Depois de quase 30 anos sem novidades no tratamento, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou a edaravona para a esclerose lateral amiotrófica (ELA). A resolução foi publicada no Diário Oficial da União, em março do ano passado.
Lançado no Brasil pela farmacêutica Daiichi Sankyo e de administração intravenosa, a substância visa a proteger os neurônios do estresse oxidativo ao capturar moléculas instáveis (os radicais livres) que danificam essas células. Assim, o fármaco desacelera a progressão da perda nervosa e funcional do paciente.
Os cientistas acreditam que o acúmulo anormal dessas moléculas contribui para a degeneração neuronal observada na esclerose lateral amiotrófica (ELA).
“Há quase 30 anos não tínhamos um novo tratamento farmacológico aprovado no Brasil para pacientes com ELA. Essa nova opção é complementar às terapias já existentes, uma vez que os medicamentos possuem mecanismos de ação distintos e os processos que levam ao surgimento e à evolução da ELA ainda não são totalmente conhecidos”, afirma a VEJA Gabriela Prior, diretora de Assuntos Médicos e Acesso ao Mercado da Daiichi Sankyo Brasil.
A droga já vinha sendo utilizada em alguns países como os Estados Unidos, que aprovaram a edaravona, por administração endovenosa, em 2017, ao concluírem que ela pode retardar a progressão da doença em cerca de 33%. Posteriormente, em 2022, o órgão regulatório do país aprovou a administração oral do medicamento.
O que é Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA)?
A esclerose lateral amiotrófica é uma doença rara que danifica as células nervosas do cérebro e da medula, inclusive os nervos motores. Com isso, a capacidade de o cérebro iniciar e controlar movimentos voluntários – como os ligados à fala e à deglutição – diminui progressivamente. Em estágios avançados, o paciente pode ter paralisia completa.
Há aproximadamente 6.000 brasileiros que vivem com a doença, mas esse número, provavelmente, é subestimado, uma vez que o tempo entre o aparecimento dos sintomas e a detecção da doença é longo; em média, um ano.
Além disso, segundo o Ministério da Saúde, cerca de 75% dos pacientes vivem por menos de cinco anos após o diagnóstico da doença. No entanto, há casos menos frequentes de pessoas que conquistam uma longevidade maior. O exemplo mais famoso foi o físico Stephen Hawking, que viveu até os 76 anos.
O desafio de balde de gelo
Em 2014, as redes sociais foram tomadas por vídeos de pessoas despejando água gelada sobre a cabeça. Apesar de ter virado moda rapidamente, com muitas pessoas aderindo ao movimento sem nem saber a sua causa, o desafio do balde de gelo (ou ice bucket challenge) foi muito bem-sucedido. A campanha arrecadou cerca de 100 milhões de dólares, financiando uma pesquisa que descobriu a existência de um gene relacionado à esclerose lateral amiotrófica, em 2016.
Tudo começou quando um jovem americano postou um vídeo tomando o famoso banho gelado, depois que soube que um amigo havia recebido o diagnóstico de ELA. A metáfora se refere à expressão “banho de água fria”, que, nesse caso, pode ser interpretada como o choque sentido ao receber o diagnóstico.
Assim, a ALS Association formalizou e lançou a campanha do Desafio do Balde de Gelo para arrecadar dinheiro para pesquisas sobre a esclerose lateral amiotrófica (ELA). Cada pessoa que iria fazer uma doação gravava um vídeo virando um balde de água gelada na cabeça e desafiando três amigos a fazer o mesmo.
Dificuldades no tratamento
A complexidade do sistema nervoso, a falta de informações sobre a origem da doença e a diversidade de sintomas tornam o tratamento da ELA desafiador. Além disso, não existe uma cura para a condição. As medicações disponíveis, como a edaravona, visam principalmente a aliviar os sintomas e melhorar a qualidade de vida do paciente.
“Além do tratamento medicamentoso, é crucial oferecer ao paciente suporte multidisciplinar, que inclui fisioterapia, terapia ocupacional, fonoaudiologia, atendimento psicológico, apoio de enfermagem, entre outros serviços”, afirma Gabriela. “Também é muito importante o comprometimento de familiares e cuidadores em todo esse processo.”
Todos esses cuidados de rotina implicam altos custos financeiros para o paciente e sua família – que precisam desembolsar em equipamentos médicos especializados, adaptações domiciliares, além dos cuidados contínuos. Apesar dos obstáculos, organizações como ABrELA (Associação Brasileira de Esclerose Lateral) e Associação Pró-Cura da ELA reúnem esforços para fomentar pesquisas sobre a doença e para acolher e assistir pacientes e familiares.