Jogo de cartas eletrônicas on-line de Pokémon comprova o poder da franquia
Ela se mantém popular e rentável há quase trinta anos, atraindo novos e antigos fãs

Foi um sucesso instantâneo. Assim como aconteceu com Pokémon Go, jogo eletrônico lançado em 2016, a chegada de Pokémon Trading Card Game Pocket, versão digital para smartphones da popular brincadeira de cartas colecionáveis dos bichinhos japoneses, provocou uma corrida às lojas de aplicativos. Em menos de um mês, o jogo já superou 30 milhões de downloads. Graças ao formato free to play, ou seja, gratuito para jogar, mas com a possibilidade de usar dinheiro de verdade para comprar elementos exclusivos, arrecadou mais de 12 milhões de dólares apenas na primeira semana, segundo levantamento da plataforma de análise de dados AppMagic. O interesse dos jogadores — e sua vontade de gastar tanto dinheiro em tão pouco tempo — é uma prova incontestável do apelo longevo da marca Pokémon e de como seus criadores têm conseguido se reinventar para manter antigos e novos fãs engajados.

Parte do sucesso, no caso do game de cartas, é explicado pela maneira como ele explora a memória afetiva dos jogadores. No final dos anos 1990, no auge de Pokémon, quando Pikachu e os outros monstros reinavam no Game Boy e na televisão, um jogo de cartas de verdade se tornou febre. Os fãs compravam os pacotinhos e duelavam com os amigos. O novo Trading Card Game Pocket, ou TCGP, consegue replicar o fenômeno no ambiente digital. Após a instalação do aplicativo, o jogador recebe um punhado de cartas. Aos poucos, pode abrir pacotes com novos cards, os chamados boosters, e monta seu baralho, ou deck. Há tipos diferentes de Pokémon, com vantagens e fraquezas, e a grande sacada é construir um baralho apropriado para cada combate. A cada dia, é possível abrir apenas dois boosters, com cinco cartas cada um, gratuitamente. Para obter mais, é preciso pagar. O sistema de monetização é semelhante ao de Pokémon Go, com opções mais baratas ou grandes pacotes de vantagens que podem custar caro. Até nisso o sistema se parece com as cartas físicas: alguns personagens mais raros valem mais de 900 reais se comprados de forma avulsa no mercado paralelo.
Mas nem só de nostalgia vive o Pokémon, porque nem tudo o passado resolve. O modelo do game tem um fator envolvente que mostra o progresso do jogador de forma constante. E a febre por obter as cartas mais raras e poderosas funciona como incentivo. “Desde sua criação, Pokémon sempre teve um elemento de colecionismo muito forte. Basta pensar no slogan original, ‘Vamos pegar todos’”, afirma Vicente Martin Mastrocola, professor da graduação de jogos digitais da PUC-SP. “Junto com a mecânica envolvente, o colecionismo se traduz numa comunidade e num senso de pertencimento à franquia que mantém os produtos de Pokémon sempre em voga”, diz o especialista.

Os entusiastas dos bichinhos também tendem a formar um público fiel. Um exemplo claro é o de Pokémon Go, o jogo anterior da franquia, que permitia aos jogadores buscar os seres em um jogo de realidade aumentada. Embora o auge da popularidade tenha passado, a plataforma ainda conta com 90 milhões de jogadores ativos. O Japão concentra boa parte, mas mesmo no Brasil o título é querido. Nos fins de semana, amigos se reúnem para jogar em locais públicos, como o Parque Ibirapuera.
Os smartphones fornecem uma porta de entrada para o universo de Pokémon, mas a empresa responsável, The Pokémon Company, diversificou os produtos de tal forma que dá para achar de tudo. Os cards físicos continuam sendo vendidos. Aqui no Brasil, são lançados em versões traduzidas pela Copag. E vendem muito: foram mais de 53 bilhões de cartas produzidas desde o lançamento, em 1996. Há os jogos para o console Nintendo Switch: os dois mais recentes, Scarlet e Violet, saíram em 2022 e continuam atraindo um perfil de público diferente. Mas há filmes, brinquedos, bichos de pelúcia, itens para casa e mais. Tanto que Pokémon é hoje a franquia de diversão mais valiosa do mundo. No ano passado, teve um faturamento de quase 2 bilhões de dólares. Segundo analistas, a arrecadação superou 99 bilhões de dólares desde 1996, mais até do que Mickey Mouse e seus amigos, criação mais famosa de Walt Disney. O mundo foi dominado por Pikachu e os Pokémon.
Publicado em VEJA de 29 de novembro de 2024, edição nº 2921