William Waack (publicado no Estadão)
A apresentação da candidatura de Lula é uma farsa. Ou, para ficar no termo da moda, é fake. As fake news realmente perigosas são as que tem uma verossimilhança com fatos reais, parecem explicar “mistérios” e reforçam preconceitos.
O script do fake lulista está perfeitamente descrito no artigo de opinião que publicou no (desavisado?) The New York Times. É a mesma narrativa de muitos anos atrás, a do pobre (com patrimônio de 7,9 milhões declarado à justiça eleitoral) representante de anseios populares perseguido por elites raivosas aliadas à imprensa e o Judiciário.
Essa narrativa foi amplamente desmentida pelos fatos, mas fakes não se interessam nem buscam fatos. É o que o historiador Timothy Snyder recentemente abordou num livro (The Road to Unfreedom) que está fazendo grande sucesso ao descrever e explicar fenômenos de líderes populistas do século 21 ao redor do mundo.
“O líder”, escreve o historiador, “se apresenta sozinho e caminha sozinho, pois ele vê qual é o futuro da política e sabe o que tem de ser feito”.
No caso do PT, o que tem de ser feito é o que Lula sempre mandou fazer: ele está em primeiro e em último lugar. Ninguém cresce à sombra dele ─ o que se tornou, neste momento, muito mais um problema do que uma qualidade do partido, mas dane-se o partido.
Nenhum dos componentes do fake eleitoral lulista escapa ao clássico da charlatanice, mentira e enganação, além de se constituir numa grotesca narrativa de fatos históricos brasileiros recentes. Mas a questão não é essa. A pergunta correta é indagar quais as razões pelas quais esse fake (o da vitimização, perseguição e conspiração de elites contra o homem do povo) recebe uma forte adesão por parte de considerável número de eleitores, a julgar pelas pesquisas de intenção de voto.
Não há nada em Lula remotamente parecido a Mandela, o homem que sai da cadeia com uma visão de História e de seu papel nela, e de sua missão de levar um país inteiro para além do monstruoso regime do apartheid. Mesmo assim o PT consegue iludir até plateias no exterior a respeito de um “mártir” que nunca mostrou grandeza moral começando pela conduta frente a amigos e pessoas próximas.
Para tentar responder a questão acima, é obrigatório constatar que Lula representa, sim, uma parte considerável da mentalidade e do caráter de todos nós, sociedade brasileira, que inclui desprezo pela lei, apego ao estatismo, à distribuição do dinheiro público aos mais variados segmentos, incluindo do empresariado e sistema financeiro.
Resta então mais uma e decisiva indagação para este momento particular do processo político eleitoral: quantos votos Lula transfere para seu poste?
Mais votos do que seria agradável reconhecer levando em consideração o papel central do PT no alargamento da corrupção endêmica do País e o papel peculiar que o próprio Lula representou ao ridicularizar e banalizar instituições, começando pela da Presidência. Mas menos votos do que seria necessário para “garantir”, desde já, seu poste no segundo turno.
Pois o fake Lula tem sido nos últimos três anos o exemplo sobretudo do chefão político que perdeu o senso de realidade e cometeu um erro atrás do outro. Dilma foi o maior erro de sua vida, mas, desde o começo de 2016, Lula deixou claro a seus adversários ─ e de graça ─ que não era o dono das ruas e que não conseguiria mobilizar gente suficiente para impedir a derrubada do governo petista.
Ironicamente, vai chegando ao ponto no qual conseguir colocar um poste no segundo turno (a probabilidade existe, mas não a vejo tão forte) seria um feito extraordinário, depois do que hoje se sabe sobre o período lulopetista. E, ao mesmo tempo, o seu fim.