Modi inaugura polêmico templo hindu construído sobre ruínas de mesquita
Medida acirra discurso nacionalista do premiê indiano contra muçulmanos e desperta temores de ataques à minoria religiosa do país
O primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, inaugurou nesta segunda-feira, 22, o controverso templo hindu Ram Janmabhoomi Mandir, na cidade de Ayodhya. Ao abrir as portas do templo, o premiê nacionalista hindu coloca em prática uma antiga promessa feita aos eleitores e aos membros do seu Partido Bharatiya Janata (BJP) e marca mais uma derrota para os muçulmanos do país.
“Hoje nosso Senhor Ram veio. Depois de séculos de espera, nosso Carneiro chegou. Depois de séculos de paciência sem precedentes, incontáveis sacrifícios, renúncias e penitências, nosso Senhor Ram chegou”, disse Modi às mais de 7 mil pessoas que se reuniram para a cerimônia de inauguração. “Ram não é uma disputa, Ram é a solução.”
Enquanto celebrações tomam conta das ruas do país, a parcela muçulmana da população não vê motivos para comemorar. O território em que o templo foi construído já abrigou a mesquita Babri Masjid, do século XVI, datada do Império Mogol (1526-1857), que chegou a dominar quase todo o subcontinente indiano. Em 1992, radicais religiosos e grupos de direita destruíram o santuário, alegando que havia sido erguido nas ruínas de um antigo templo hindu. Para eles, lá também teria sido o local de nascimento do Senhor Ram, um dos avatares do deus Vishnu.
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Ferida aberta
Incentivada pelo BJP, a demolição da antiga mesquita lançou o partido para o centro da política nacional e levou à sua vitória nas eleições gerais em 2014. Cinco anos depois, a Suprema Corte indiana concedeu permissão para a construção do templo hindu, apesar da oposição de grupos muçulmanos. No discurso desta segunda-feira, Modi afirmou que a inauguração representava “um novo ciclo” e parte do “juramento de construir uma Índia nacional, capaz, bem-sucedida, bela e divina”.
Ayodhya tem uma população de 3 milhões de pessoas, com cerca de 500 mil muçulmanos, que rivalizam com a maioria hindu. O evento desta segunda-feira aumentou os receios de que crimes de vingança se espalhem pelo país. Segundo a emissora americana CNN, muitos muçulmanos usaram as redes sociais para oferecer dicas de segurança, recomendando que seus pares evitem usar o transporte público.
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Estado x religião
Nos preparativos para a inauguração, o premiê jejuou e rezou por onze dias. Entre os rituais, ele visitou santuários e templos ligados ao Senhor Ram ao redor do país. Há quem diga, no entanto, que o esforço não garante a Modi a credencial religiosa necessária para a missão desta segunda-feira.
Em comunicado, a organização não-governamental Hindus for Human Rights afirmou que as críticas ao primeiro-ministro estão centradas no fato de que ele “não é um líder religioso e, portanto, não está qualificado para liderar a cerimônia, e que um templo hindu não pode ser consagrado antes de ser concluído”.
Além disso, o grupo acrescentou que a iniciativa seria “a mais recente tentativa de transformar o hinduísmo em uma arma em nome da ideologia nacionalista repressiva do BJP, antes das eleições nacionais em maio”. Modi é grande defensor da agenda conhecida como “Hindutva”, que acredita que a Índia deve tornar-se uma nação hindu. A promessa de construir o templo Ram Janmabhoomi Mandir fazia parte do pacote.
Ainda que não tenha financiado a empreitada, o premiê e o BJP promoveram o evento de inauguração para convertê-lo em um grande evento nacional. Foi declarado feriado na região de Uttar Pradesh, onde está Ayodhya, para instigar a participação popular. Organização-mãe do partido, a direitista Rashtriya Swayamsevak Sangh também distribuiu alimentos a cerca de 50 milhões de famílias próximas ao local, aumentando a pressão para que aderissem às coloridas e muito agitadas comemorações.