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Augusto Nunes

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As campeãs nacionais continuam roendo os bolsos dos brasileiros

O maior mérito da Operação Carne Fraca foi desnudar ainda mais a promiscuidade entre governo, fiscais e empresários

Por Branca Nunes Atualizado em 30 mar 2017, 11h03 - Publicado em 30 mar 2017, 09h19
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  • O envolvimento da JBS e da BRF nos casos investigados pela Operação Carne Fraca é o mais recente capítulo do livro, ainda longe do fim, produzido pelas “campeãs nacionais” — dois colossos estatais e um punhado de empresas brasileiras escolhidas pelo governo Lula para transformar-se, com financiamentos do BNDES e incentivos fiscais de pai para filho, em multinacionais suficientemente poderosas para enfrentar de igual para igual conglomerados estrangeiros de grande porte e escancarar a pujança da potência econômica que o presidente milagreiro inventou.

    Até o início do governo Dilma, quando a realidade se impôs à fantasia, o BNDES despejou mais de R$ 30 bilhões na aventura megalomaníaca. As empresas eleitas pelo Planalto tinham boa saúde financeira, mas o critério que mais pesou na escolha das campeãs foi o tamanho dos desembolsos em campanhas eleitorais e o grau de intimidade que ligava os principais executivos ao presidente da República e seus parceiros no poder.

    Mais relevante do que a localização de produtos com salmonela, recheados por papelão ou com prazo de validade vencido ─ abjeções bem menos frequentes do que alardeou a Polícia Federal num primeiro momento – foi a confirmação, pela Carne Fraca, de que também nesse setor viceja o tumor que corrói toda a economia brasileira: a lucrativa promiscuidade entre o público e o privado.

    Alardeada como a supertele nacional, a Oi acabou protagonizando, em junho de 2016, o mais portentoso pedido de recuperação judicial da história do país, com dívidas que ultrapassavam os R$ 65,4 bilhões.

    A varinha de condão do governo pousou sobre a Oi em 2008, quando a Anatel aprovou a compra da Brasil Telecom pela Telemar, o maior negócio do setor depois da privatização da Telebras, em 1998. A fusão, que deu origem à Oi, não aconteceria sem que Lula tivesse modificado uma regra da Lei Geral de Telecomunicações, que proibia um controlador de possuir duas concessionárias de telefonia fixa. As mudanças foram autorizadas em menos de 30 dias. Sob o argumento de que convinha apoiar uma empresa brasileira na competição com grupos privados estrangeiros que atuavam no país, a Telemar recebeu, via Banco do Brasil e BNDES, R$ 6,8 bilhões para a compra da operadora.

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    Três anos antes, por uma coincidência feliz (para a empresa e para o beneficiário do negócio), a Brasil Telecom havia investido R$ 5 milhões na insignificante Gamecorp, empresa que tinha como único trunfo a presença entre os sócios proprietários de Fábio Luís Lula da Silva, filho do ex-presidente. Até então uma companhia de pequeno porte, a Gamecorp movimentou mais de R$ 300 milhões entre 2005 e 2016 e é hoje um dos alvos da Operação Lava Jato

    Criada para tornar-se o gigante dos lácteos, a LBR pediu recuperação judicial em 2013, legando ao BNDES um prejuízo de R$ 700 milhões. Enquanto isso, Eike Batista, que fez seu império X cair nas graças do governo federal pagando por baixo do pano generosas porcentagens, foi além da falência: virou réu por corrupção e lavagem de dinheiro e está preso desde janeiro. Entre 2003 e 2014, o BNDES abençoou o empresário com R$ 10 bilhões, dos quais apenas R$ 6 bilhões foram efetivamente contratados.

    Entre as futuras campeãs estavam a Eletrobras e a Petrobras. Como, pelas regras da OMC, o BNDES não pode financiar estatais, o banco emprestou dinheiro em condições singularmente privilegiadas para os fornecedores da Eletrobras. O objetivo, alegou o governo, era permitir à empresa disputar contratos também no exterior. Obrigada a baixar as tarifas de energia para ajudar a bancar uma redução média de 20% na conta de luz em 2012 e envolvida em diversos casos de corrupção, a Eletrobras está tecnicamente quebrada.

    Maior empresa nacional, a Petrobras quase teve o mesmo destino. Depois de 13 anos como alvo preferencial da ganância dos políticos, forçada a comprar refinarias sucateadas, desperdiçar bilhões de reais em projetos ruinosos concebidos por governantes estrangeiros amigos de Lula e vergar-se ao aparelhamento oportunista, a estatal só escapou da completa destruição porque a Lava Jato descobriu o esquema do Petrolão.

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    No setor alimentício, a Brasil Foods (BRF), dona da Sadia e da Perdigão, e a JBS, controladora das marcas Friboi e Seara e líder mundial entre as empresas que lidam com proteína animal, pareciam imunes a concorrentes até a explosão da Operação Carne Fraca. “Quando se faz uma política de campeões nacionais e o governo arbitra, automaticamente se cria uma cadeia de perdedores”, disse em 2015 o empresário Graciano Roberto Russo, ex-controlador do frigorífico Independência, num depoimento à CPI do BNDES. Um dos “perdedores”, o Independência quebrou em 2009, enquanto a JBS se consolidava como gigante global sob o guarda-chuva do BNDES.

    Se tamanha interferência do Estado na economia é absurda, ainda mais espantosos foram os critérios de seleção utilizados pelos pais da ideia malograda. As escolhas beneficiaram invariavelmente empresas que mantinham estreitas (e estranhas) relações com o governo (e com os donos do poder). As consequências dessa suspeita intimidade, escancaradas pela Operação Lava Jato, acabam de ser novamente expostas pela Carne Fraca: dezenas de fiscais alheios aos interesses do povo, cargos públicos preenchidos por indicações políticas, abusos generalizados e corrupção institucionalizada.

    Essa política nasceu condenada à morte breve. Sepultada há tempos, continua roendo os bolsos de todos os brasileiros que pagam impostos.

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