Banco de Brasília (BRB), no valor de R$ 2,2 milhões. A operação foi considerada estranha, pois nenhuma das partes tinha conta no BRB, levantando a suspeita de lavagem de dinheiro. Na época, Roriz afirmou que pegou o dinheiro emprestado para comprar o embrião de uma bezerra de raça, em São Paulo.

    O presidente do Senado, Renan Calheiros, também responde no Supremo Tribunal Federal (STF) à acusação de improbidade administrativa. A ação remonta a um caso de 2007, que levou Renan à renúncia do cargo de presidente do Senado. A Procuradoria da República no Distrito Federal considera que o senador recebeu propina da construtora Mendes Junior para pagar despesas pessoais de relação extraconjugal com uma jornalista, com quem Renan tem uma filha. Na ação consta que um lobista da empreiteira fazia os pagamentos à jornalista e, em contrapartida, a construtora era beneficiada por emendas parlamentares apresentadas pelo senador.

    Para comprovar que tinha condições de arcar com os gastos sozinho, o senador apresentou notas fiscais de vendas de bois. Mas a Polícia Federal concluiu que aqueles documentos não garantiam recursos para quitar a pensão alimentícia e aluguéis e, ainda, que os papéis não comprovavam a venda de gado. Assim, além das investigações da Lava Jato relativas ao senador, seria interessante o STF concluir o julgamento do caso que ficou conhecido como “os bois de Alagoas”.

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    O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, que tenta salvar a sua pele no Conselho de Ética da Casa, é acusado de ter recebido cerca de R$ 5 milhões em propina do esquema de corrupção na Petrobras. A defesa do deputado alega que antes de entrar na vida pública — no começo dos anos 90, quando assumiu a presidência da Telerj — Cunha descobriu um verdadeiro filé mignon: a venda de carne processada e enlatada em consignação para países africanos. Desta forma, com os lucros da carne enlatada e de aplicações financeiras, o deputado abriu dois “trustes” e não contas no exterior. O truste consiste na entrega de um bem ou valor a uma instituição para que seja administrado em favor do depositante ou de outra pessoa por ele indicada. A história está apenas começando. Vale lembrar que até hoje Maluf afirma não ter dinheiro no exterior…

    Mais recentemente, o pecuarista amigo de Lula José Carlos Bumlai — o homem que tinha “passe livre” no Palácio do Planalto — foi preso por suposta operação fictícia de dação de “embriões de gado de elite” para agropecuárias do Grupo Schahin. Esse contrato de sêmen de boi com o grupo seria a forma de simular a quitação formal do empréstimo de R$ 12 milhões concedido em 2004 pelo banco ao pecuarista. O dinheiro, que nunca foi devolvido para a Schahin, teria abastecido os cofres do PT e campanhas do partido, entre elas a reeleição do ex-presidente Lula, em 2006, conforme suspeita a força-tarefa da Operação Lava Jato. Ao que indicam as delações premiadas, o valor de R$ 12 milhões dados a Bumlai em 2004 foi pago com um contrato de operação do navio-sonda Vitória 10.000, dirigido irregularmente para a Schahin. A dação de sêmen é conversa para boi dormir.

    Até o fim da Lava Jato, o rebanho de inocentes que se defende com o gado deve aumentar. Para o Ministério Público, em muitos casos, tem boi na linha. As relações de alguns desses políticos/empresários com a pecuária parecem ser semelhantes às de um indiano com uma picanha malpassada.

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    Na Índia, outros animais também são santificados. O rato, por exemplo, é considerado a montaria do Deus Ganesh. Mas esta é uma outra história….

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