Monitoramento da polícia do Piauí mostra traficantes na campanha eleitoral
Ministério Público investiga infiltração do crime organizado na política do Estado
Em setembro do ano passado, a polícia do Piauí estava monitorando a maior quadrilha de tráfico de cocaína da região, que viria a ser presa dois meses depois. Durante a missão, os agentes constataram que os criminosos estavam adesivando carros com propaganda de candidatos e chegaram a visitar até p comitê eleitoral de um candidato. Como mostrou VEJA desta semana, o Ministério Público investiga a interferência do crime organizado nas eleições do Estado.
O monitoramento mostrou que os traficantes utilizavam em seus veículos adesivos do deputado estadual eleito Georgiano Neto (MDB). Depois que a quadrilha foi presa, em novembro, a polícia descobriu que um dos criminosos, Ramon Santiago Matos Nascimento, havia sido contratado no gabinete do parlamentar, mesmo estando recolhido na penitenciária do estado..
Gergiano Neto é de uma família tradicional de políticos do Piauí. O pai é o deputado federal Júlio César (PSD) e a mãe é a senadora Jussara Lima (PSD), que assumiu a cadeira no Congresso em fevereiro como suplente do ex-governador Wellington Dias (PT), ministro do Desenvolvimento Social do governo Lula. Georgiano não quis explicar a nomeação do traficante.
Durante a vigilância, os policiais flagraram a proximidade da quadrilha com outro político. Ítalo Freire Soares de Sá, apontado como operador financeiro do grupo criminoso, foi visto entrando e saindo do comitê do deputado eleito Jadyel da Jupi (PV). No estacionamento do comitê, o traficante movimentou sacolas de um carro para outro. A polícia não sabe o que havia nelas.
Ítalo, que é dono de uma empresa de corretagem de imóveis, tinha acesso a gabinetes poderosos. Em 2021, o então governador Wellington Dias recebeu o então “empresário” em uma audiência no Palácio Karnak. O encontro foi para discutir o “fortalecimento do empreendedorismo”. Wellington Dias, evidentemente, não tinha como saber das atividades clandestinas do visitante.
Há outros indícios de ligação do tráfico com a política no estado. Dois membros da quadrilha fizeram contribuições financeiras oficiais para candidatos piauienses junto ao TSE. Uma das investigadas pelo MP é uma candidata a vereadora, que é professora do ensino fundamental com salário de 1.700 reais e que declara ser diretora de empresa, mas que movimentou 6,4 milhões de reais entre setembro de 2020 e agosto de 2022, ou seja, em menos de um ano.
O Ministério Público suspeita que o crime organizado tenha utilizado parcela dos recursos arrecadados com o narcotráfico na compra de votos no Estado. A nomeação de um criminoso preso como assessor parlamentar, na avaliação dos investigadores, seria uma forma de retribuição pela ajuda na campanha.