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“O preconceito contra a cannabis vem da falta de conhecimento”

Allan Paiotti, CEO da Cannect, que conecta médicos e pacientes, fala sobre o potencial do mercado brasileiro e o interesse crescente pelo tema

Por André Sollitto Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 26 Maio 2022, 19h41 - Publicado em 26 Maio 2022, 17h40

Ao mesmo tempo em que existe muito interesse sobre o uso medicinal e recreativo da cannabis e cada nova descoberta científica é acompanhada com atenção, há um enorme preconceito que precisa ser vencido. Nesse cenário, apresentar os benefícios e desfazer estigmas é um dos grandes dilemas de quem atua no setor.

Em entrevista a VEJA, Allan Paiotti, CEO da Cannect, plataforma que se propõe a conectar pacientes que precisam de tratamentos e médicos capazes de prescrever os medicamentos corretos, aborda o crescimento do mercado, o potencial do Brasil e as barreiras que ainda existem em relação à maconha. São muitas, mas a situação vem mudando rapidamente.

Parte desse processo de transformação, a Cannect anunciou recentemente a fusão com a Dr. Cannabis, outra empresa de atuação semelhante, mas que conta também com uma agenda de eventos. Eventualmente, as duas marcas se transformarão em uma só, de forma gradual. E o anúncio foi feito após uma captação de R$ 10 milhões, recursos usados pela Cannect para ampliar a equipe e aprimorar a plataforma tecnológica.

Confira a entrevista:

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Ainda há um grande preconceito com a cannabis. Como reverter essa situação?

Essa é a avaliação do cenário: o preconceito contra a cannabis vem da falta de conhecimento. Há um estigma histórico associado ao uso recreativo da maconha, do “maconheiro” que fica “chapado”. Aquilo é absolutamente inverídico e os estudos no mundo inteiro vêm mostrando isso, desmistificando seu uso. E a melhor maneira de combater o preconceito é com conhecimento. Oferecemos cursos para médicos, material científico de apoio, conteúdo que fala sobre cannabis, tudo gratuito. Queremos assumir o papel de protagonistas de conteúdo e ajudar a educar.

A maconha tem sido mais discutida, tanto o uso recreativo quanto o uso medicinal.

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Sim, e isso é importante para começar a entender o assunto. Mesmo no seu círculo de amigos ou parentes tem gente que tem muita curiosidade, quer entender. Às vezes está usando e a gente nem sabia. Há uma vontade de conhecer o tema. E, quanto mais se fala sobre isso, melhor. Fizemos uma tabulação e vimos que 70% das matérias publicadas sobre o tema cannabis têm falado do tema de tratamentos, estudos científicos, mostrado casos de pacientes que estão usando. É uma longa jornada, mas estamos no caminho certo. 

Allan Paiotti, CEO da Cannect -
Allan Paiotti, CEO da Cannect – (Divulgação/Divulgação)

Você tem acompanhado essa transformação de perto. Como o mercado tem se aberto a oportunidades relacionadas ao uso da cannabis?

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A Cannect surgiu em julho de 2021. Eu vinha de uma experiência em um hospital de excelência, mais tradicional. E até o ano passado, o tema cannabis pouco entrava nos hospitais. Mas isso está mudando, e de forma acelerada. A adoção nos Estados Unidos, e também no Canadá, que puxou essa revolução, foi determinante. Quando os Estados Unidos entraram nisso, a indústria se transformou. Aqui, a regulamentação ainda é um pouco mais restritiva, mas há permeabilidade para o que está acontecendo lá fora. Em 2020, as prescrições no Brasil ficaram entre 15 mil e 20 mil. No ano passado, passaram para 70 mil, e a projeção para 2022 é que superem 200 mil. Está começando a escalar, e rápido. Os médicos prescritores, por exemplo, são apenas 2 mil em um universo de mais de 500 mil.

Isso mostra que há um potencial enorme de crescimento no Brasil.

Esse mercado vai explodir, e bem mais rápido do que muita gente antecipou. 

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Quais são as barreiras que ainda existem?

Como falamos, a primeira é a falta de conhecimento. Os médicos que são referência em suas áreas são de uma geração que se formou no final da década de 1980. Esses profissionais, que têm hoje mais de 60 anos, já têm uma visão formada sobre o uso da medicina, têm seus consultórios e redes de pacientes. E têm maior resistência ao uso da cannabis. Digo isso na média, separando por grandes grupos, sem estereotipar. Na geração que tem entre 40 e 60 anos, a curva de adoção está em rápida expansão. Esses profissionais estão procurando oportunidades de diferenciação, e a cannabis representa isso. Ainda são poucos médicos que já sabem prescrever. E a nova geração está mais disposta a estudar, investindo energia e apoiando muito o mercado.

E os cuidados que ainda é preciso ter ao lidar com medicamentos à base de cannabis?

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A comunicação, em primeiro lugar. Mostrar que tudo o que fazemos está dentro da lei, porque esse é um temor dos pacientes. Comprar esses medicamentos não é ilegal. Outra coisa, que é um diferencial pra nós, na Cannect, é que não somos uma empresa de produto. Oferecemos a melhor base técnica e científica para que o médico escolha o melhor tratamento. Tudo o que a gente faz, comunicamos as evidências científicas. E há farta evidência dos benefícios. Pacientes com dores crônicas, Alzheimer, diversas patologias, estão melhorando. A ponto de alguns médicos afirmarem que a cannabis será para o século 21 o que o antibiótico foi para o século 20. É preciso saber lidar da maneira certa. A cannabis não serve para tudo, mas mostramos para quais patologias ela tem recomendação.

O fato de os medicamentos vendidos hoje serem importados não limita o acesso?

O preço é realmente um desafio. Mas há vantagens e desvantagens. Entre as vantagens está a enorme variedade que o médico pode escolher. O portfólio é muito grande, e o profissional tem muita opção para atender exatamente às necessidades do paciente. O frete é outra questão. Conseguimos derrubar o preço, que era de R$ 350, R$ 400 reais em agosto de 2021 para R$ 100 por importação. Trabalhamos com os fornecedores de fora, e pensamos que a maioria dos pacientes tem problemas crônicos, então vão precisar usar sempre. Há ainda outro ponto a se considerar. Hoje, os medicamentos importados não pagam imposto. Quando os medicamentos forem distribuídos em farmácias, eles pagarão imposto. A redução só será vista a médio prazo, em três, quatro, até cinco anos, quando houver produção local.

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