Até 2030, mais de 100 milhões de trabalhadores – ou uma em cada 16 pessoas no mercado de trabalho – vão ter que encontrar outra ocupação profissional no cenário pós-pandemia. Antes da Covid-19, a estimativa era que apenas 6% da classe trabalhadora precisaria se movimentar para aumentar a renda. Os números fazem parte do relatório “O Futuro do Trabalho após a Covid-19”, produzido pela consultoria McKinsey e divulgado em fevereiro deste ano, que analisou aspectos do cenário econômico previsto para quando a crise sanitária chegar ao fim (ou ao cenário mais próximo disso). Os números são alarmantes, mas há uma estratégia que, se bem colocada em prática, pode gerar, somente no Brasil, mais de 2 milhões de novos empregos e contribuir com um PIB adicional de 2,8 trilhões de reais até 2030, de acordo com um estudo do instituto de pesquisaWRI Brasil. Trata-se da transição para uma economia de baixo carbono, com potencial de deixar o país mais resiliente às mudanças do clima e contribuirá para reduzir as emissões de gases de efeito estufa e frear o aquecimento global.
A economia de baixo carbono está diretamente ligada à geração dos chamadas empregos verdes, muitas vezes funções já existentes mas ganham nova dimensão quando associadas a projetos que respeitem os princípios de preservação ambiental. No caso de infraestrutura, por exemplo, tratam-se de alternativas sustentáveis, que usem fontes de energia renováveis e não degradem o meio ambiente. Tome-se o caso de um parque eólico: o emprego verde inclui as funções de quem instala equipamentos, dos motoristas de caminhões e de funcionários da empresa de energia. No agronegócio, responsável por 26,6% do PIB do Brasil, a cadeia se tornará verde com o fim do desmatamento ilegal e de violações de direitos humanos, como trabalho análogo à escravidão, além de melhores práticas de produção para conciliar o cultivo com a preservação de áreas florestais. Em regiões remotas, como no interior da Amazônia, atividades econômicas podem ser criadas e haverá estímulo para um novo ecossistema de negócios.
No estudo “Uma Nova Economia para Uma Nova Era”, publicado em agosto de 2020 e feito pela WRI Brasil, entidade com presença em mais de 50 países, as vantagens de uma transformação sustentável foram demonstradas com números. Além da geração de empregos e do reflexo no PIB, a modelagem econômica utilizada demonstrou o ganho de 19 bilhões de reais em produtividade agrícola e 742 milhões de reais em receitas fiscais adicionais até 2030. Ao mesmo tempo, as ações preveem a restauração de 12 milhões de hectares de pastagens degradadas e a redução de 42% nas emissões de gases de efeito estufa em 2025, em comparação aos níveis de 2005.
De acordo com a diretora de Clima da WRI Brasil, Carolina Genin, os resultados mostraram que mesmo o cenário menos ambicioso para o Brasil é melhor do que continuar do mesmo jeito, o chamado business-as-usual. Em um cenário de pandemia, a transição é ainda mais delicada. “Além de buscar melhorias para o clima, precisamos pensar em uma transição justa para as pessoas, o que significa ter empregos dignos”, afirmou Carolina. “Ao longo do último ano, parte dos jovens parou de estudar. Eles precisam ser capacitados para a retomada, seja verde ou não, ou teremos uma massa de pessoas que não estarão na indústria antiga, nem na nova”, complementou.
A economia verde está muito mais próxima da realidade do que se imagina. De acordo com uma pesquisa realizada pelo economista Paulo Eduardo Braga Pereira Filho, bolsista da Cátedra Escolhas de Economia e Meio Ambiente, do Instituto Escolhas, o Brasil já tem mais de 6,5 milhões de empregos verdes, que estão atrelados a setores de água, esgoto e gestão de resíduos e transporte aquaviário. Para o advogado e diretor executivo do Instituto Escolhas, Sérgio Leitão, emprego verde é o nome dos empregos no século 21. “Em breve, serão comprados somente os produtos atestados do ponto de vista ambiental e de direitos humanos. O emprego verde será a condição para continuar a exportar e a realizar negócios internacionais”, disse Leitão.
No ano passado, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) publicou um estudo sobre empregos em um futuro sem emissões de gases de efeito estufa na América Latina e no Caribe. De acordo com a análise, a transição para uma economia carbono zero vai fazer com que 7,5 milhões de empregos desapareçam dos setores relacionados a combustíveis fósseis e produção de alimentos de proteína animal. Por outro lado, estas funções serão compensadas por novas oportunidades que podem chegar a 22,5 milhões de empregos em setores como agricultura, energia renovável, construção, reflorestamento e indústrias. Este é o grande plano de retomada da economia dos Estados Unidos apresentado pelo presidente norte-americano, Joe Biden, que assumiu o cargo em janeiro deste ano. O plano apresentado à população promete enfrentar a crise climática e criar milhões de novos empregos, com investimento em infraestrutura, na mudança da matriz energética e na transformação da indústria. Enquanto outros países saem à frente, ainda há tempo para o Brasil investir nos empregos do futuro.