A ideia de substituir um pedaço de picanha por uma berinjela pode causar calafrios nos churrasqueiros mais entusiasmados. No entanto, um estudo publicado hoje, 12, pela Revista Nature Communications sugere que esse tipo de substituição pode ser imprescindível para a sobrevivência do planeta. De acordo com os dados apresentados, trocar cerca de 50% da carne e dos laticínios por alternativas à base de plantas até 2050 poderia reduzir as emissões de gases de efeito estufa relacionados à agricultura e uso do solo em até 31%.
A adoção de uma dieta variada, com o incremento de produtos a base de vegetais e a redução do consumo de carnes, leites e derivados poderia, portanto, resultar em benefícios para o clima e a biodiversidade, preservando a integridade dos ecossistemas globais e contribuindo para o controle das emissões de gases poluentes. Além disso, os autores alegam que a mudança nas preferências alimentares poderia contribuir para o reflorestamento de áreas degradadas e a recuperação do solo em regiões de intensa atividade pecuária. Embora esse tipo de transição no comportamento alimentar possa ser desafiadora e exija uma série de inovações tecnológicas e intervenções políticas, os ganhos ambientais justificariam o esforço.
“É muito importante pensar o papel que a pecuária tem nessa cadeia”, diz Gus Guadagnini, diretor executivo do The Good Food Brazil, organização internacional que busca por alternativas vegetais para substituir o consumo de produtos de origem animal, que não fez parte da pesquisa. “Atualmente cerca de 80% das áreas cultiváveis do planeta geram menos de 20% das calorias que o mundo consome. Apenas uma pequena parcela é destinada à produção de comida. A maior parte é usada para gado, como pasto, ou para a produção de grãos que vão servir para alimentar esse gado”.
Nos cenários desenvolvidos pelos pesquisadores, a substituição da carne por alternativas vegetais diminuiria 12% da área agrícola destinada à produção alimentar, interromperia quase integralmente o declínio de áreas florestais, diminuiria em até 10% o consumo global de água e reduziria em até 31 milhões o número de pessoas subnutridas.
“Estamos olhando para uma questão social muito importante, que diz respeito ao uso de recursos da terra neste momento e no futuro, onde teremos que encontrar formas de alimentar ainda mais gente em um planeta que já não suporta o uso que fazemos dele agora”, afirma Guadagnini. Há um alerta, porém, os benefícios das mudanças no comportamento alimentar só serão completos se as terras agrícolas poupadas pela pecuária e produção de commodities forem reflorestadas com ampla biodiversidade.
O estudo considera que os impactos podem diferir em diferentes regiões do planeta em razão de características locais, como o tamanho da população, a produtividade agrícola e a participação no comércio internacional de produtos agropecuários. No que diz respeito aos impactos na produção, por exemplo, os autores preveem a China como um dos países mais afetados. Já no que se refere a impactos ambientais, países da África Subsaariana e da América do Sul poderiam apresentar os melhores desempenhos.