Freixo celebra números do turismo no Brasil e mira mais alto: ‘O potencial é enorme’
À frente da Embratur, o ex-deputado que ganhou projeção nacional ao denunciar milícias fala dos desafios para atrair estrangeiros ao país
A nomeação à presidência da Embratur, autarquia do governo federal responsável por promover o turismo brasileiro, inaugurou um novo capítulo na trajetória política de Marcelo Freixo, 58 anos. Professor de história de formação, ele garante que o país está prestes a comemorar “o melhor de todos os anos no setor”, com previsão de cravar 9 milhões de visitantes em 2025. É um número recorde, mas ainda distante de outras nações que atraem multidões a seus cartões-postais — e do que o próprio Freixo ambiciona. Para esta entrevista na sede de VEJA no Rio de Janeiro, de onde o ex-parlamentar petista é egresso, ele chegou acompanhado da habitual escolta armada, a seu lado desde que se tornou nacionalmente conhecido por denunciar o envolvimento de colegas com grupos armados, na CPI das Milícias, em 2008. Na conversa, Freixo também falou de como a violência mancha a imagem do Brasil no exterior, da crise de hospedagem na COP30 e do xadrez político das próximas eleições.
O Brasil bateu a marca recorde de 6,5 milhões de turistas estrangeiros nos oito primeiros meses de 2025 e subiu no ranking internacional. A que atribui a melhora? Tomamos a decisão política de priorizar o tema. A Embratur deixou de ser o cabide de empregos que era e passou a contar com uma equipe reconhecidamente técnica. Investimos em negociações com companhias aéreas e feiras internacionais. Além do recorde no número de visitantes, registramos um marco inédito em receita: 4,5 bilhões de reais nos primeiros oito meses deste ano, 13% acima do mesmo período em 2024. O potencial é enorme. O turismo gera 8 milhões de empregos diretos e indiretos e responde por 8% do PIB. Em comparação, a exploração de petróleo representa 12%.
Há críticas de que os números não distinguem turistas internacionais dos brasileiros que moram fora e vêm visitar os parentes. Isso não distorce as estatísticas? A diferença é insignificante. E, se a pessoa mora fora e viaja ao Brasil, é turista. Seguimos os parâmetros definidos pela ONU.
Só para estabelecer uma comparação com um país da América Latina, o México passou dos 45 milhões de visitantes no ano passado. Por que o Brasil ainda está distante desse patamar? Temos problemas estruturais variados, entre os quais a ausência de transporte eficiente, como trens de alta velocidade. Apesar disso, somos os mais visitados na América do Sul e contamos com um bom fluxo no turismo interno, registrando cerca de 100 milhões de viagens por ano. É também preciso ponderar que o Brasil é um país continental, separado da Europa por um oceano. A distância exige muitas horas de voo e nos coloca em desvantagem desde a largada.
“Temos que investir em transporte, melhorar os serviços e aperfeiçoar a promoção dos destinos para chegar ao patamar de visitantes de outros países”
O que poderia mudar esse cenário? Investir em infraestrutura de transporte, melhorar a qualidade dos serviços e aperfeiçoar a promoção dos destinos. Ao trabalhar certa cidade, criamos condições para novos voos, hotéis e roteiros. Uma prática que tem dado resultado positivo é a chamada propaganda cruzada. Divulgamos Belo Horizonte em Santiago e Santiago em Belo Horizonte, garantindo demanda nos dois sentidos e viabilizando voos diretos.
Em que medida a violência das grandes cidades brasileiras afugenta turistas? Ao contrário do que possa parecer, a segurança não é a preocupação número 1 de quem nos visita. As principais queixas, segundo indicam as pesquisas, são falta de sinalização, limpeza e baixa oferta de transporte. Mesmo assim, nove em cada dez turistas estrangeiros se dizem dispostos a voltar e recomendariam o Brasil para amigos e parentes. Dito isso, a questão da segurança é, sim, um desafio e acredito que o turismo pode ser parte da solução do problema. Ele gera emprego, renda, estimula a circulação de pessoas e traz mais infraestrutura.
Episódios como o golpe “boa noite, Cinderela”, que recentemente vitimou turistas britânicos na capital fluminense, acabam por reverberar mundo afora. Como lidar com casos assim? Eles são sempre ruins. Mas a polícia agiu bem e capturou os envolvidos. A insegurança é algo que se faz sentir em toda a parte, em diferentes níveis. Em Paris e Roma, por exemplo, são famosos os batedores de carteira, conhecidos como pickpockets. O importante é conseguir dar respostas rápidas para a crise não escalar e preparar as cidades para receber bem seus visitantes. Reconheço que, no Brasil, a segurança é um tópico que devemos enfrentar.
A Embratur pretende aproveitar a COP30 para projetar a imagem do país no exterior? É preciso compreender que a COP não é um evento turístico, com esse objetivo. Mas, claro, em toda a região amazônica o turismo tem muito a acrescentar, criando alternativas econômicas em áreas dominadas por atividades ilegais, como o garimpo e a extração de madeira. As comunidades locais vivem às voltas com a necessidade de incrementar seus meios de vida e o turismo verde, focado em receber pequenos grupos com uma pegada sustentável, é uma excelente oportunidade. A floresta oferece uma experiência única no mundo. E a COP ajuda a situá-la na rota internacional.
