Igreja Católica alemã pede desculpas por casos de abuso sexual
Relatório revelou indícios de abuso de 1.670 clérigos contra mais de 3.700 vítimas, a maioria delas menores de idade
A Igreja Católica da Alemanha apresentou oficialmente um pedido de desculpas, nesta terça-feira (25), após a revelação dos casos de abuso sexual de mais de 3.600 menores durante décadas.
“Por todas as falhas e sofrimentos, eu gostaria de me desculpar”, declarou o presidente da Conferência Episcopal alemã, Reinhard Marx. “Os abusos sexuais são crimes e devem ser punidos”, acrescentou, lamentando que a Igreja “tenha por muito tempo virado os olhos, dissimulado, negado” os fatos.
Pesquisadores de três universidades alemãs examinaram 38.156 arquivos pessoais referentes a um período de 70 anos encerrado em 2014 e descobriram indícios de abuso sexual de 1.670 clérigos e mais de 3.700 possíveis vítimas.
A revista alemã Der Spiegel noticiou as descobertas no início deste mês depois que o relatório vazou. O escândalo ocorre em um momento no qual a Igreja Católica enfrenta uma onda de novos casos em países como Chile, Estados Unidos e Argentina.
A maioria das vítimas registradas pelo relatório é de garotos com menos de 13 anos, alvo de pelo menos 1.670 membros do clero.
Um dos casos mais chocantes é o do coral católico de Regensburg, onde ao menos 547 crianças sofreram lesões corporais e abuso sexual, incluindo estupro, entre 1945 e 1992.
O irmão do ex-papa Bento XVI dirigiu esse coral milenar entre 1964 e 1994 e foi acusado de fechar os olhos, mas nega ter conhecimento de nenhum dos abusos.
“A amplitude dos abusos me abalou”, declarou o professor Harald Dressing, do Instituto de Psicologia de Mannheim, coordenador do estudo. Segundo ele, muitos casos provavelmente nunca foram denunciados ou levados a sério o suficiente para serem mencionados nas fichas.
“Os números resultantes (no relatório) são a ponta de um iceberg cujo tamanho real não conseguimos avaliar”, acrescentou Dressing.
Escândalos em série
O cardeal Marx prometeu fazer de tudo para superar esse problema, trabalhando na prevenção, ou na instalação de uma comissão para trazer luz aos fatos. Este, contudo, não é o primeiro escândalo do tipo enfrentado pela Igreja Católica Apostólica Romana da Alemanha, que tinha mais de 23 milhões de fiéis no final de 2017.
Esse relatório é um primeiro passo, “uma virada na história” da Igreja, considerou o cardeal. Mas isso é pouco para as vítimas.
“O número real de pessoas que sofreram abusos sexuais (…) se situa em toda uma outra dimensão do que esses números sugerem”, denuncia a associação de vítimas Eckiger Tisch. A organização afirma que o relatório revelado é “superficial” por ser baseado em arquivos incompletos e não citar nenhuma autoridade pelo nome.
O consórcio de pesquisadores das universidades de Mannheim, Heidelberg e Giessen, que fez a investigação, não teve acesso direto aos arquivos de 27 dioceses alemãs. Na verdade, foram examinados apenas 38.000 dossiês e manuscritos selecionados e enviados pela Igreja.
O poder político interveio, por meio da ministra da Justiça Katarina Barley, para exigir que a Igreja colabore com as autoridades judiciais, de modo que os culpados sejam identificados e punidos.
Para a associação Eckiger Tisch, o único meio de expor os abusos passa pela instalação de uma comissão de investigação independente patrocinada pelo Estado.
Além da Alemanha, Austrália, Chile, Estados Unidos e França foram tomados pelas acusações de estupro, abuso sexual, pedofilia e lesões corporais por membros da Igreja Católica.
O papa Francisco, que não escapou das críticas por sua gestão dos escândalos, convocou recentemente, para fevereiro de 2019, uma reunião no Vaticano de todos os presidentes das conferências episcopais no mundo sobre o tema da “proteção dos menores”.
(Com AFP e Reuters)