O futuro da Igreja sem Francisco, de acordo com seu biógrafo
Autor de dois livro sobre a vida do Papa, o jornalista britânico Austen Ivereigh aposta na consolidação das reformas iniciadas pelo pontífice

Autor de duas biografias sobre o Papa Francisco, o jornalista britânico Austen Ivereigh vê a Igreja Católica entrando em uma era de incerteza após a morte do sumo pontífice. Em um artigo publicado no The New York Times, ele destaca que os cardeais que irão participar do Conclave, dentro em breve, refletirão sobre a missão da instituição diante de um contexto global marcado pela fragmentação do Ocidente e pelo fim da ordem baseada em regras do pós II Guerra Mundial.
Para o articulista, acostumado a acompanhar os bastidores da Santa Sé, causa aflição em muito membros da alta cúpula do clero, o fato de forças totalitárias estarem em ascensão no planeta, especialmente pelo protagonismo de líderes políticos que utilizam o populismo nacionalista como arma.
O liberalismo ocidental, na ótica de Ivereigh, estará na mira dos cardeais em função das desigualdades sociais que o modelo provocou, algo que desperta a simpatia de muitos dos nomeados por Francisco para o cargo. Na África, Ásia e América Latina, diversos deles se mostram indignados com a globalização impulsionada pelo mercado e a imposição de valores liberais ocidentais.
O antídoto para um mundo fragmentado em que o impulso individual parece estar adiante do bem coletivo, pode estar no passado da Igreja. O biógrafo de Francisco menciona o ensinamento de Pio XI, em um dos mais importantes documentos escritos no fim do século XX. Em uma de suas encíclicas, e Papa que governou a Igreja entre 1922 e 1939, ressaltou o papel que as instituições intermediárias, como escolas e associações de caridade, podem desempenhar na sociedade moderna, já que não pertencem nem ao Estado, nem ao mercado.
O legado de Francisco, incluindo suas reformas estruturais e culturais no Vaticano, terá forte influência, e os cardeais provavelmente desejarão que o novo papa consolide e amplie essas reformas, apontando que ela pode ser o esteio de uma alternativa ao contexto atual. Um desses indicativos seria o fato de Francisco apontar para a abertura da Igreja trazendo para dentro do Sínodo (espécie de conselho) a participação de leigos e de mulheres. A “cultura do encontro” de Francisco, com sua ênfase na dignidade de todos e na escuta dos marginalizados é algo que, para Ivereigh, veio para ficar.