O Egito antigo é conhecido pelo seu avanço tecnológico, evidenciado pela notável tecnologia desenvolvida para construir as pirâmides, até hoje surpreendentes. O domínio, no entanto, não se restringia à engenharia e as descobertas científicas mostram que, também na medicina, seus feitos eram admiráveis.
A mais recente dessas descobertas veio da Universidade de Oxford. Ao analisar esqueletos de 4 mil anos de idade, em busca de compreender como o câncer afetava populações antigas, a pesquisadora Tatiana Tondini encontrou marcas no crânio que sugerem que os antigos egípcios tentavam estudar ou tratar o câncer.
“Quando cheguei à primeira lesão que tinha aquelas marcas de corte, inicialmente não tive certeza sobre o que eu estava vendo ali”, disse a pesquisadora em entrevista a VEJA. “Caracterizamos as marcas e confirmamos que eram de origem humana e ocorreram antes ou imediatamente após a morte do indivíduo. Em poucos minutos, todo o nosso laboratório estava lotado de outros pesquisadores, técnicos e professores, que estavam ao redor do microscópio olhando as lesões sem acreditar no que estavam vendo.”
Investigações de papiros médicos antigos já haviam revelado que os egípcios conheciam o câncer e o definiam como uma condição intratável, mas essa é a primeira vez que a encontram evidências de que eles manipulavam as lesões de alguma maneira. Por enquanto, no entanto, ainda não é possível dizer se essas marcas decorreram de uma tentativa de investigar ou de tratar a doença — caso o segundo caso se confirmasse, essa seria a mais antiga evidência de cirurgia oncológica já registrada pela ciência.
Quais eram as habilidades médicas dos egípcios antigos?
Essa não foi a única descoberta feita pelos pesquisadores. No artigo, publicado em junho no periódico científico Frontiers in Medicine, os autores também revelam a habilidade desse povo na área de traumatologia. “O segundo achado importante diz respeito ao sucesso do tratamento da lesão óssea frontal em um dos crânios”, diz Tondini. “De acordo com nossa análise, tal lesão foi causada por um objeto pontiagudo como uma espada ou machadinha. É muito improvável que o indivíduo tenha sobrevivido sem tratamento adequado.”
A análise, contudo, mostra que a fratura apresentava sinais claros de cura, o que sugere que o indivíduo, não só passou por algum tipo de procedimento curativo, como sobreviveu por um longo período após o tratamento.
Outros trabalhos também já haviam revelado a destreza dos egípcios antigos na medicina. Embora não seja possível dizer que existia uma ciência formal por trás dessas habilidades, documentos mostram que eles tinham um profundo conhecimento sobre o funcionamento do corpo humano, sendo capazes de tratar diversas doenças, desenvolver próteses e até fazer obturações dentárias.
O que se sabe sobre a medicina em outros povos tradicionais?
Embora o conhecimento dos egípcios na área seja distinto, tendo inclusive, servido de fonte de aprendizado para civilizações gregas e romanas, outros povos também tinham suas formas de cura.
Na América Latina, por exemplo, povos indígenas, como os maias e os astecas, tinham extenso conhecimento sobre ervas medicinais. Na China milenar, técnicas tradicionais como a acupuntura ganhavam espaço.
Acredita-se que muitos desses conhecimentos vinham da observação dos animais, o que sugere que a vocação médica talvez seja algo mais antigo que a própria humanidade. A título de ilustração, em um trabalho recente, pesquisadores mostraram que um orangotango tratou uma ferida com sucesso ao utilizar topicamente uma erva extensamente conhecida pela medicina tradicional humana pelas suas propriedades curativas. É, sem dúvida, caso de uma ode à natureza, à inteligência e, por que não, à humildade humana.