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O que causa Covid longa? Cientistas arriscam uma nova resposta

Pesquisadores americanos relacionam quadro comum após a infecção a alterações no intestino e nos níveis de neurotransmissores

Por Diego Alejandro
20 out 2023, 10h05

Segundo dados da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), quase 60% das pessoas acometidas pelo coronavírus apresentam o quadro de Covid longa, quando os sintomas da doença se prolongam por até três meses após a fase aguda da infecção. Mas o motivo pelo qual algumas pessoas se recuperam completamente enquanto outras permanecem com sintomas e sequelas ainda é um mistério. Agora, pesquisadores da Universidade da Pensilvânia, nos EUA, fornecem algumas pistas para montar o quebra-cabeça.

O novo estudo, publicado no periódico Cell, mostra que pedaços de vírus que sobrevivem no intestino podem despertar uma inflamação crônica, o que reduz a produção de serotonina – também conhecido como “neurotransmissor da felicidade” e uma molécula crítica para a comunicação entre as células nervosas no intestino e no cérebro. 

O cérebro e o intestino conversam entre si. Na verdade, o sistema nervoso gastrointestinal, com os seus próprios 500 milhões de neurônios, é tão grande que às vezes é chamado de “segundo cérebro”. Além disso, cerca de 95% da serotonina é produzida no intestino, embora o cérebro tenha seu próprio fornecimento.

Os autores americanos sugerem que o esgotamento da serotonina perturba a comunicação entre o intestino e o cérebro, o que pode causar sintomas neurológicos no longo prazo, como névoa cerebral e problemas de memória. E aí estaria a chave para entender as repercussões do ataque do coronavírus ao organismo.

“A Covid longa pode estar ligada através de uma via que se origina no intestino e leva à redução da serotonina”, diz Christoph Thaiss, microbiologista da Universidade da Pensilvânia que liderou a pesquisa.

Novo diagnóstico e tratamento

Este é um dos vários novos estudos que documentam alterações biológicas distintas nos corpos de pessoas afetadas pela Covid longa. Pouco tempo atrás, uma equipe da Escola de Medicina Icahn, também nos EUA, publicou um trabalho que identificou outros reflexos bioquímicos da doença, incluindo a mudança nos níveis do hormônio cortisol.

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Combinados, esses estudos poderiam apontar para subtipos específicos da condição ou diferentes indicadores biológicos do quadro. Assim, dariam insights e insumos para criar novas ferramentas de diagnóstico e monitoramento clínico.

A nova tese, se confirmada, também pode apontar caminhos para possíveis tratamentos, incluindo medicamentos que aumentam a disponibilidade de serotonina. Os autores disseram que a via biológica descrita poderia unir muitas das principais teorias sobre o que causa a Covid longa: restos persistentes do vírus, inflamação, aumento da coagulação sanguínea e disfunção do sistema nervoso.

“Todas essas diferentes hipóteses podem estar ligadas através da via da serotonina”, disse Thaiss. “Em segundo lugar, mesmo que nem todas as pessoas tenham dificuldades nessa via, pelo menos um subconjunto poderá responder a terapias capazes de ativá-la”.

O estudo

Os cientistas analisaram o sangue de 58 pacientes que sofriam de Covid longa, entre 3 e 22 meses desde a infecção. Esses resultados foram comparados com análises de sangue de 30 pessoas sem sintomas pós-Covid e 60 pacientes que estavam no estágio inicial e agudo da infecção.

Os níveis de serotonina e outros produtos do metabolismo foram alterados logo após uma infecção por coronavírus, algo que também acontece imediatamente após outras infecções virais. Mas, em pessoas com Covid longa, a serotonina foi a única molécula significativa que não recuperou os níveis pré-infecção.

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A equipe, então, analisou amostras de fezes de alguns pacientes com Covid longa e descobriu que continham partículas virais remanescentes. Juntando as descobertas com pesquisas em ratos e modelos em miniatura do intestino humano, onde a maior parte da serotonina é produzida, a equipe identificou uma via que poderia estar subjacente a alguns casos da condição.

Próximo passo

Os autores agora buscam biomarcadores para a Covid longa – alterações biológicas que podem ser medidas para ajudar a diagnosticar a doença. O novo estudo sugere três: a presença de restos virais nas fezes, níveis baixos de serotonina e altos níveis de interferom, um grupo de proteínas naturalmente produzidas no organismo para se defender de infecções.

Tudo aponta para não apenas um único biomarcador para a doença, mas vários indicadores que variariam de acordo com o tipo de sintoma e outros fatores.

Thaiss afirma que seu grupo iniciou um ensaio clínico para testar a fluoxetina, um antidepressivo inibidor seletivo da recaptação da serotonina, nesse contexto. “Se suplementarmos a serotonina ou prevenirmos sua degradação, talvez possamos restaurar alguns dos sinais nervosos e melhorar a memória e a cognição e assim por diante”, explicou.

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