Em menos de um dia, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, viu cair por terra seus argumentos de que as três universidades federais – UFBA, UFF e UnB – elencadas para sofrerem cortes de 30% do orçamento eram promotoras de “balbúrdia” e tinham produção acadêmica aquém do esperado. Ele insistiu: via Twitter, o ministro disparou desta vez contra as instituições públicas de ensino superior como um todo, afirmando que “perguntar sobre tolerância ou pluralidade aos reitores (ditos) de esquerda faz tanto sentido quanto pedir sugestões sobre doces a diabéticos”. No entanto, ali bem pertinho da Esplanada, a Aliança Pela Liberdade desmente a tese do ministro da universalização esquerdista no meio estudantil: trata-se do grupo de universitários — raríssimo, admita-se — de formação liberal que dirige desde 2012 (com um hiato em 2017) o DCE da Universidade de Brasília. Definindo-se como “liberal na economia e louca nos costumes”, a coordenadora geral do Diretório, Clarice Menin, de 23 anos, explica que o escopo de ideologias na Aliança Pela Liberdade vai da social-democracia ao anarcocapitalismo. “O que nos une é a visão de que a iniciativa privada não é inimiga do setor público”, explica. Clarice falou a VEJA:
O DCE protocolou uma ação contra o corte de 30% da verba das universidades federais anunciado pelo MEC. Um movimento liberal não deveria defender a redução dos gastos públicos? A UnB depende do dinheiro público. Tirar 30% da verba de custeio de uma hora para outra vai sucatear a universidade, que investe pesado em pesquisa. É verdade que o Brasil gasta muito mais com o ensino superior do que com a educação básica e que isso gera uma inversão de renda. Mas acreditamos que a transição tem que ser gradual. A universidade tem como vender serviços e captar recurso com as próprias pernas, mas precisa ser incentivada a isso.
Quais as pautas que a Aliança defende? A criação de parcerias público-privadas nas universidades, por exemplo. Usamos este modelo para colocar toldos nas paradas de ônibus, trocar os bebedouros e instalar bicicletários. Mas nossa pauta principal é a autonomia das universidades para explorar seu próprio patrimônio . A UnB não pode arrendar ou utilizar seus vários terrenos em benefício próprio – qualquer renda extra é devolvida para o Estado. Isso inibe o empreendedorismo e a deixa à mercê da boa vontade do ministro da Educação. Também apoiamos a criação de fundos patrimoniais com base nesta renda extra e em doações de ex-alunos. Todas as universidades de excelência fazem isso. O fundo de Harvard tem 38 milhões de dólares. Mas, aqui, a esquerda vem e diz que estamos privatizando a universidade.
A UnB é mesmo uma balbúrdia? Como liderança de um movimento liberal, falo com segurança que existem excessos, sim. Mas não é cerceando ou proibindo que a gente chegará a algum lugar.
Fernando Haddad, do PT, acaba de fazer uma palestra na UnB na qual chamou Jair Bolsonaro de “traste”. Há espaço para palestrantes de outros matizes ideológicos? Antes de Haddad, tivemos a cientista política Glória Alvarez, candidata à presidência da Guatemala e uma das principais vozes liberais da América Latina. A universidade não é um mar de rosa em matéria de tolerância, mas agindo com firmeza, dá para fazer. Sofremos certa hostilidade do movimento estudantil, mas sempre buscamos o diálogo. O maniqueísmo não leva ninguém a lugar nenhum.
Você já foi hostilizada? Várias vezes. Presidi sozinha uma assembleia do DCE para discutir possível apoio ao Haddad na época da eleição. Era contra, porque a Aliança pela Liberdade foi eleita com um discurso apartidário. Uma menina da plateia perguntou aos gritos como eu conseguia dormir à noite. Respondi que dormia com medo, por não ser respeitada nem pelas que se dizem feministas, nem pelos conservadores. Sei que tenho que falar cada vez mais alto.
O ministro, então, está correto ao afirmar que as universidades são um antro da esquerda? Eu entendo a crítica dele. Meu calo aperta todos os dias nesse sentido. Mas não dá para impedir o debate, muito menos fazer com que milhares de alunos paguem pelos erros de poucos. Repito: se você acha que as ideias são ruins e que a forma de agir de grupos políticos está errada, junte pessoas que pensam como você e faça um bom trabalho. Foi assim que a Aliança pela Liberdade ganhou cinco das seis eleições a que concorreu.