Sempre que uma tragédia que envolve crianças ou jovens ocorre, somos instigados por ela a pensar e a refletir. Os mais novos são nossa responsabilidade, porque é neles que depositamos o destino da humanidade: serão eles que, num futuro breve, darão os rumos de nossa sociedade. Por isso, precisamos saber o que podemos fazer melhor, e o que estamos fazendo de pior para eles, mesmo sem termos consciência disso.
Creio que hoje quase todo mundo sabe que temos um Dia Mundial de Combate ao Bullying — 20 de outubro —, e foi justamente nesse dia que ocorreu uma tragédia em nosso país, logo associada ao bullying. Um garoto de 14 anos usou uma arma de fogo para atirar em seus colegas de escola. Dois morreram e outros ficaram feridos.
Mas, afinal, o que é bullying? Em tempos de confusão sobre o tema, é bom esclarecer: é uma violência, física ou psicológica, praticada repetidamente por uma pessoa ou um grupo contra outra pessoa ou grupo. Temos usado esse termo principalmente para nos referir às violências que acontecem entre os alunos no espaço escolar. Desde que o tema explodiu na imprensa, muitos pais se preocupam com a possibilidade de seu filho ser vítima de bullying. Poucos se dão conta, entretanto, do fato de que o filho pode praticar esse tipo de violência.
Por que o bullying ocorre, afinal? Não é uma questão simples, não há uma causa, mas uma rede formada por vários motivos diferentes. Escolhi abordar os que eu considero verdadeiramente importantes. Primeiramente, porque a escola espelha a sociedade em que está inserida. Vamos reconhecer: vivemos há tempos em uma sociedade bem violenta! Pessoas matam outras porque foram abandonadas, por ter sido traídas, por dinheiro, porque brigaram no trânsito ou no futebol. Pessoas denigrem e agridem outras porque não concordam com suas posições. Xingamentos humilhantes tornaram-se rotineiros e banais. Perdemos boa parte do que chamamos de civilidade.
O bullying ocorre porque pensamos que os mais novos precisam de limites. Eles precisam, porém, de mais do que isso; eles precisam da presença firme, forte e amorosa dos adultos para tutelar o cumprimento dos tais limites. De nada adianta apenas dizer para crianças ou adolescentes “não façam isso” ou “façam aquilo”. É preciso acompanhar o processo. Temos negado nossa presença a eles porque estamos muito ocupados com nossas traquitanas tecnológicas, com nossa juventude, com nossos planos, com nossa vida.
O bullying ocorre também porque não ensinamos aos mais novos que é possível conflitar com respeito. Ao contrário, nosso comportamento assinala a eles que o confronto é a melhor saída. Também não ensinamos que é possível lidar com as emoções que surgem repentinamente sem ser de modo intempestivo, que devemos nos relacionar com as diferenças sem julgar, que precisamos ter empatia e virtudes. Ensinamos apenas que é preciso ter êxito e sucesso, e ser popular! Agora, eu pergunto: o que nós, adultos, temos a ver com o bullying entre crianças e adolescentes? Nosso comportamento já diz: temos TUDO a ver!
Publicado em VEJA de 1º de novembro de 2017, edição nº 2554