O governo não consegue reduzir os elevados custos da hospedagem em Belém. Essa crise pode prejudicar a imagem do Brasil no exterior? Não creio. Aposto que haverá mais gente na capital paraense do que em Baku, no Azerbaijão, em 2024. De nossa parte, contratamos dois navios com 10 000 leitos cada. Alguns ambientalistas criticam a medida, alegando não ser uma via sustentável. Mas vamos fazer a compensação de carbono, para mitigar os possíveis prejuízos ambientais. O essencial é mostrar a Amazônia ao mundo.
A escolha de uma cidade como o Rio de Janeiro, que já sediou até uma Olimpíada, não seria mais adequada? Nem sempre o mais fácil é o melhor caminho. Estamos trazendo gente de todo o planeta para discutir clima e sustentabilidade exatamente no lugar onde o tema se impõe de forma mais urgente. O impacto político e ambiental de realizar a COP em Belém é incomparável.
Muita gente no setor do turismo afirma que a volta do visto de entrada para americanos no Brasil é um equívoco motivado por ideologia. Concorda? Os números mostram que não há efeito negativo. A quantidade de americanos cresceu 12% entre janeiro e agosto. Só em abril, quando a exigência começou a valer, ocorreu uma pequena queda. É uma política de reciprocidade definida pelo Itamaraty: se um país cobra visto, o Brasil responde com a mesma medida. Mas não custa salientar que a retirada do documento brasileiro é eletrônica, feita em cinco minutos, sem nenhuma burocracia.
Transformar a Embratur em uma agência com autonomia foi um erro do governo Bolsonaro? Poderia até ter sido um acerto se a decisão viesse acompanhada de fontes financeiras. Sem isso, foi uma loucura. Eu herdei uma estrutura que caminhava para fechar. Hoje, contamos com diversas formas de financiamento. Além do dinheiro do governo federal, recebemos 1% do imposto das apostas eletrônicas e recursos do Sebrae.
O que a condenação do ex-presidente significa para o Brasil? É uma vitória da democracia. Não apenas Bolsonaro, mas também o projeto que ele simboliza foi derrotado pelas instituições brasileiras. A extrema direita nacional remete a um passado de tortura, escravidão, racismo e tentativas de golpe de Estado. A condenação de seu maior líder, no entanto, não fará com que esta vertente política desapareça. A maneira como a comunicação se dá hoje em dia, via redes sociais, contribui de forma decisiva para a circulação dessas ideias.
“Eduardo Paes é um político de direita, mas está no campo democrático. O desafio no Rio hoje é formar uma frente ampla para derrotar o crime organizado que se infiltra na política”
Como vê os desdobramentos políticos da condenação de Bolsonaro no Rio, seu berço político? O estado abriga um bolsonarismo miliciano, diferente de outras manifestações da direita no Brasil. Ele é ainda mais antidemocrático. A condenação certamente muda o tabuleiro, mas ainda é cedo para dizer como.
Como avalia as chances de Lula na corrida presidencial de 2026? As últimas pesquisas indicam melhora significativa na popularidade do governo, tanto pelos nossos acertos quanto pelos erros dos adversários. Desfilar uma bandeira americana em pleno 7 de Setembro é um deles. Estamos trazendo de volta para nosso campo a ideia da soberania, do nacionalismo, do verde e amarelo. A ideia é deixar claro quem defende o Brasil.
O ministro Celso Sabino, do União Brasil, entregou a pasta do Turismo após o partido romper com o governo. Lula perde com sua saída? Ele ainda não saiu. Apresentou uma carta de demissão por exigência do partido, mas não há definição até agora. O que sei é que nem ele quer sair, nem o governo deseja isso. O presidente já deixou claro que, por ele, nada muda.
O nome do senhor e o do economista Paulo Câmara, presidente do Banco do Nordeste, estão entre os cotados para o ministério. Quem deve assumir? É tudo especulação. Não há nada decidido. De minha parte, sigo trabalhando para que tudo se resolva da melhor maneira.
Qual o seu futuro político, depois de perder as disputas à prefeitura e ao governo do estado no Rio? Vou cumprir meu combinado com Lula: concorrer à Câmara dos Deputados e fazer campanha por sua reeleição. Quanto a um futuro cargo no Executivo do Rio, depende da conjuntura. É uma vontade, mas não uma obsessão.
O mandachuva do PT no Rio, Washington Quaquá, defende a soltura dos irmãos Brazão, acusados de mandar matar a vereadora Marielle Franco, de quem o senhor era próximo. O que acha dessa postura? Não concordo, claro. Mas não transformo em guerra. O escritor uruguaio Eduardo Galeano certa vez me disse: “Valorize seus inimigos, eles definem quem você é”. Não faço qualquer um de inimigo.
Isso vale também para Eduardo Paes, prefeito do Rio, a quem o senhor sempre fez oposição e que tem o apoio de Lula para concorrer ao governo do estado no ano que vem? Sim. Fui adversário ferrenho do Eduardo e sei que ele é um político de direita, mas que está no campo democrático. O desafio central do Rio hoje é derrotar o crime organizado que se infiltra na política. Apenas com uma frente ampla, como a que formamos em 2022, será possível enfrentar essa praga. Mas uma aliança mais abrangente só tem chances de prosperar à base de muita transparência. Se acabar abrigando bandidos no palanque, não contem comigo.
Publicado em VEJA de 3 de outubro de 2025, edição nº 2964
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