A análise dos dentes de um neandertal revelou que ele ingeriu plantas com o efeito semelhante ao da Aspirina e da penicilina, possivelmente para combater uma dor de dente, há, aproximadamente, 48.000 anos. Segundo pesquisa publicada nesta quarta-feira na revista científica Nature, com o estudo do material genético do indivíduo encontrado na caverna espanhola de El Sidrón, os neandertais da região também não consumiam carnes. A alimentação era baseada em cogumelos, pinhões e musgo recolhido da floresta.
“Certamente, nossas descobertas contrastam marcadamente com a visão simplista de nossos antepassados na imaginação popular”, disse Alan Cooper, da Universidade de Adelaide, na Austrália e um dos autores do estudo, em comunicado.
Medicamentos
De acordo com o estudo, feito por pesquisadores australianos e britânicos, os vestígios do jovem do sexo masculino indicavam que ele ingeriu o fungo Penicillium, que tem propriedades antibióticas e é utilizado na produção de penicilina. Ele também teria mastigado álamo, uma planta que contém ácido salicílico, um dos ingredientes da conhecida Aspirina. A descoberta foi feita graças a traços dessas substâncias preservados no tártaro calcificado nos dentes encontrados.
A mandíbula apresentava também danos causados por um possível abscesso — nódulo cheio de pus — e a placa bacteriana dos dentes estava impregnada com parasitas intestinais que provocam intensas diarreias. Com base nessas evidências, os pesquisadores concluíram que ele “estava bastante doente” e, possivelmente, apresentava uma patogenia gastrointestinal crônica.
Vegetariano
Por meio do sequenciamento do DNA encontrado em outros fósseis da espécie ao redor da Europa, os cientistas identificaram que, diferente do neandertal espanhol, os que viviam na caverna Spy ou Goyet, na Bélgica, tinham uma dieta rica em carnes, consumindo uma espécie extinta de rinocerontes e ovelhas selvagens. Nesse caso, o espanhol foge do esperado para a espécie, sem evidências de uma dieta carnívora.
Laura Weyrich, da Universidade de Adelaide, na Austrália, e líder da publicação, explicou que El Sidrón, na época, estava em um ambiente de florestas densas e oferecia ampla oferta de vegetais. “Em contraste, os homens de Neandertal de Spy viviam em um ambiente semelhante à estepe, por isso é fácil imaginar que tinham como principal fonte de alimento animais grandes e bestiais que vagavam pela região”, disse à Agência France-Presse.
Os cientistas conseguiram também reconstruir, quase que por completo, o genoma mais antigo de uma bactéria oral, a Methanobrevibacter oralis. “A placa dentária aprisiona microorganismos que viviam na boca, além de vírus, fungos e bactérias encontrados no sistema respiratório e gastrointestinal, bem como pedaços de comida presa nos dentes – preservando o DNA por milhares de anos”, afirmou Laura, em comunicado.
A manutenção do material possibilitou aos autores desvendarem o estilo de vida, condições de saúde e hábitos alimentares dessa espécie no continente europeu. “Aparentemente, os homens de Neandertal possuíam um bom conhecimento de plantas medicinais e suas propriedades anti-inflamatórias e analgésicas, e parecem ter se automedicado”, afirmou o coautor Alan Cooper. Em 2012, um estudo publicado na revista Naturwissenschaften já havia dito que a espécie extinta parecia ter usado ervas medicinais, como milefólio e camomila.
Além de descobrir mais sobre a os neandertais, a recente descoberta possibilita o estudo da evolução dos micróbios.
Neandertais
A espécie extinta Homo sapiens neanderthalensis viveu entre Europa, Oriente Médio e Ásia Central por cerca de 300.000 anos, mas desapareceram há, aproximadamente, 40.000 anos. Ainda não se sabem as causas exatas de sua extinção. Algumas hipóteses, não excludentes, são epidemias, catástrofes naturais ou o extermínio por outras populações. O que se sabe é que os neandertais foram assimilados pelos homens modernos, por meio de cruzamentos, e sucedidos pelas populações originárias de África que ocuparam gradativamente a Europa e Ásia a partir de 50.000 anos atrás. Atualmente, os humanos têm entre 1 a 3% de seu DNA com traços neandertais, exceto pelos africanos, já que a espécie nunca habitou essa região.
(Com AFP)