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COP30: uma epopeia logística na região da selva

O evento está marcado para novembro de 2025 e deve durar doze dias. São esperadas 50 000 pessoas, incluindo uma centena de chefes de Estado

Por Victoria Bechara, de Belém
Atualizado em 3 jun 2024, 17h07 - Publicado em 29 mar 2024, 06h00
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  • O filme Fitzcarraldo, de 1982, a respeito do esforço que beira a insanidade de um homem empenhado em construir uma casa de ópera no meio da selva, entrou para a história pelo pesadelo experimentado durante as filmagens. O roteiro nos bastidores incluiu ataques de mosquitos, deslizamentos de terras e até um boato de que indígenas teriam ameaçado de morte o ator principal, Klaus Kinski. Guardadas as devidas proporções, a organização da COP30, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, em Belém, tem tudo para configurar outra verdadeira epopeia na floresta. O evento está marcado para novembro de 2025 e deve durar doze dias. São esperadas 50 000 pessoas, incluindo uma centena de chefes de Estado.

    O ponto de partida ocorreu no Egito, quando Lula esteve na COP27 e anunciou que pediria à ONU para a Amazônia sediar o evento em 2025. “Tem dois estados aptos a receber qualquer conferência internacional, que são o Amazonas e o Pará”, declarou. Nos bastidores, a primeira-dama, Janja, insistia em que a capital paraense seria a melhor opção. O martelo foi batido em dezembro de 2023. A partir daí, começou uma intensa movimentação para cuidar da logística do evento.

    A mais de um ano da COP, o Pará tem um número considerável de desafios pela frente. O primeiro deles é a estrutura. O governo estadual trabalha na construção do Parque da Cidade, onde será realizada a conferência, no terreno que antes abrigava o antigo aeroporto de Belém. A entrega da primeira fase do projeto, de mais de 500 000 metros quadrados, está prevista para julho de 2025 e inclui um centro de economia criativa, um centro gastronômico, um anfiteatro e cinco pavilhões. Por enquanto, a maior parte ainda está no papel. Apesar das máquinas circulando e de algumas poucas estruturas de pé, o terreno está praticamente vazio, repleto de amontoados de terra e placas de obras.

    Há ainda outros gargalos logísticos para a realização do evento, como o número de vagas de hotéis. Atualmente, Belém tem 18 000 leitos de hospedagem. Para atender à demanda da COP, serão construídos dois hotéis de luxo em prédios cedidos pelo estado. As soluções ainda passam pela reforma de escolas estaduais e acordos com a plataforma Airbnb para aumentar o número de imóveis disponíveis para aluguel.

    Questões básicas, como esgoto e lixo, também estão entre os principais problemas da capital. As montanhas de latas, embalagens e sacolas plásticas nas calçadas chamam a atenção de quem passa perto do aero­por­to da cidade e em bairros da periferia. Além disso, Belém está entre as dez cidades com os piores índices de saneamento básico em todo o país — 91% da população não têm coleta de esgoto. Outra encrenca é a mobilidade. O governo estadual comprou 300 ônibus novos e planeja incentivar o trabalho remoto em alguns setores para reduzir o trânsito durante os dias da COP, além de determinar férias escolares.

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    Esses obstáculos geraram especulações em Brasília sobre a capacidade de Belém de sediar a COP. Uma ala do governo federal defende que algumas reuniões sejam transferidas para outras cidades brasileiras, como São Paulo e Rio de Janeiro. “Uma cidade que recebe milhões de turistas durante um fim de semana do Círio de Nazaré está preparada para esse evento”, contesta Bruno Chagas, secretário-adjunto de Cultura do Pará e membro do comitê estadual da COP. Para o governador Helder Barbalho, os preparativos não envolvem um esforço de maquiagem da realidade. “Não deve ser ambição do Brasil esconder problemas da Amazônia ou de qualquer centro urbano do nosso país”, afirma. Em tese, ele terá um lucro político imenso com os holofotes do evento, algo precioso para quem tem grandes pretensões para 2026 — Helder quer disputar o Senado ou tentar a vaga de vice na chapa de Lula. Mas tudo isso depende de uma vitória sobre os enormes desafios pela frente na epopeia logística necessária para a realização da COP no próximo ano.

    Publicado em VEJA de 29 de março de 2024, edição nº 2886

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