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Com passado poluidor, Noruega é hoje líder contra a mudança climática

Reino escandinavo descarbonizou sua economia e é hoje laboratório de políticas verdes

Por Ernesto Neves Atualizado em 9 fev 2023, 07h20 - Publicado em 9 fev 2023, 06h10

Maior exportadora de petróleo e derivados da Europa ocidental, a Noruega fez da exploração dos combustíveis fósseis a base de sua economia. Ao longo das últimas décadas, o reino escandinavo financiou seu crescimento econômico e o generoso estado de bem-estar com a venda do produto, principal componente do efeito estufa que vem desestabilizando o clima global.

Nos anos 1990, a Noruega chegou a figurar entre os países que mais emitiam CO2 por habitante do planeta. Essa realidade, porém, nos últimos 20 anos. No período, foram colocadas em vigor as primeira políticas de corte de emissões.

A prática passou a se espalhar por toda a economia. Atentas à pressão popular, as autoridades norueguesas iniciaram o financiamento e a implantação de tecnologias verdes, tornando o país um líder no assunto.

Como resultado, a Noruega tem hoje um dos maiores mercados de carros elétricos do mundo, está pontilhada de construções sustentáveis e se compromete a ter zero emissões de CO2 até o final desta década.

A mudança começou pela Statoil, gigantesca estatal de petróleo. Rebatizada como Equinor, a companhia sofreu completa remodelação, sendo hoje líder na pesquisa e implantação de tecnologias verdes.

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A empresa também passou a se comprometer com compromissos internacionais, incluindo o Acordo de Paris, que promete manter o aquecimento do globo a 1.5 grau em comparação ao período pré-industrial. Esse nível é considerado seguro pela comunidade científica internacional.

A revolução ecológica pode ser particularmente notada na capital, Oslo. A cidade se comprometeu a reduzir 95% das emissões até o final da década na comparação com 2009, no que hoje é reconhecido como metas mais arrojadas do planeta.

Oslo é hoje um grande laboratório de políticas verdes a céu aberto, e oferece uma visão de como vai funcionar a economia de boa parte do mundo no futuro. As mudanças já estão a pleno vapor e mudaram a rotina da cidade.

Isso porque ao invés de apostar em soluções milagrosas, Oslo vem implementando políticas gradativas, mas que se estendem a cada detalhe da vida cotidiana.  Do recolhimento do lixo até o planejamento de novas construções, passando ainda pela merenda escolar, todas as atividades diárias estão se adequando às metas de redução de emissões.

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“Anualmente, o município apresenta um orçamento para a transição verde. Todas as entidades envolvidas nessa empreitada tem um papel claro, sabendo exatamente o que precisa ser feito. Além disso, três vezes por ano essas entidades precisam apresentar relatórios com os resultados à agência reguladora. Se algo não estiver saindo como o desejado, sentamos todos para dialogar”, afirma Heidi Sorenson, diretora da Agência Climática de Oslo.

Além do orçamento generoso e do regime de metas, outra chave para o sucesso de Oslo está na medição exata do quanto cada setor da economia contribui para as emissões de carbono.

A Agência Ambiental Norueguesa realizou um verdadeiro inventário do carbono, descobrindo que 80% das emissões tem sua origem de três setores: incineração de lixo e fornecimento de energia (23%), automóveis particulares (33%) e outros veículos de combustão, o que inclui máquinas da construção civil (20%).

Essa radiografia permitiu que a prefeitura direcionasse corretamente suas políticas públicas, evitando desperdícios. Possibilitou ainda o enfrentamento a hábitos nocivos. A cultura do carro particular, por exemplo, entrou na mira das autoridades.

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Veículos movidos a gasolina, por exemplo, já pagam mais para transitar dentro do perímetro urbano. Foi o primeiro passo rumo a um cerco que promete apertar ainda mais em 2023. O mais novo orçamento climático vai criar uma “zona livre de emissões” com entrada e estacionamento permitida apenas para carros de emissão zero.

Como resultado, 33% dos veículos que rodam hoje em Oslo já são elétricos, o que deu à metrópole o título de capital mundial do carro limpo.

Uma ideia que, por sinal, já se espalhou por todo o país. Em 2022, 80% dos mais de 170.000 carros vendidos na Noruega eram totalmente elétricos. Um mercado impulsionado por generosos cortes de impostos, responsáveis por baratear modelos de uma geração da Tesla e de outras montadoras.

O avanço confirma a ousada meta estabelecida pela nação escandinava de encerrar a venda de veículos movidos a diesel e gasolina até 2025. Para efeito de comparação, o Reino Unido fez a mesma promessa, mas tem como alvo o longínquo ano de 2040.

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Até os cemitérios passaram a integrar o conjunto de políticas verdes da cidade. Com 20 dessas áreas existentes em seu perímetro, Oslo passou a permitir que a vegetação natural voltasse a crescer no entorno das sepulturas. O processo é chamado de rewilding, e busca aproximar a natureza local às grandes cidades. Como resultado, animais selvagens, incluindo raposas, veados e alces, votaram a ser vistos com frequência.

Sistema de armazenamento de carbono: da atmosfera para o fundo do mar
Sistema de armazenamento de carbono: da atmosfera para o fundo do mar (Divulgação/Divulgação)

Além da adaptação de sua economia, a Noruega também vem empreendendo uma ousada política de captura de carbono da atmosfera. Batizada de Northern Lights (aurora boreal, em inglês) essa verdadeira operação limpeza do ar é orçada em mais de 2,5 bilhões de euros, quase 14 bilhões de reais. Cerca de 80% do projeto é bancado pelo governo e o restante recebe verbas de grandes petroleiras, incluindo a estatal Equinor, a Shell e a Total.

Inicialmente, o projeto contará com dois mega terminais. Eles serão instalados ao lado de uma fábrica de cimento e de uma usina de geração de energia. Esses empreendimentos de última geração vão capturar as emissões de poluentes antes que eles escapem para a atmosfera.

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Uma vez retido, o CO2 será transformado em líquido e transportado por dutos para o litoral. Alcançada a costa, a canalização submerge 2.600 metros, alcançando as profundezas do Oceano Atlântico. O material, então, é injetado por um sistema de alta pressão no solo do mar,  ficando retido ali.

Segundo as empresas envolvidas, até 2026 mais de 5 milhões de toneladas de carbono serão capturadas e armazenadas na rocha submarina por ano. Isso equivale, por exemplo, ao emitido por todos os automóveis de São Paulo anualmente.

“Ainda que hoje pareçam excessivamente caras ou equivocadas, políticas de captura e armazenamento de carbono serão fundamentais se quisermos conter o aquecimento global a 1.5 grau celsius”, diz o pesquisador norueguês Nils Rokke, do European Energy Research Alliance, entidade sem fins lucrativos que reúne universidades e centros de pesquisa do continente europeu.

“Isso acontece porque não há como evitar emissões de gases por completo. É o que acontece com a agricultura, por exemplo. E isso terá de ser compensado. Além do mais, os níveis de CO2 na atmosfera já são considerado recordes e estão provocando problemas seríssimos, como a acidificação dos oceanos”, avisa.

Usina de captura e armazenamento de carbono em construção na cidade de Brevik
Usina de captura e armazenamento de carbono em construção na cidade de Brevik, no sul do país: só ali, 400.000 toneladas serão capturadas por ano (Divulgação/Divulgação)
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