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A (ir)responsabilidade do governo e do Congresso no combate às queimadas, segundo o STF

Ministros do tribunal apontam para muito discurso e pouca ação prática no enfrentamento dos focos de incêndio no país

Por Laryssa Borges Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 21 set 2024, 18h34

Integrantes do Supremo Tribunal Federal (STF) estão convencidos de que o presidente Lula, os ministros do governo e a composição atual do Congresso amplamente amigável ao agronegócio contribuíram, cada um à sua maneira, com o descontrole absoluto de pontos de queimadas na Amazônia e no Pantanal.

Até 18 de setembro, mais de 190.000 focos de incêndio no Brasil estavam espalhados pelas regiões Norte e Centro-Oeste, mas coube ao tribunal, primeiro no início do ano, quando julgou cinco ações que cobravam um plano governamental para preservação dos dois biomas, e agora com o ministro Flávio Dino, elencar o que deve ser feito para combater o avanço do fogo sobre a vegetação.

O diagnóstico que levou a imputar responsabilidades ao Executivo e ao Congresso envolve três pilares: no primeiro deles, a avaliação é a de que o presidente Lula pode até ter um rumo para a pauta ambiental, mas nunca o tira do papel. Há problemas de gestão, de velocidade na implementação de políticas de proteção ambiental, além da crença do governo de que outros temas deveriam furar a fila de prioridades. Às vésperas da COP-30, quando os olhos do mundo estarão sobre o Brasil, o cenário de letargia seria ainda mais alarmante, concluíram integrantes do Supremo que, reservadamente, concordam com as ordens de Dino de autorizar a liberação de crédito extraordinário para enfrentar o problema e flexibilizar a regra de contratação de brigadistas. Internamente, interlocutores de Dino contabilizam que ele tem ampla maioria no tribunal para as medidas que tem tomado, ainda que sob críticas de parlamentares de que parte delas se assemelha a funções do Executivo e do Congresso.

O segundo pilar retrata a ministra do Meio Ambiente Marina Silva como uma auxiliar que, embora bem-intencionada e conhecedora da causa ambiental, não tem influência dentro do Planalto, é boicotada abertamente por ministros com maior ascendência junto a Lula e, quando é chamada a se manifestar, entoa discursos apocalípticos sem efeito prático para o controle do fogo. Em contraposição ao poder do agronegócio, que tem forte influência no Congresso, Marina seria apenas um símbolo sem voz. Diante do embaraço que levou Flávio Dino a listar ordens – do uso de helicópteros à abertura de recursos extras – para que as queimadas sejam de fato combatidas, um integrante do Supremo resumiu assim o papel do mais novo integrante do tribunal: “o STF às vezes pode parecer um pomar, mas alguém tem que descascar o abacaxi”.

O julgamento da chamada pauta verde, em março, é sintomático. Na ocasião, o tribunal concluiu haver violação massiva de direitos ambientais quando Pantanal e Amazônia ardem sob as chamas e deu prazo para o Executivo fazer um plano. Um veredicto correto mas teórico que, com o avanço do fogo, teria pouca valia, afirmou a VEJA um integrante da Corte. A contingência do aumento das queimadas mostrou, na avaliação dele, que apenas uma decisão escrita em papel não resolve situações de calamidade.

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Em tom de provocação, um magistrado disse a VEJA que, a depender de qual ministro seria responsável pelo tema das queimadas, poderia se esperar uma decisão burocrática. Algo como “cumpra-se o acórdão do julgamento de março”, mas que não enfrentaria de pronto o fogo que deixou cidades como São Paulo, Brasília e Porto Velho com ar irrespirável.

Por fim, o terceiro pilar que imputa responsabilidades aos entes federados pelo descontrole das queimadas resulta na avaliação do STF de que o Congresso Nacional, a quem caberia em tese discutir a abertura de créditos extraordinários para liberar recursos de combate ao fogo, socorro à população afetada e aparelhamento das equipes de enfrentamento ao desastre está mais preocupado com as negociações sobre a eventual eleição de Hugo Motta como próximo presidente da Câmara e possíveis votações que levem à anistia dos condenados pelo 8 de janeiro do que propriamente salvar os biomas devastados pela estiagem e pelo fogo.

Em reunião na terça-feira 17 com representantes dos Três Poderes para tratar da seca e dos incêndios, o presidente Lula até admitiu que “a gente não estava 100% preparado” para lidar com a situação, mas insinuou haver interesses outros em desgastar a sua administração, que teria a importância da pauta ambiental reconhecida pelo mundo. Um ministro do STF reagiu assim ao diagnóstico do petista: “ele só visitou a Amazônia depois das primeiras decisões tomadas pelo Supremo”.

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