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Escola católica do Rio censura livro acusado de ser de esquerda

Direção do Colégio Santo Agostinho acatou queixas de pais de alunos que protestaram contra a adoção de obra de ficção que trata da ditadura

Por Fernando Molica
Atualizado em 2 out 2018, 18h53 - Publicado em 2 out 2018, 16h45
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  • Pressionada por pais de alunos, a direção do Colégio Santo Agostinho, um dos mais tradicionais do Rio, decidiu suspender a adoção do livro de ficção Meninos sem Pátria, de Luiz Puntel, que havia sido indicado para alunos do 6º ano do ensino fundamental. A obra, lançada em 1981 e que está na 23ª edição, foi acusada de defender posições de esquerda. O romance trata de um jornalista do interior de São Paulo que, perseguido pela ditadura militar implantada em 1964, teve que fugir do país.

    O caso foi parar na página Alerta Ipanema, no Facebook, que tem como ilustração principal uma foto de campanha dos deputados Jair e Flávio Bolsonaro, candidatos, respectivamente, à Presidência e ao Senado. De acordo com um texto postado ontem na página, o livro “é acusado de doutrinar crianças” com “ideologia comunista em sala de aula”. A postagem afirma que Meninos sem Pátria “critica governos militares enaltecendo a ótica de esquerda”. O tema dividiu comentários na página: houve quem sugerisse que os pais retirassem os filhos do colégio, outras pessoas apoiaram a adoção do livro.

    agostinhoi
    (Reprodução/Facebook)

    Na manhã desta terça, 2, a Equipe de Coordenação do Ensino Fundamental II enviou para os pais de alunos comunicado em que informa a suspensão da leitura do livro “para fins das atividades escolares” – o título do romance não é citado. A nota afirma que a decisão foi tomada pela direção do colégio após tomar conhecimento do livro e de analisá-lo com a equipe de coordenação. Meninos sem Pátria faz parte da lista de material escolar divulgada no início do ano.

    Autor de dez livros juvenis, Luiz Puntel, 69 anos, disse a VEJA ter ficado surpreso com a medida, afirmou que nunca teve  problema com a obra, lançada ainda durante o regime militar e adotada em diversas escolas há quase quarenta anos. Ele atribuiu a suspensão à radicalização política do país. O livro é inspirado no caso do jornalista José Maria Rabêlo, que, perseguido pela ditadura, fugiu do país com a mulher e sete filhos. Na história, o personagem – que recebeu o nome de José Maria – tem dois filhos e se exilou no Chile e na França. O romance termina com a volta da família para o Brasil, depois da anistia. Em razão de sua adoção em escolas, já foram vendidos cerca de 3 milhões de exemplares de livros de Puntel.

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    Segundo o autor, não há qualquer tentativa de doutrinação na obra, a trama trata principalmente do namoro de um dos filhos do jornalista com uma menina francesa. “Mas o livro fala da ditadura, houve uma ditadura, com Congresso Nacional fechado, com presos, com mortes. O Toffoli (Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal) prefere chamar de movimento, mas eu chamo de ditadura”, afirmou.

    Mães que protestaram contra a adoção do livro ressaltaram também trecho que, segundo elas, apresenta uma visão equivocada de Jesus Cristo. Trata-se do diálogo de um dos filhos do jornalista com um padre. Na conversa, o sacerdote afirma que o pai do garoto estava sendo perseguido por defender suas ideias e que Cristo também fora mal interpretado. Em seguida ele diz que o crime de Jesus “foi estar sempre ao lado dos pobres e resumir toda a sua filosofia em uma única frase: ‘Amai-vos uns anos outros’”.

    Procurado por VEJA, o Colégio Santo Agostinho informou que não iria se manifestar. “O Colégio não faz nenhum tipo de comentário sobre suas decisões”, disse uma secretária da direção da escola, que fica no Leblon, Zona Sul do Rio. O Santo Agostinho é ligado à Ordem Agostiniana.

    Na tarde desta terça, a página Alerta Ipanema anunciou a decisão da escola de suspender a adoção do livro, o que provocou nova discussão. “Excelente notícia!!!”, escreveu Maria Lucia Ferreira, que sobrepôs à sua foto de perfil imagem de propaganda de Jair Bolsonaro. “Onde se queimam livros, acabam se queimando pessoas”, retrucou Rafaella Marcolini.

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