Militar diz que Casa Branca omitiu dados de conversa de Trump com Ucrânia
Tenente-coronel afirmou em depoimento ao Congresso que presenciou funcionários americanos pressionando governo ucraniano
O tenente-coronel Alexander Vindman, um dos principais assessores do governo americano na Ucrânia, disse nesta terça-feira 29, em depoimento ao Congresso, que a transcrição da ligação telefônica entre Donald Trump e o presidente ucraniano, Vladimir Zelensky, divulgada em setembro pela Casa Branca, omite detalhes importantes da conversa.
Vindman afirmou ainda que tentou convencer os oficiais da Casa Branca a manter frases e palavras que considerava cruciais para a transcrição, mas seus esforços foram ignorados.
O tenente-coronel é especialista em Ucrânia no Conselho de Segurança Nacional (NSC, na sigla em inglês) e disse ter informado, duas vezes, sobre sua preocupação com as intensas tentativas da Casa Branca para que Kiev fizesse investigações para favorecer Trump politicamente. Ele afirmou ainda ter presenciado funcionários do governo pressionando a Ucrânia.
O depoimento de Vindman é considerado crucial para a investigação aberta na Câmara dos Deputados sobre o caso, pois o tenente-coronel estava presente durante o telefonema. Nesta terça, ele confirmou que o presidente fez pressão sobre Zelensky para que ele investigasse o democrata Joe Biden, principal rival de Trump nas eleições 2020.
“Não achei adequado (Trump) exigir que um governo estrangeiro investigasse um cidadão americano e fiquei preocupado com as implicações para o apoio dos EUA à Ucrânia”, afirmou o militar, segundo documento obtido por jornalistas após a sessão a portas fechadas.
Vindman confirmou ainda que o presidente mandou suspender o envio de uma ajuda militar à Ucrânia até que Zelensky concordasse em investigar Joe Biden e seu filho Hunter.
O testemunho corrobora os depoimentos do embaixador dos Estados Unidos na Ucrânia, Bill Taylor, e de outros diplomatas americanos que confirmaram a barganha de Trump com Zelensky que está na origem do processo de impeachment que tramita na Câmara dos Deputados.
A resposta de Trump foi imediata. Antes mesmo de Vindman chegar ao Congresso, o presidente atacou o caráter do militar, acusando-o de ser um opositor do governo. “Ele estava no mesmo telefonema que eu? Não é possível. Peçam a ele que leia a transcrição da conversa”, tuitou o presidente.
Outros republicanos fizeram o mesmo. Na CNN, o ex-deputado Sean Duffy referiu-se ao militar como “ucraniano” – Vindman de fato nasceu na Ucrânia e chegou aos Estados Unidos quando tinha 3 anos. “Ele fala ucraniano e tem afinidade com a Ucrânia”, disse o republicano.
A mesma linha de defesa do presidente foi seguida por outros aliados conservadores, como a apresentadora Laura Ingraham, que atacou a integralidade de Vindman, questionando sua lealdade aos Estados Unidos durante um debate na Fox News.
O tenente-coronel é condecorado como um Coração Púrpura, a mais importante honraria militar americana, após ser ferido no Iraque por uma bomba de beira de estrada – até hoje ele carrega os estilhaços no corpo.
Para muitos republicanos tradicionais, no entanto, é difícil criticar um veterano de guerra – sendo que o próprio presidente fugiu do Exército, durante a Guerra do Vietnã, alegando um problema no calcanhar. Liz Cheney, deputada republicana e filha do ex-vice-presidente Dick Cheney, disse nesta terça que questionar o patriotismo de diplomatas e veteranos “é vergonhoso”.
Votação
Os democratas pretendem votar entre esta quarta e quinta-feira na Câmara dos Deputados uma moção para aprovar oficialmente o inquérito de impeachment. A votação não é necessária, segundo líderes da oposição. Mas os republicanos se recusavam a cooperar, chamando o inquérito de “ilegal” por não ter sido aprovado formalmente.
Com o sinal verde protocolar, acreditam os democratas, os republicanos ficariam sem argumento e se colocariam na posição constrangedora de ter de defender as ações de Trump.
(Com Estadão Conteúdo e AFP)