Escapando da cadeia
Um juiz pede a detenção preventiva da ex-presidente Cristina Kirchner por tentar proteger terroristas iranianos — mas ela não irá para a prisão tão cedo

Quarenta e cinco dias após a ex-presidente Cristina Kirchner ser eleita senadora por Buenos Aires, o juiz argentino Claudio Bonadio pediu sua prisão preventiva. Segundo o magistrado, ela cometeu o crime de traição à pátria por ter acertado um plano com iranianos para safá-los de uma condenação pelo atentado terrorista à Associação Mutual Israelita Argentina (Amia), em 1994, que deixou 85 mortos. Foi por pouco. Ao conquistar uma das três vagas no Senado, Cristina ganhou — na Argentina também há dessas coisas — foro privilegiado. Ela só pode ser presa se dois terços dos senadores decidirem cancelar-lhe o privilégio. Os senadores peronistas, tanto os que são a favor do governo de Mauricio Macri quanto os que são contra, avisaram que não pretendem jogá-la na cadeia, mas isso pode mudar, porque as negociações começam agora. “É difícil que eles façam isso apenas com um pedido de prisão preventiva, mas a história certamente seria diferente se houvesse uma condenação, o que pode levar um ano para acontecer”, diz o advogado Guillermo Fanego, especialista em direito penal, de Buenos Aires.
Pelo menos três funcionários e sindicalistas cristinistas foram detidos na quinta-feira 7 no mesmo processo, que teve início com a denúncia do procurador Alberto Nisman, morto misteriosamente no começo de 2015. A ex-presidente ainda responde a outras acusações, como a de receber diárias-fantasma em um hotel na Patagônia. Se for condenada no fim do processo da Amia, ela poderá pegar até 25 anos de cana. “Cristina está cada vez mais isolada e debilitada. Em outro momento, milhares de argentinos iriam às ruas para protestar contra a decisão do juiz. Isso hoje é improvável”, diz o cientista político Patricio Giusto, de Buenos Aires. Entre os ex-governantes da América do Sul que se aproveitaram do boom recente das commodities e depois acabaram na prisão por atos ilícitos, a ex-presidente argentina pode ser a segunda da fila. O primeiro foi o peruano Ollanta Humala, detido em julho após um pedido de prisão preventiva.
Publicado em VEJA de 13 de dezembro de 2017, edição nº 2560