Na mão dos cartolas
Depois de mais um lance irregular validado, a CBF deve finalmente adotar o árbitro de vídeo em seus campeonatos. Mas a pressa pode atrapalhar a novidade
No domingo 17, o Corinthians, líder do Campeonato Brasileiro, venceu o Vasco por 1 a 0, com o gol marcado pelo atacante Jô. O resultado não mereceria grande destaque não fosse a forma como a bola foi empurrada para as redes do time carioca. A imagem ao lado não deixa dúvida. O camisa 7 do clube paulista, no afã de não perder uma chance clara, usou o braço direito para desviar o cruzamento e abrir o marcador. O assistente posicionado na linha de fundo não percebeu a esperteza e validou o lance. “Não vi se foi com a mão ou não, mas o juiz interpretou que não foi”, defendeu-se o corintiano no fim da partida. Dois dias depois, ele admitiria a enganação, mas o estrago já estava feito.
É injusto pôr nos ombros de Jô o peso do mundo, como se ele fosse obrigado, num instante de magnanimidade, a resolver todos os dilemas éticos dos jogadores de futebol que não param de fingir. No avesso, tampouco se deve louvar a malandragem, atributo que no passado era celebrado e virou coisa feia, felizmente. Considerar lance de gênio a “mão de Deus” de Maradona na Copa de 1986 é tolice. Do acirrado debate da semana passada, que opôs num único lance de futebol a honestidade e a desonestidade, sem conclusão evidente, brotou uma boa notícia: a decisão da CBF de adotar finalmente o árbitro de vídeo, recurso para analisar os lances polêmicos de uma partida com a ajuda das câmeras de TV.
A adoção do sistema, já utilizado em caráter experimental pela Fifa, foi apressada, e veio da celeuma em torno de Jô. No dia seguinte ao jogo entre Corinthians e Vasco, Marcos Marinho, presidente da Comissão de Arbitragem, declarou que o sistema seria utilizado já na rodada seguinte do Brasileirão. A promessa não foi cumprida, dadas as dificuldades de instalação dos equipamentos e de treinamento dos árbitros. A VEJA, o instrutor da Escola Nacional de Árbitros Manoel Serapião confirmou que, em virtude de questões técnicas, o uso da tecnologia em todas as partidas será muito difícil. Na eventualidade de algumas terem a novidade e outras não, a CBF inauguraria outra modalidade de divisão: a dos jogos com bom potencial para terminar sem contendas e a dos afeitos a confusão. Mas já não há dúvida, e o futebol não pode viver preso ao passado: o árbitro de vídeo pode ser a salvação dos erros crassos do apito. Mas é preciso ter cautela para não ampliar a gritaria.
Publicado em VEJA de 27 de setembro de 2017, edição nº 2549