Imagem de santa passa por ‘harmonização facial’ e será periciada pelo Iphan
Aparência da santa foi modificada com bochechas rosadas, boca redesenhada e tons mais claros; Iphan diz que intervenção não foi autorizada

Uma restauração feita na imagem de Nossa Senhora das Dores, localizada na Igreja Nossa Senhora do Rosário, em Pirenópolis (GO), provocou indignação entre fiéis, moradores e autoridades de preservação. A escultura, datada do século XVIII e tradicionalmente conhecida por sua expressão carregada de sofrimento, apareceu com feições suavizadas, pele mais clara e traços que lembram uma “harmonização facial”.
A modificação na santa foi percebida no início de abril, quando fiéis notaram diferenças na pintura e enviaram denúncias ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que confirmou ter recebido as reclamações no dia 4. A polêmica ganhou força às vésperas da tradicional procissão da Sexta-feira Santa, marcada para 18 de abril, quando a imagem de Nossa Senhora das Dores costuma ser levada pelas ruas do centro histórico de Pirenópolis. O caso rapidamente se espalhou pelas redes sociais, provocando reações indignadas da comunidade local e de devotos.
As principais críticas apontam que a nova pintura descaracterizou completamente a imagem original, apagando marcas históricas e emocionais da escultura. As bochechas ficaram rosadas, os cílios mais definidos e os lábios ganharam aparência de batom. As lágrimas, antes evidentes, quase desapareceram. Até as mãos, antes com sombreamento escuro, foram clareadas com tinta uniforme, sem respeitar a técnica original de policromia.
O que diz o Iphan sobre a restauração?
O Iphan, responsável pela proteção do acervo, informou que não foi comunicado previamente sobre a intervenção e que a obra foi realizada sem acompanhamento de um técnico restaurador habilitado. A igreja e sua imagem sacra são tombadas individualmente pelo instituto, o que exige autorização formal para qualquer modificação.
Após denúncias feitas por fiéis, uma equipe técnica do Iphan realizou uma vistoria no local no dia 8 de abril. Em laudo divulgado posteriormente, o instituto concluiu que a restauração alterou de forma significativa os traços da santa e recomendou a elaboração de um novo projeto de restauro, dessa vez criterioso e com base em documentação técnica, coleta de amostras e testes laboratoriais.
Além disso, outras duas imagens da mesma igreja também apresentaram sinais de intervenções inadequadas, segundo o relatório.
Restauração é considerada reversível
Apesar da descaracterização, o Iphan avalia que os danos à imagem de Nossa Senhora das Dores são reversíveis. O instituto solicitou à Diocese de Anápolis, responsável pela igreja, que envie esclarecimentos e um cronograma detalhado das ações previstas para a recuperação da obra. A imagem será colocada à disposição do Iphan para análises mais aprofundadas.
Em nota, a Diocese afirmou estar comprometida com a preservação do patrimônio histórico, artístico e religioso da região e disse que aguarda o parecer técnico final para definir os próximos passos.