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Deprimida, garota busca ajuda na web e cai no jogo Baleia Azul

Por achar que mãe não entenderia o problema, Luana, 15 anos, fez amigos em grupos virtuais e recebeu convite para página que prega automutilação e suicídio

Por Fernanda Bassette
Atualizado em 20 abr 2017, 12h30 - Publicado em 19 abr 2017, 10h15
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  • Com sintomas clássicos de depressão, entre eles tristeza sem motivo aparente, a adolescente Luana (nome fictício), de 15 anos, moradora da cidade de Vila Rica, a 1.200 km de Cuiabá (MT), procurou nas redes sociais ajuda para enfrentar o problema. Foi navegando em sites e grupos da internet que a garota descobriu o ‘jogo’ da Baleia Azul (ou Blue Whale). A palavra ‘jogo’, porém, não se encaixa ao que o evento representa na realidade, o Baleia Azul é um incentivo ao suicídio. A página leva adolescentes vulneráveis a realizarem tarefas diárias, incluindo a automutilação, ao longo de um período de 50 dias. A última etapa seria a morte.

    Luana é aluna do primeiro ano do ensino médio na Escola Estadual Maria Esther Peres, a mesma onde estudava a adolescente Maria de Fátima Oliveira, de 16 anos, que foi encontrada morta na terça-feira (11) em uma represa, supostamente após cumprir a última tarefa do Baleia Azul. Maria de Fátima tinha cortes na coxa e braços e deixou cartas que indicam sua participação no Baleia Azul. O caso está sob investigação.

    Em conversa com VEJA, Luana contou como entrou no universo do Balia Azul. Diz que, há pelo menos dois meses, tem se sentido triste, sem vontade de fazer nenhuma atividade ou ficar perto das pessoas. Até mesmo a escola, que ela adorava frequentar, passou a ser um lugar indesejado. “Comecei a faltar, deixei de fazer trabalhos importantes. Queria me isolar do mundo, estava sem ânimo mesmo”, diz a adolescente.

    Desmotivada, Luana foi buscar ajuda na internet em grupos sobre depressão, sobre suicídio, sobre pessoas que não queriam mais viver e passou a acompanhar ao menos 25 deles. Por meio desses grupos, ela fez amigos virtuais, que a convidaram para participar de outros grupos, desta vez no celular.  Foi pelo telefone que ela conheceu o jogo da Baleia Azul. “Eu nunca tinha ouvido falar. Mas começaram a falar sobre isso e enviaram links-convites. No começo, não dei muita atenção”, conta.

    Após alguns dias, Luana decidiu entrar no link enviado. Era para participar do grupo Blue Whale. Lá, ela conta que as pessoas falam sobre tristeza, depressão, suicídio. Mandam imagens, vídeos. E, muitas vezes, diz Luana, as conversas somem e o grupo muda de nome, voltando a falar sobre “assuntos normais”. “Às vezes, eles apagam o grupo e mandam convite para um novo. Outras vezes, eles removem todos por segurança e mandam links novos”, afirma a adolescente.

    Por curiosidade e por estar deprimida, Luana conta que passou a interagir com as pessoas, perguntando quem era o “curador” (pessoa que coordena o grupo, envia tarefas e monitora o cumprimento delas). Uma mulher se apresentou como curadora e a chamou para uma conversa privada. A adolescente conta que a curadora fez perguntas sobre ela e pediu que cortasse a perna – fazendo um desenho de uma estrela – e enviasse a foto. Só depois disso, ela seria aceita no grupo real.

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    Há cerca de uma semana, Luana seguiu a ordem e se cortou com um pedaço de lâmina de barbear. Enviou a foto para a curadora e foi aceita no grupo. “Não sei dizer por que eu fiz isso. A partir daí, passaram as instruções, mas eu ainda não fiz nenhuma delas”, diz. A estudante não sabe informar, no entanto, quantas pessoas faziam parte do grupo em que ela entrou e se havia mais pessoas da cidade. “Nunca contei, mas são muitas pessoas, e tem gente do Brasil inteiro.”

