Em uma nota técnica divulgada nesta quarta-feira, 4, o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) informou que as propriedades privadas responderam por 33% dos focos de calor registrados no bioma amazônico até agora. Em segundo lugar, as áreas sem destinação fundiária específica somaram 30%. O IPAM usou dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, o INPE, entre janeiro a agosto de 2019.
Entre 2011 e 2018, na média, os focos de fogo em áreas privadas chegaram a quase 10.000. Em 2019, já passaram de 14.000.
Segundo o documento, “os resultados confirmam a principal conclusão expressa em nossa primeira nota técnica, publicada em agosto deste ano, de que grande proporção de focos de calor está atrelada ao desmatamento, e não a uma severidade da época seca deste ano. O indicador principal é a alta proporção de focos em propriedades privadas (PP) e assentamentos (ASR), possivelmente devido à conversão de florestas em outros usos, e em florestas públicas não destinadas (ND), como resultado da grilagem e da ação de criminosos interessados em especular com a terra.”
Na última semana de agosto, a reportagem de VEJA percorreu mais de 1.300 quilômetros entre os municípios de Alta Floresta e Colniza, na região noroeste do Mato Grosso, estado que registrou o maior número de focos de calor na Amazônia. Durante a apuração, moradores das cidades e que trabalham na área ambiental relataram, sob condição de anonimato, a tendência divulgada na nota técnica do IPAM. De acordo com fontes ouvidas por VEJA, proprietários de terra desmataram áreas de reserva legal, território obrigatório nos imóveis rurais para manter uma porcentagem do terreno com cobertura de vegetação nativa. Depois do desmate, o fogo é o instrumento utilizado para “limpar” o campo e abrir pastos.
De acordo com a nota técnica, “é urgente que se busque a implementação plena do Código Florestal, e que os órgãos responsáveis pela fiscalização sejam fortalecidos e valorizados nas suas ações frente ao desmatamento e queimadas ilegais. Quanto aos assentamentos de reforma agrária (ASR), tradicionalmente carentes de assistência técnica rural, é preciso reforçar boas práticas e separar os locais em que haja concentração dos focos, padrão que costuma indicar uso indevido do lote, inclusive por terceiros”.
Para o gerente de Certificação Agrícola do Imaflora, Luís Fernando Guedes Pinto, a disputa pela terra está na gênese do Brasil. “As terras públicas sempre foram entregues a pessoas próximas do poder. O Brasil até hoje nunca resolveu a sua situação fundiária de maneira clara e com justiça. Já demonstramos que há diversas sobreposições entre terras públicas e privadas, o que dá margem para as disputas que levam ao desmatamento e à violência no campo”, afirmou.