Numa crônica sobre a despedida de Ronaldo, o jornalista Juca Kfouri tabelou com dois craques para mostrar o que sente um boleiro na hora do adeus. “Só o jogador de futebol morre duas vezes”, devolveu Falcão de trivela. “Não é o jogador que abandona o futebol, é o futebol que abandona o jogador”, tocou Sócrates de calcanhar. Doloroso para qualquer profissional, o encerramento da carreira é certamente muito mais angustiante para os gênios dos estádios.
É compreensível que a maioria prolongue além do aconselhável o tempo de permanência em campo: estão apenas adiando o momento da primeira morte, expressão usada por Ronaldo na entrevista em que oficializou a decisão de aposentar-se. Pelé, perfeito da primeira linha ao ponto final, foi um dos poucos a parar na hora exata. Foi para o vestiário antes que aparecesse algum sinal de que a bola já não estava tão apaixonada pelo Rei. Em contrapartida, Garrincha arrastou-se envelhecido por campos maltratados, simulando patéticas reprises do drible incomparável.
Ronaldo deveria ter-se despedido mais cedo? Isso agora é irrelevante. Como Pelé, como Garrincha, como todos os outros, o Fenômeno será sempre lembrado pelo que fez, não pelo que deixou de fazer. Pelos muitos gols que marcou, não pelos poucos que perdeu. Pelas arrancadas assombrosas, não por passadas mais lentas. Pelas três vezes em que foi eleito o melhor jogador do mundo, não pelos anos em que o trofeu contemplou outro craque.
Daqui a muitos anos, se alguém duvidar do que estaremos dizendo, basta exibir o vídeo que reúne, na seção História em Imagens, alguns dos grandes momentos do magnífico Ronaldo. Ele foi aquilo. Foi, é e será. Consumada a primeira morte, o Fenômeno tornou-se eterno.