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O drama dos mais expostos

O desemprego prolongado e a queda da renda fizeram o número de pobres explodir. Em três anos, o crescimento da miséria no país chegou a quase 40%

Por Marcelo Sakate Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 17h17 - Publicado em 14 set 2018, 07h00

Muitos dos sintomas da crise econômica prolongada já são conhecidos. Desemprego recorde, lojas vazias ou fechadas, indústrias com linhas de produção paralisadas. Uma de suas faces mais dramáticas, porém, ainda está sendo devidamente dimensionada — e as conclusões preliminares já são assustadoras. Nos três anos entre o fim de 2014 e o fim de 2017, o número de brasileiros que vivem na pobreza aumentou 37%. Isso equivale a 6,3 milhões de pessoas que passaram a fazer parte de um contingente de 23,3 milhões que tentam sobreviver com uma renda mensal de 233 reais (algo como 7,76 reais por dia). Os novos dados acabam de ser calculados pelo economista Marcelo Neri, diretor da FGV Social e um dos maiores estudiosos do país em temas sociais. É um retrocesso que já podia ser constatado pelos brasileiros no cotidiano, com a simples observação do aumento expressivo de moradores de rua, em especial nas capitais.

O crescimento e a persistência do desemprego, aliados à queda da renda, constituem os principais fatores que explicam a explosão da pobreza. São consequências diretas da crise prolongada. O país saiu da recessão no ano passado, a inflação foi finalmente controlada em níveis mais baixos, mas o mercado de trabalho ainda ensaia uma retomada (e bem lenta). Dada a dificuldade de recolocação, os jovens representam o grupo mais afetado: aqueles que têm entre 15 e 19 anos sofreram uma perda de 20% do rendimento entre 2015 e 2018; entre 20 e 24 anos, a redução foi de 14%. São números muito piores do que a retração média de todos os trabalhadores, de 3,4%. “É uma crise exterminadora de futuros”, afirma Neri. Segundo ele, muitas vezes, trata-se de um caminho sem volta, citando a criminalidade entre jovens. “Parte do efeito negativo não será revertida mesmo quando o emprego voltar.”

O ano eleitoral serve como alento e alerta. Alento porque a história brasileira recente, desde a volta da democracia, mostra que a renda dos mais pobres cresce acima da média em anos de eleição para presidente. Segundo Neri, essa é uma reação oportunista, uma vez que programas sociais são a principal forma de renda para quem mais necessita. E é exatamente o que está acontecendo. Depois de dois anos com o benefício congelado, o governo anunciou em junho um aumento acima da inflação para o valor pago pelo Bolsa Família. O benefício passou de 177,71 reais mensais para 187,79, um reajuste de 5,67% (o índice de preços subira 4,01% desde o aumento anterior). Essa medida e a análise de outros indicadores, como a renda do trabalho, levaram o especialista a prever que 470 000 brasileiros sairão das estatísticas da pobreza no fim deste ano. Trata-se, no entanto, de um evento de alcance limitado. O alerta decorre justamente do fato de que o ano seguinte às eleições costuma registrar um aumento da pobreza no país, possivelmente motivado pelo descaso do novo governante. Dos pobres, como se vê, os políticos querem apenas o voto.

Publicado em VEJA de 19 de setembro de 2018, edição nº 2600

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