A erupção do Monte Vesúvio, no ano 79, foi uma catástrofe ambiental que soterrou as cidades romanas de Pompeia e Herculano sob uma espessa camada de cinzas, magma e rochas vulcânicas. A tragédia começou com uma explosão poderosa, que levantou uma nuvem escura em forma de coluna com ao menos 32 quilômetros de altura. Pompeia foi coberta por uma superaquecida mistura de gás, cinzas e fragmentos rochosos. Em Herculano, bem próxima do vulcão, os detritos carbonizaram os corpos dos seus habitantes. “A escuridão era tão intensa que dificilmente as pessoas conseguiriam se enxergar, mesmo se estivessem uma perto da outra”, escreveu o jurista Plínio, o Jovem, ao historiador Tácito, descrevendo o que via a partir de Miseno, do outro lado da Baía de Nápoles. O rápido soterramento de Pompeia e Herculano criou uma cápsula do tempo. As cidades foram preservadas quase intactas, proporcionando informações valiosas sobre a vida naquela civilização do século I. As vítimas da erupção também acabaram congeladas, com detalhes tenebrosos de seus momentos finais intactos para a posteridade. Agora, novas descobertas revelam que não foram apenas o fogo, as lavas e as cinzas que causaram a destruição.
Em estudo recente, vulcanologistas, geólogos e antropólogos uniram-se para analisar os efeitos colaterais do cataclismo, com especial atenção na atividade sísmica associada aos acontecimentos que cessaram a vida de milhares de pessoas naquela ocasião. A pesquisa, liderada por cientistas do Instituto Nacional de Geofísica e Vulcanologia (INGV) e do Parque Arqueológico de Pompeia, examina os efeitos do tremor de terra que acompanhou a erupção em Pompeia. O complicador: atividade vulcânica e terremotos, nesses casos, podem acontecer simultaneamente ou em rápida sucessão. Essas complexidades são como um quebra-cabeça em que todas as peças devem se encaixar para desvendar a imagem completa. “Provamos que a sismicidade durante a erupção desempenhou papel significativo na destruição de Pompeia e, possivelmente, influenciou as escolhas dos pompeianos que enfrentaram uma morte inevitável”, diz o vulcanologista Domenico Sparice, principal autor do estudo publicado na revista especializada Frontiers in Earth Science.
Durante escavações na Casa dos Pintores Trabalhando, uma mansão romana bem preservada nas ruínas de Pompeia, os pesquisadores encontraram dois esqueletos masculinos com idade em torno de 50 anos, que apresentavam fraturas graves e lesões traumáticas. O posicionamento dos restos sugere que o “indivíduo 1” foi esmagado pelo desabamento de uma parede, o que causou a morte imediata. O “indivíduo 2”, no entanto, pode ter tido consciência do perigo e tentou se proteger com um objeto de madeira. “As pessoas que não fugiram dos seus abrigos foram possivelmente esmagadas pelo colapso de edifícios já sobrecarregados, induzidos pelo terremoto”, afirma a antropóloga Valeria Amoretti, do Parque Arqueológico de Pompeia.
A erupção pegou os cidadãos de Pompeia no meio de seus afazeres cotidianos. Durante cerca de dezoito horas, pequenas partículas de rocha e cinzas caíram sobre a cidade, fazendo com que as pessoas procurassem abrigo. Quando a erupção parou, os habitantes que sobreviveram podem ter pensado que estavam seguros, até que fortes terremotos começaram. Há vários indícios de que os dois indivíduos encontrados não morreram por inalar cinzas ou pelo calor extremo. Os cientistas sugerem que ambos sobreviveram à primeira fase da erupção e depois foram esmagados pela queda das paredes, antes da chegada das ondas de gases e rocha.
A nova visão sobre a destruição de Pompeia traz valiosas informações sobre a experiência das pessoas que viveram há 2 000 anos. “As escolhas que fizeram, bem como a dinâmica dos acontecimentos, que continuam a ser o foco de nossa pesquisa, decidiram sobre a vida e a morte nas últimas horas de existência da cidade”, diz o arqueólogo Gabriel Zuchtriegel, diretor do Parque Arqueológico de Pompeia. Ainda hoje, dois milênios depois, não há estimativas seguras sobre quantas pessoas morreram de causas relacionadas ao vulcão ou devido aos terremotos. Com a ajuda da ciência, contudo, estamos cada vez mais próximos de conhecer melhor o destino de nossos antepassados.
Publicado em VEJA de 26 de julho de 2024, edição nº 2903