O brasileiro por trás do novo jogo da franquia ‘God of War’
A direção de arte é assinada por Rafael Grassetti, que conquistou posição de destaque no mundo dos games
Os últimos meses do ano costumam concentrar os principais lançamentos do mercado global de games. Atentos ao frenesi de compras do período de festas, os estúdios põem nas lojas títulos que passaram anos no forno. Em 2022, poucos jogos são tão aguardados quanto God of War: Ragnarök, saga criada pela Sony e exclusiva para os consoles PlayStation. A série protagonizada por Kratos, um anti-herói que sai em busca de vingança contra os deuses que mataram a sua família, se tornou uma das franquias mais populares da atualidade e um fenômeno internacional de vendas. A empolgação é tanta que até o CEO da divisão de jogos da Microsoft, responsável pelo Xbox, o principal concorrente da empresa japonesa, afirmou que está ansioso para testar a brincadeira eletrônica. Mais interessante ainda é o fato de boa parte do sucesso de God of War ser fruto do trabalho do brasileiro Rafael Grassetti.
O paulistano é diretor de arte do Santa Monica Studio, encarregado da produção da franquia God of War desde 2005. A partir de conceitos criados pelo diretor-geral do game, Eric Williams, Grassetti tem a responsabilidade de transformar tudo em imagens e movimentos — do visual do personagem, que ganhou barba quando a história deixou de olhar apenas para a mitologia grega e passou a incorporar elementos nórdicos, à ambientação das cenas. “É um desenvolvimento longo, com muitas variáveis, porque tudo tem razão para estar lá”, explicou Grassetti a VEJA. “O personagem é querido e procuro encontrar equilíbrio para deixar todos felizes, dos desenvolvedores aos gamers.”
Grassetti tem longa trajetória na indústria de games. Começou cedo, aos 17 anos, atuando inicialmente na publicidade com a criação de personagens para propaganda. Nessa toada, seu trabalho chamou atenção dos grandes estúdios e ele passou a realizar projetos internacionais, mas ainda sem sair do Brasil. Foi em 2011, já formado em publicidade, que recebeu uma proposta para viajar ao Canadá e dar expediente na BioWare, desenvolvedora de games bem-sucedidos, como o épico de ficção científica Mass Effect e a fantasia Dragon Age. Um tempo depois, foi convidado a integrar o time da Sony e mudou-se para a Califórnia, onde mora atualmente.
No Santa Monica Studio, o brasileiro faz a ponte entre diversos departamentos, do chamado “design de combate” às discussões com roteiristas para estipular os rumos da história. Trata-se de trabalho essencialmente criativo, que dura anos e costuma ser limitado apenas pela tecnologia. O novo God of War é o primeiro da série a sair para o novo console da Sony, o PlayStation 5. “Vamos ficando sempre mais ambiciosos, buscando aspectos novos para acrescentar”, afirma. “No fim é um jogo e tudo, claro, tem de funcionar.” O novo game acompanha as aventuras e desventuras de Kratos ao lado do filho adolescente, Atreus, em uma tentativa de impedir o Ragnarök, o fim do mundo da mitologia nórdica. A história se passa cinco anos após os eventos de God of War, de 2018, eleito o jogo do ano por revistas especializadas. Ou seja: o novo capítulo chegará ao mercado no início de novembro com a difícil missão de superar o antecessor.
Manter satisfeito o público que acompanha Kratos há anos não é a única responsabilidade de Grassetti. Seu trabalho serve de inspiração para designers e desenvolvedores brasileiros que sonham um dia pisar nos estúdios internacionais. As principais produtoras estão na América do Norte e em alguns países da Europa, como Polônia, e da Ásia, e é difícil encontrar brasileiros nessas empresas. “Sei do papel que tenho e tento contribuir para que as próximas gerações façam parte desse mundo”, diz Grassetti. Poucos segmentos são tão poderosos. O setor movimentou 180 bilhões de dólares em 2021, número que supera os faturamentos somados das indústrias do cinema e da música — os sucessos dos estúdios de Hollywood, portanto, não são nada perto de jogos como God of War, cuja assinatura tem o toque de Grassetti, o brasileiro no topo da criação.
Publicado em VEJA de 19 de outubro de 2022, edição nº 2811