Espalhar ‘fake news’ não é motivo para levar alguém à prisão, diz conselho
Entidade ligada ao Ministério do Direitos Humanos pede respeito à liberdade da expressão em vez de criminalizar usuário que compartilha conteúdo mentiroso
O Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) quer evitar a criminalização e o tratamento policial como punição ao compartilhamento de notícias falsas, as fake news. Segundo o órgão, que é vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos, levantamento do Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional mostrou que existem 14 projetos de leis, 13 na Câmara dos Deputados e um no Senado, que preveem penalidades que variam de multas a partir de R$ 1.500 a até 8 anos de reclusão para quem divulgar notícias falsas. Para o colegiado, a medida é ineficaz e “desproporcional”. As informações estão no Diário Oficial da União desta segunda-feira dentro de um conjunto de recomendações feitas pelo colegiado aos três poderes e às empresas que gerenciam redes sociais.
Ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o conselho recomenda “a adoção dos parâmetros de direitos humanos à liberdade de expressão e informação como orientadores para todas as medidas a serem elaboradas pelo Conselho Consultivo sobre Internet e Eleições, (composto por órgãos como a Polícia Federal e a Agência Brasileira de Inteligência – Abin), para que não sejam consideradas as vias da criminalização e do tratamento policial como formas de enfrentamento às questões relativas ao compartilhamento de notícias falsas”.
O mesmo apelo é feito ao Congresso Nacional. O conselho defende iniciativas legislativas que respeitem os padrões internacionais de direitos humanos, no lugar de matérias baseadas na lógica de criminalização dos usuários que compartilham essas notícias. Uma das recomendações é dirigida ao Senado Federal, para que a Casa aprove o PLC 53/2018, já votado na Câmara dos Deputados em maio de 2018, que, segundo destaca o CNDH, traz as bases para uma efetiva proteção no tratamento de dados pessoais no Brasil.
Ao Poder Executivo, tanto federal quanto nos Estados, as recomendações incluem políticas públicas de alfabetização midiática e informacional e de estímulo à promoção da cultura de paz e direitos humanos.
Das plataformas privadas de redes sociais, como Facebook, Twitter e Google, o conselho pede, entre outras ações, formas de garantir transparência sobre o seu funcionamento e as regras de suas comunidades. Também sugere às redes sociais que ampliem o controle dos usuários sobre os conteúdos que publicam e acessam, “incidindo sobre o chamado efeito bolha e a estrutura de monetização”, que favorecem as notícias falsas.
Justificativas
Para elaborar as recomendações, o Conselho Nacional de Direitos Humanos usou uma lista grande de considerações. Dentre elas, o colegiado avaliou que o combate a informações falsas, caluniosas e difamadoras já têm regulação adequada na tipificação dos crimes contra a honra, em recursos como o direito de resposta e em mecanismos de retirada de conteúdos como os previstos no Marco Civil da Internet, “e que criminalizar o compartilhamento de conteúdos pelo público geral configura medida desproporcional”.
O conselho também avaliou que condenar à prisão indivíduos por simplesmente redistribuir ou promover conteúdos falsos “não pode ser visto como uma medida eficaz”, pois na maior parte das vezes, o cidadão comum nem sequer tem informações ou instrumentos para verificar a veracidade de conteúdo que circula pela internet.
Para o colegiado, as leis que estabelecem prazos curtos para que as plataformas privadas removam conteúdos identificados pelas próprias empresas como fake news sem que haja a necessidade de uma decisão judicial, sob pena de pesadas sanções econômicas, representam um grande risco para a liberdade de expressão. Além disso, o conselho argumenta que não cabe às plataformas privadas, de maneira solitária, avaliar quais conteúdos tipificam fake news. O conselho ressalta também que qualquer tentativa de regular a questão das fake news deve passar pelo crivo judicial.