O juiz Sergio Moro, titular da 13ª Vara Federal de Curitiba, condenou nesta terça-feira o ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB-RJ) a catorze anos e dois meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. É a primeira sentença proferida contra o peemedebista no âmbito da Operação Lava Jato — ele ainda é réu em outras nove ações na Justiça Federal do Rio de Janeiro. O governador é acusado de receber cerca de 2,7 milhões de reais de propina da empreiteira Andrade Gutierrez referente às obras do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), da Petrobras, entre 2007 e 2011.
“A culpabilidade é elevada. O condenado recebeu vantagem indevida no exercício do mandato de governador (…). A responsabilidade de um Governador de Estado é enorme e, por conseguinte, também a sua culpabilidade quando pratica crimes. Não pode haver ofensa mais grave do que a daquele que trai o mandato e a sagrada confiança que o povo nele deposita para obter ganho próprio”, escreveu Moro no despacho.
Além de Cabral, foram condenados o ex-secretário de Governo do Rio Wilson Carlos Cordeiro de Silva Carvalho — a dez anos e oito meses de reclusão — e o ex-sócio e apontado como “homem da mala” do ex-governador, Carlos Emanuel de Carvalho Miranda — a doze anos. Os dois também por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Por outro lado, Moro decidiu absolver a mulher do ex-governador, Adriana de Lourdes Ancelmo, dos mesmos crimes “por falta de prova suficiente de autoria ou participação”, conforme a decisão — o mesmo se deu com a esposa de Wilson Carlos, Mônica Carvalho. Os ex-dirigentes da Andrade Gutierrez Rogério Nora e Clóvis Peixoto também eram réus no processo, mas tiveram as ações suspensas porque fecharam acordo de delação premiada com a força-tarefa da Lava Jato.
De acordo com a denúncia do Ministério Público Federal (MPF) de Curitiba, os empreiteiros foram orientados pelo ex-diretor da Petrobras — e delator premiado — Paulo Roberto Costa a tratar de pagamentos ilícitos com o então governador e o seu grupo político para não terem problemas em contratações com a estatal. Na delação, os executivos da Andrade relataram que Cabral chegou a pedir propina dentro do Palácio da Guanabara, sede do governo no Rio, em uma reunião em 2008.
A ação em questão trata especificamente de um contrato de terraplanagem do Comperj, firmado em 28 de março de 2008 entre a Petrobras e um consórcio de empreiteiras que tinha como integrante a Andrade. A obra foi orçada inicialmente em 819,8 milhões de reais, recebeu 5 aditivos e acabou custando aos cofres da estatal 1,17 bilhões de reais, segundo a procuradoria de Curitiba. O valor da propina teria correspondido a 1% do contrato.
O dinheiro sujo — exatamente, 2.666.598,18 milhões de reais, segundo as investigações — teria sido “lavado” por meio da compra de roupas de grife, móveis de luxo e blindagem de veículos.
Em seu despacho, Moro afirmou que o esquema no Comperj está inserido num contexto de “cobrança de propina sobre toda obra realizada no Rio”, o que indica “ganância desmedida” por parte dos réus. Ele ainda apontou como elemento agravante a “situação falimentar” do Estado, “com sofrimento da população e dos servidores públicos”. “Embora resultante de uma série de fatores, [a crise] tem também sua origem na cobrança sistemática de propinas pelo ex-governador e seus associados, com impactos na eficiência da Administração Pública e nos custos dos orçamentos públicos”, escreveu o juiz.
Preso desde novembro de 2016, Moro decidiu manter Cabral encarcerado mesmo após a condenação sob a alegação de que, apesar da prisão preventiva ser exceção, é preciso “interromper o ciclo criminoso, prevenir a prática de novos crimes, sejam de corrupção ou de lavagem, e aumentar as chances de recuperação dos ativos criminosos”.
Procurada, a defesa do ex-governador ainda não se manifestou sobre a condenação.
Em suas alegações finais, os advogados de Cabral afirmaram que ele não recebeu propina da empreiteira, mas sobras de doações eleitorais não declaradas à Justiça — ou seja, por meio de caixa dois. A defesa também disse que os acordos de delação da empreiteira são “ilegais” e não valem como prova, que houve o cerceamento da defesa e que Moro é incompetente para julgar o caso.