O Aeroporto Internacional Salgado Filho, em Porto Alegre, não conta mais com a expertise de dez funcionários ilustres que trabalhavam no reforço da segurança dos passageiros. É que no último dia 15, o contrato do aeroporto com a Hayabusa Falcoaria — que adestrava as aves,—foi encerrado.
Em nota, a empresa afirmou que “o contrato teve duração excepcional de seis anos e não tinha mais como ser renovado”. Por enquanto, os dez animais que ajudavam a espantar os pequenos pássaros que atrapalhavam a decolagem das aeronaves, perderam o posto de vigilantes aéreos. De acordo com a Infraero, a elaboração de um novo processo licitatório está em andamento e o edital passa por análise jurídica da empresa.
Embora pequenos, esses animais podem causar grandes acidentes. Segundo dados da Força Aérea Brasileira (FAB) e da Estação Permissionária de Telecomunicações Aeronáuticas (EPTA), entre janeiro de 2015 e abril de 2017, Londrina, no Paraná, registrou 65 colisões com pássaros.
Segundo a Hayabusa, a empresa não é paga pelos serviços há quase sete meses, o que teria causado rombos em seu orçamento. “Estamos quase falidos devido à ausência de pagamentos e, se caso houvesse uma nova licitação, não poderíamos participar devido nossas dívidas em impostos”, declarou um funcionário.
Procurado, o Aeroporto Internacional Salgado Filho confirmou o encerramento do contrato, mas não se manifestou sobre a possível dívida com a contratada. O espaço segue aberto para posicionamento de ambas as partes.
Sobre a Eficácia
Segundo o Tenente Coronel Aviador Rubens Batta de Oliveira, assessor de gerenciamento de riscos de fauna do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), a utilização de aves como falcões e gaviões em aeroportos, teve seu auge nos anos 90, nos Estados Unidos.
A estimativa de acidentes aéreos fatais envolvendo fauna, segundo o tenente, é de 473 casos em todo o mundo, mas esses números podem estar subnotificados devido às dificuldades em identificar as causas das colisões, em especial antes da existência de testes de DNA.
O coronel Rubens Batta destaca ainda o alto custo da falcoaria e o esforço em que as aves são submetidas para serem aptas à atividade.
“Não é muito eficaz, o custo benefício da falcoaria não é dos melhores, em alguns casos pode ser eficiente, mas de maneira geral, é uma medida acessória. Os falcões precisam ter um peso ideal para voar, então você pega um animal e o mantém em seu limite, na faixa do peso, se não estiverem com fome, não caçam, se estiverem muito gordos não voam. Também não voam com chuva ou ventos muito fortes”, analisa.
Em 1962, o Brasil teve duas vítimas fatais devido a colisão entre um urubu cabeça-preta e uma aeronave. Essa espécie é atraída pelo lixo, problema contínuo de grandes centros urbanos. Dois anos antes, em uma situação parecida, uma ave de pequeno porte, muito densa, causou um acidente aéreo que vitimou 62 pessoas em Boston, Massachusetts.
Casos como esses, embora subnotificados, são mais comuns do que aparentam. Em 4 de março de 2008, uma aeronave de modelo Cessna Citation caiu em uma área arborizada de Wiley Post, Oklahoma, nos Estados Unidos, causando cinco mortes. Uma testemunha afirmou ter visto um bando de pássaros sobrevoando o local próximo ao horário do acidente.
Para o Coronel Batta, garantir a segurança de locais com atividades aéreas intensas, como aeroportos, é um processo moroso, que envolve várias etapas.
“Se tem uma ave que come larvas em uma região de alagamento, é preciso, antes de tudo, cuidar do solo, para dispersar esse animal, que pode trazer grandes riscos”. A exclusão física, garante a retirada de atrativos como água, comida e abrigo, além de gerar uma estranheza no ambiente, o que os mantém longe das áreas de risco.
Alinhando esses métodos — não tão caros como a falcoaria — aos ambientes propícios à proliferação desses animais, é possível atingir um nível satisfatório na segurança e prevenção de colisões aéreas com fauna, segundo Batta.