Um negócio da China
Ops, na verdade é de Angola. A nova denúncia da Procuradoria-Geral da República reforça o papel de Lula no comando do propinoduto petista
Em janeiro de 2007, no primeiro ano do segundo mandato do ex-presidente Lula, o então ministro Paulo Bernardo desembarcou em Luanda, capital de Angola, para reuniões com representantes do governo local. A viagem, na época, não despertou muita atenção, ainda que Bernardo, no comando da Pasta do Planejamento, estivesse cumprindo uma tarefa incomum, bem mais apropriada à diplomacia. Angola atravessava um período de reconstrução, após anos de guerra civil. Procurava dinheiro para recuperar setores como os de infraestrutura e agricultura. O governo brasileiro ofereceu uma linha de crédito especial do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Paulo Bernardo falava em nome do então presidente Lula. O que parecia um acordo comercial entre duas nações era, na verdade, a preparação de um golpe contra os cofres públicos — golpe que, agora, mais de uma década depois, resultou em nova acusação de corrupção contra Lula.
Dois meses após a viagem do ministro, uma delegação angolana retribuiu a visita ao próprio Paulo Bernardo, para dar continuidade às negociações do acordo que abriria os cofres do BNDES ao país africano. Em 2010, ano de eleições e o último do governo Lula, o banco liberou 1 bilhão de dólares para Angola. Segundo a denúncia apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF) pela Procuradoria-Geral da República, o acordo trazia embutida uma cláusula secreta. O BNDES liberaria o dinheiro e, em troca, as empreiteiras brasileiras que viessem a ser contratadas pelo governo angolano para executar as obras remeteriam 40 milhões de dólares de volta ao Brasil em forma de propina a Lula, a Paulo Bernardo e ao ex-ministro Antonio Palocci, que coordenava a campanha presidencial do PT. Os três, agora, foram denunciados pelo crime de corrupção passiva.
Além do trio, a presidente nacional do PT, senadora Gleisi Hoffmann, mulher de Bernardo, é acusada pela procuradora-geral Raquel Dodge de receber 3 milhões de reais de bônus do mesmo pacote de propina. Em delação premiada, Marcelo Odebrecht detalhou a negociação. Ele entregou aos investigadores da Lava-Jato cópias de e-mails em que foram acertadas as bases da negociata. “Antonio Palocci e Paulo Bernardo solicitaram-me pagamento ao PT em decorrência da aprovação da linha de crédito e dos benefícios, ainda que indiretos, que a Odebrecht teria com isso. Apesar de não ser da competência de Paulo Bernardo, tratei desse tema específico com ele, em razão de indicação assim feita pelo presidente Lula, que sabia do que estava acontecendo.”
Publicado em VEJA de 9 de maio de 2018, edição nº 2581