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‘O fogo que devastou a Amazônia não é o do Evangelho’, diz Francisco

Na abertura do Sínodo especial, o papa afirmou que a região amazônica precisa do 'fogo de Deus', que não é alimentado pelos lucros

Por Da redação
Atualizado em 30 jul 2020, 19h38 - Publicado em 6 out 2019, 09h59

O Papa Francisco celebrou neste domingo a missa de abertura do Sínodo da Amazônia na Basílica de São Pedro, no Vaticano, com atenção voltada aos incêndios na floresta. No local estavam povos indígenas e mais de 180 cardeais, bispos e padres. Participam também doze convidados laicos, incluindo o ex-secretário-geral da ONU Ban Ki-moon, e pesquisadores e cientistas do mundo todo.

“O fogo causado por interesses que destroem, como o que devastou recentemente a Amazônia, não é o fogo do Evangelho”, disse o pontífice. “O fogo de Deus é o calor que atrai e reúne a unidade. É alimentado pela participação, não pelos lucros”.

Em oração, Francisco pediu de Deus inspire os bispos a agir com ousadia para proteger a região. “Se tudo continuar como antes, se passarmos nossos dias contando que ‘é assim que as coisas sempre foram feitas’, o presente desaparece, sufocado pelas cinzas do medo e da preocupação em defender o status quo”, disse o papa.

O sínodo especial continua até o dia 27 de outubro e se tornou um dos mais controversos gestos do papado de Francisco. O encontro vai discutir questões ambientais, além de temas sociais, ambientais e religiosos dos nove países que têm territórios na Amazônia. Além do Brasil, são Bolívia, Colômbia, Equador, Peru, Guiana, Guiana Francesa, Venezuela e Suriname.

“Dom recebido é para servir”

Em sua homilia, Francisco acolheu os bispos sinodais e falou sobre a importância de “caminhar juntos”, citando o apóstolo Paulo. “Somos bispos porque recebemos um dom de Deus. Recebemos um dom para sermos dons. Um dom não se compra, não se troca e não se vende. Recebe-se e se dá de presente”, disse, falando sobre a importância de que os religiosos sejam pastores, e não funcionários. “Dom recebido é para servir.” A cerimônia contou com leituras em português e espanhol, idiomas falados nos países com territórios amazônicos.

Dos cerca de 250 convocados pelo papa para participar do Sínodo, 58 são brasileiros – é a maior delegação. O relator-geral do Sínodo é o cardeal brasileiro dom Cláudio Hummes, arcebispo emérito de São Paulo e presidente da Rede Eclesial Pan-Amazônica (Repam).

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Mártires

Papa Francisco também lembrou daqueles que foram mortos em lutas e missões na região amazônica. “Querido cardeal Hummes”, dirigiu-se ao brasileiro. “Quando chegar a cidades pequenas amazônicas, vá ao cemitério procurar os túmulos dos missionários. Um gesto da Igreja por aqueles que derramaram suas vidas na Amazônia. Não nos esqueçamos deles, merecem ser canonizados.”

“Muitos irmãos e irmãs da Amazônia carregam cruzes pesadas e aguardam pela libertação do Evangelho”, pontuou Francisco.

Entre os participantes estão religiosos como bispos, padres e freiras, mas também leigos convidados – cientistas e pessoas ligadas a Organização das Nações Unidas (ONU). A expectativa é grande sobre os debates, principalmente por conta da crise climática contemporânea e de recentes declarações do presidente brasileiro Jair Bolsonaro sobre problemas ambientais na Amazônia, que repercutiram mal no exterior.

Assunto de interesse mundial

Um dos cientistas que participam do evento é o climatologista brasileiro Carlos Nobre, que integrou a equipe que venceu o Nobel da Paz em 2007 e é um dos mais renomados especialistas do mundo em sua área. Ele avaliou que o Sínodo mostra que a Amazônia “tornou-se um assunto de preocupação mundial”.

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Segundo ele, o encontro permitirá que se discuta novos modelos de desenvolvimento para a Amazônia e o empoderamento das populações locais. “Há uma janela para a criação de bioindústrias na Amazônia, em variadas escalas – desde a local, em comunidades, até em um âmbito maior, aproveitando os imensos ativos biológicos.”, escreveu o climatólogo e pesquisador do Instituto de Estudos Avançados da USP, Carlos Nobre, em artigo publicado nesta edição de VEJA.

O padre jesuíta norte-americano James Martin, consultor do Vaticano, definiu o Sínodo como “um tempo para a Igreja se reunir e meditar sobre os muitos desafios que enfrenta, não apenas em termos de meio ambiente”. “Mas também como ajudar a Igreja a alcançar pessoas em lugares que muitas vezes não são servidos por padres e paróquias”, comentou ele. “E a maneira como essa região responde a essas perguntas ajudará outras áreas a enfrentar seus próprios problemas através desse importantes modo de discernimento.”

“O papa Francisco convocou um Sínodo Sobre a Amazônia porque essa região merece um Sínodo”, afirmou ele.

Temas debatidos

Segundo o Instrumento de Trabalho, o documento divulgado anteriormente para nortear as discussões do Sínodo, os temas que devem ser debatidos vão desde a situação das comunidades indígenas e ribeirinhas até a exploração internacional dos recursos naturais da região. Os bispos também vão discutir a violência, o narcotráfico e a exploração sexual que vitimiza os povos locais, as práticas de extrativismo ilegal, o desmatamento, a poluição dos rios e as ameaças à biodiversidade, a crise climática global, os danos possivelmente irreversíveis da floresta e o posicionamento de governos quanto a projetos econômicos prejudiciais à natureza.

(Com Agência Estado)

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