Na ONU, Irã acusa EUA de fomentar xenofobia parecida com a do nazismo
Presidente iraniano associa as sanções unilaterais americanas ao terrorismo e desafia Washington a iniciar um diálogo sem pose para as fotos
O presidente iraniano, Hassan Rouhani, fez da retórica sua arma para acusar o atual governo dos Estados Unidos de impulsionar o extremismo, o racismo e “tendências xenofóbicas duras, similares às do nazismo”. Durante seu discurso na Assembleia-Geral das Nações Unidas, nesta terça-feira, 25, ele criticou duramente o fato de o governo de Donald Trump ter abandonado o Acordo Nuclear do G5+1 com o Irã, de 2015, e retomado as sanções econômicas contra Teerã.
Rouhani insistiu que o acordo havia sido endossado pelo Conselho de Segurança da ONU, por meio da Resolução 2231, e ainda hoje conta com o apoio da União Europeia, da China e da Rússia. A decisão unilateral de Trump, em sua visão, constituiu “um convite geral à violação da lei” associada à ameaça dos responsáveis pela lei com punição.
“A compreensão dos Estados Unidos das relações internacionais é autoritária. Sua compreensão de poder, não de autoridade legal e legítima, é refletida no ‘bullying’ e na imposição”, afirmou o iraniano.
Rouhani foi o nono chefe de governo a discursar na ONU nesta terça-feira, depois do próprio Trump, que atrasou-se para o compromisso. O presidente americano valera-se da tribuna da Assembleia-Geral para reiterar sua decisão de retirar-se do acordo com o Irã, para acusar os governantes iranianos de semear o “caos, morte e destruição” e para pedir aos líderes mundiais que “isolem” o país.
Trump chamou o Irã de “maior patrocinador do terrorismo” no mundo. Rouhani rebateu dizendo que os Estados Unidos, ao buscarem a dominação e hegemonia, são “inimigos da paz e perpetradores da guerra”. Alegou ainda que a imposição de sanções unilaterais é sinônimo de terrorismo.
“Confrontar o multilateralismo não é sinal de força. Ao contrário é um sintoma de fraqueza intelectual – revela uma falta de habilidade de entender um mundo complexo e interconectado”, advertiu o iraniano. “Nós consideramos o conhecimento nuclear como um imperativo, e as armas nucleares, como proibidas.”
Em maio deste ano, Trump retirou os Estados Unidos do acordo nuclear com o Irã, de 2015, sob a alegação de que Teerã não cumpria seus termos e fomentava conflitos na Síria, no Iraque e no Iêmen. Desde então, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) atestou várias vezes que o Irã manteve os seus compromissos.
De fato, Teerã tem contribuído com seus aliados nos três países do Oriente Médio – o governo de Bashar Assad na Síria, os rebeldes ienemitas houtis e os xiitas do Iraque. O próprio Rouhani justificou a ação do Irã alegando que seus cidadãos têm sido vítimas do terrorismo e que seu país luta contra a Al Qaeda desde antes do ataque desse grupo aos Estados Unidos, em 2001.
Em um chamado a Trump, Rouhani se disse pronto para iniciar um diálogo com o americano, “sem a necessidade de posarem para fotos”. “Se você não gosta do acordo porque é um legado de seus rivais políticos internos, então nós o convidamos a voltar para a resolução do Conselho de Segurança”, insistiu.
“Sanções e extremismo são dois lados de uma mesma moeda: extremismo envolve a negação do pensamento do outro, e as sanções negam a vida e a prosperidade de um povo”, completou Rouhani.
Mártires
Em seu discurso, Rouhani chamou de “mártires” as 25 pessoas mortas durante ataque contra uma parada militar na cidade de Ahvaz, no Irã, no último sábado, e acusou os atiradores de serem “terroristas que descaradamente aceitaram a responsabilidade pelo crime hediondo de capitais ocidentais durante entrevistas com algumas empresas de radiodifusão sediadas no ocidente e financiadas por petrodólares”.
O grupo separatista árabe-iraniano Resistência Nacional Ahvaz, supostamente financiado pelos rivais de Teerã no Golfo Pérsico, assumiram a responsabilidade pelo ataque. O líder supremo do Irã, aiatolá Ali Khamenei, culpou a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos como financiadores desse grupo terrorista.
Rouhani não mencionou diretamente os Estados Unidos, mas qualquer pessoa presente na plateia da Assembleia-Geral poderia reconhecer em suas palavras a aliança entre Washington e os governos do Golfo Pérsico.
“Por que os Estados financiadores de organizações terroristas anti-iranianas – com seu histórico de financiar a Al-Qaeda, o Estado Islâmico e a Nusrah – não só foram poupados de qualquer punição, como também recebem apoio e são armados?”, desafiou. “Se você quer que o público mundial leve a sério sua pretensão de combater o terrorismo, é imperativo iniciar uma campanha global conjunta para combater esse flagelo, independentemente das vítimas ou dos culpados.”