    Quando questionada sobre o motivo de ir buscar ajuda para se livrar da depressão na internet em vez de falar com a mãe, Luana diz que provavelmente sua mãe não entenderia. “Ela teria dito que é frescura minha, algo do tipo.”

    De fato, o suicídio na adolescência é algo que vem aumentando no mundo todo e, segundo o psiquiatra Daniel Martins de Barros, coordenador médico do Núcleo de Psiquiatria Forense e Psicologia Jurídica do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (USP), em 90% dos casos, a pessoa tinha algum tipo de transtorno mental, principalmente depressão. E, muitas vezes, os pais não conseguiram entrar no mundo do filho e identificar os sinais.

    Celular entregue à polícia

    Sueli (nome fictício), mãe de Luana, diz que já havia percebido mudanças no comportamento da filha, mas nunca tinha ouvido falar do Baleia Azul. Diz que notou que a adolescente passava a maior parte do tempo trancada no quarto e que não desgrudava do celular. “Quando a gente pedia para ver o celular, ela ficava super nervosa, agressiva e irritada” , diz. Sueli conta ainda que a menina passou a usar roupas de manga comprida e calça – na cidade, faz muito calor.

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    Ela teria dito que é frescura minha, algo do tipo.

    Luana (nome fictício), 15 anos, sobre por que, deprimida, não pediu ajuda a mãe

    A mãe passou a observar mais de perto a filha, mas diz que ela nunca se abria. Sueli só se deu conta de que a adolescente poderia estar participando do Baleia Azul quando soube da morte de Maria de Fátima. “Fiquei em choque e comecei a ligar uma coisa à outra. Fiquei desesperada ao pensar que minha filha poderia fazer parte dessa coisa.”

    Sueli chamou Luana para conversar no final de semana e resolveu pressioná-la a dizer o que estava acontecendo. A menina começou a chorar desesperadamente e pediu para a mãe para que mudassem de cidade.  “Minha ficha caiu e eu entrei em pânico. Imediatamente, tirei o celular dela e escondi. Ela ficou nervosa, ficava pedindo o celular, mas eu não devolvi”, diz.

    Maria de Fátima
    Maria de Fátima, 16 anos, que estudava na mesma escola de Luana e sua última publicação no Instagram: despedida (Reprodução/Reprodução)
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    Fiquei em choque e comecei a ligar uma coisa à outra. Fiquei desesperada ao pensar que minha filha poderia fazer parte do jogo

    Sueli (nome fictício), mãe de Luana, ao saber da morte de Maria de Fátima

    Na segunda-feira de manhã, com apoio de professores da escola, Sueli decidiu entregar o celular da filha para a Polícia Militar, durante a realização da primeira palestra educativa para pais e alunos sobre o assunto no colégio.  Os policiais orientaram a mãe a registrar um boletim de ocorrência. Sueli seguiu a sugestão e deixou o aparelho aos cuidados da Polícia Civil para auxiliar nas investigações.

    Mais aliviada por ter se livrado do celular, Sueli diz ter medo de ser perseguida. “O caso da Maria de Fátima me despertou a tomar uma atitude. Quero que outros pais façam o mesmo. Prestem atenção nos seus filhos, pois essa história é verdadeira”, disse. Para ajudar a filha, Sueli marcou uma consulta com uma psicóloga.  “Espero que isso tudo acabe logo”, afirmou.

    O delegado André Rigonato confirmou o recebimento do aparelho, mas diz que não pode dar detalhes do caso para não atrapalhar as investigações. Joel Outo Matos, tenente coronel da Polícia Militar, diz que a PM fará palestras em escolas de 11 municípios da região. “Vamos trabalhar para ajudar os pais. Nossa orientação é que os pais monitorem a internet dos filhos ou até suspendam o acesso”, afirmou.

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